Se a Comissão Parlamentar de Inquérito ao BES não servir para mais nada serve, pelo menos, para mostrar que o governo e o Banco de Portugal "jogaram à roleta" não só com a estabilidade do sistema financeiro, conforme hoje lá disse Fernando Ulrich, mas também com os portugueses e com a economia portuguesa.
Bastou que Fernando Ulrich tivesse dito - e disse muito mais - que tinha avisado Vítor Gaspar, então ministro das finanças, ainda antes da irrevogável revogada demissão de Portas do início do Verão de 2013, do que se estava a passar no GES e no BES. E que tivesse demonstrado que, dois dias depois, já estava um alto funcionário do Banco de Portugal a contactá-lo na sequência dessa sua iniciativa, para ficar claro toda a gente do governo tem mentido, com o primeiro-ministro à cabeça, quando diz que só teve conhecimento da situação no final de 2013. E que o governo e o Banco de Portugal são cúmplices, por passividade, com o rol de crimes financeiros praticados por Ricardo Salgado e seus pares no últimos 12 meses da actividade do BES!
Não sei se há quem possa atirar a primeira pedra. Mas Fernando Ulrich não perdeu muito tempo. Primeiro foi o anúncio - televisivo, muitos anos depois: certeiro, nitidamente a entrar por ali dentro. Depois, não se ficou pelas meias palavras...
Passos Coelho é que - disse-o sempre - não estava preocupado. Nem tinha nada a ver com aquilo. Afinal parece que tem, e chegou já ao ponto de dizer que, se houver alguma coisa, o Estado cá está.
Não sei bem porquê, mas acho que gostei mais de o ver calado!
“Nem em 75 houve uma política tão redistributiva”, ou “não se pode é dizer que a política não tem tido uma preocupação redistributiva enorme” são as novas preciosidades do senhor ai aguenta, aguenta!
As nomeações da rapaziada continuam. Técnico especialista ou assessor, não há dia sem novidades!
Desta vez é o Despacho nº 14730/2013 do Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações, Sérgio Paulo Lopes da Silva Monteiro, publicado no Diário da República do passado dia 4: “designo como técnico - especialista João Melo de Castro Ulrich para realizar estudos e trabalhos técnicos no âmbito das respectivas habilitações e qualificações profissionaisno meu gabinete”.
Claro que os termos do despacho chamam a atenção: o Secretário de Estado designa o rapaz “técnico especialista". Para quê? Pois, "para realizar estudos e trabalhos técnicos no âmbito das respectivas habilitações e qualificações profissionais”. Para que não haja, nem nunca possa haver, a mínima desadequação entre as qualificações e o posto de trabalho. No tacho é normalmente assim... Dá sempre com o testo! Acrescento que o rapaz é jurista, pelo que a sua função será a de realizar estudos e trabalhos jurídicos…
Mas o nome do rapaz não lhe fica atrás!
Desconfio que o papá Fernando passará agora a sujeitar-se a alguma continência verbal. De outra forma melhor seria que tivesse arranjado um lugar para o menino lá no BPI…
A autêntica saga que Fernando Ulrich inaugurou com o célebre “ai aguenta… aguenta” não tem fim à vista. Promete eternizar-se. Ou, pelo menos, bater a regressada saga dos Ewning, que parecia nunca mais acabar!
Mas não devia. O líder do BPI tem a obrigação de pôr fim à novela muito rapidamente, e não pode continuar a alimentá-la como tem feito. Por uma razão simples: porque tudo começou num erro grosseiro de comunicação!
O “ai aguenta… aguenta” inaugural foi um erro grave de comunicação que só tinha que ser corrigido de imediato, com o saber e a humildade que devem ser próprios dos verdadeiros lideres. E mesmo das elites!
Teria sido fácil fazê-lo, e dispõe de meios para isso e para muito mais: agências de comunicação, gestores de imagem, sei lá… Mas não o fez, e nem sequer se pode dizer que a emenda lhe tenha saído pior que o soneto. Não houve sequer uma verdadeira tentativa de emenda, houve apenas uma tentativa de fuga para a frente. E as fugas para a frente normalmente correm mal!
Hoje, no Parlamento, onde foi ouvido em sede de comissão de orçamento e finanças, que está a ouvir os presidentes dos bancos ajudados pelo Estado, o que foi notícia foi precisamente a sua novela, acabando por lhe acrescentar mais um episódio. Ao ponto de o deputado comunista Honório Novo lhe ter recomendado que se demitisse – há gente que resolve tudo com demissões – obrigando-o a responder que o seu lugar está sempre disponível e nas mãos dos accionistas.
Bem o sabemos, mas … não havia necessidade…
E é verdade que, por incompetência na comunicação, e por uma certa arrogância intelectual que não o deixou voltar a trás, está a prejudicar o banco que dirige. E os accionistas, por muito bem que achem que ele o dirige, podem até não achar muita graça a este particular!
O tema da semana – a chamada, apenas por facilidade de expressão, crise interna do PS -, aqui sobejamente tratada, teve uma particularidade notável: António José Seguro, que antes era pouco menos que indigente, passou a ser, aos olhos da opinião que sustenta a maioria e o governo, o mais respeitável líder da oposição!
Em poucos dias, Seguro deixou de ser um líder frouxo, fraquíssimo, sem ideias nem projecto para passar a merecer todos os elogios e encómios. Passou de vilão a vítima, a mártir da deslealdade, como se pôde ver por tudo o que era opinião publicada a partir de toda a comunicação que se esforça para defender o actual poder.
Conta hoje o Expresso que a onda de solidariedade passou já para o governo. Que decidiu dar tréguas a Seguro a ver se ele se aguenta… Ou se se aguentam ambos!
Será que se aguentam?
Dou a palavra a Fernando Ulrich: ai aguentam, aguentam!
Fernando Ulrich voltou ao “ai aguenta …aguenta”. Desta vez para dizer que, se a Grécia aguentou uma quebra de 25% no PIB, Portugal também o aguenta. Que, se os sem abrigo aguentam as respectivas condições de vida, qualquer português as aguenta, também!
Não se aguenta esta gente…
O presidente da RTP, em entrevista à própria, disse que era necessário despedir trabalhadores. Quantos? Não sabe, não tem ainda o estudo que lho diga!
Mas sabe que a empresa tem trabalhadores a mais. E que o ministro Relvas disse que a reestruturação seria dolorosa. E que isso queria dizer despedimentos!
Não me surpreende que haja gente a mais na RTP. Se ao longo destes anos todos foi um dos albergues preferidos para a rapaziada do centrão, é mais que provável que por lá esteja mais gente que o necessário. O que me surpreende é que o seu Presidente fale em despedimentos sem que saiba do que está a falar. Apenas em sintonia com a dolorosa profecia de Relvas. Que, mais que uma profecia, é um castigo: como não vos privatizo, despeço-vos. Vão ver como dói!
Não se aguenta, não…
Marques Mendes, falando da remodelação, disse que, a sério, só depois das eleições autárquicas, onde o governo levará uma tareia das antigas. Que é sempre assim, que é normal um governo em funções ser sempre penalizado em eleições! Quer ele dizer - e sabe do que fala - que não há governo capaz de governar a contento de quem o elege, de acordo com o que promete. Que nunca há governos sérios. Que tem de ser assim…
Que é assim, já há muito o sabemos. Que esta gente não tenha vergonha de o dizer, é que já não se aguenta…
Na discussão do Orçamento de Estado na Assembleia da República discutiu-se tudo menos o dito. A politquice do costume, com mais ou menos encenação e com a amnésia do costume. PS e PSD muito esquecidos: um de que foi governo e do que aí foi feito, e outro, tanto como das promessas feitas, da garantia que nunca se desculparia com a pesada herança. O governo e a maioria na realidade já não têm outro argumento que não a governação anterior, esquecendo duas coisas: que garantiram não recorrer a esse expediente e que estão a governar há quase ano e meio.
Mas a verdade é que na discussão do orçamento não se discute o orçamento, a provar aquilo que aqui tem repetidamente sido dito: que este orçamento apenas existe porque é preciso haver um. Se não vale de nada, se não serve para nada, se nem o governo que o apresenta nem a maioria que o defende e aprova acreditam nele, o que é que há a discutir?
Quando se deveriam estar a discutir os “enormes aumentos de impostos” do Orçamento, o primeiro-ministro apresenta medidas contingentes – mais impostos - para a falha da execução orçamental. Está a apresentar o Orçamento e o seu primeiro rectificativo, ele que, neste ano, bateu o recorde de orçamentos rectificativos, ultrapassando os governos provisórios do PREC!
Quando se deveriam estar a discutir os cortes de despesa do Orçamento, o primeiro-ministro, refundador, alarga a refundação ao Estado, depois do pontapé de saída dado na semana passada pelo ministro das finanças com aquela de “pensar nas funções do estado e no preço que se está disposto a pagar por elas”.
O governo que prometeu reformar o Estado, que foi eleito também com essa promessa, em ano e meio não mexeu uma palha. Mas quando apresenta um orçamento que não consegue executar, repara que a única saída que tem é cortar funções ao Estado. É, quando mais tira aos portugueses para dar ao Estado, que mais vai tirar no que o Estado tem para dar aos portugueses.
E é quando desperdiçou toda credibilidade que chegou a ter, depois de perder todas as muitas oportunidades que teve, e depois de ter esgotado toda a boa vontade, compreensão e disponibilidade de colaboração da parte do PS, que vem apelar – de forma pública e alvoraçada, sem o mínimo tacto político – à ajuda de Seguro para consensos na reforma do Estado. Faz algum sentido?
Nunca tanta incompetência junta foi vista neste país…
Valha-nos que um banqueiro nosso amigo – e muito competente - acha que tudo vai bem. E que é com mais austeridade - que o país aguenta, garante – que nos salvamos do destino da Grécia. “Ai aguenta, aguenta” – diz ele! Até poderá aguentar, Sr Ulrich, mas esse é mesmo o caminho da Grécia. Com o mesmo destino, como já toda a gente viu!
Acompanhei a entrevista de Fernando Ulrich na RTP. Que fale como um banqueiro não surpreende ninguém. Também a hipocrisia não surpreende: embora não pareça rima com banqueiro.
Mas a lata surpreende. Nem é por dizer que as empresas portuguesas não têm falta de crédito, que têm é falta de capitais próprios e de mercados. Ou que o não há milhares de portugueses a ficar sem as suas casas, obrigados a entregá-las aos bancos. Que no BPI não acontece nada disso. Ou que a Banca não teve nada a ver com a decisão dos portugueses de comprar habitação, e que essa foi uma decisão exclusiva dos portugueses, por sinal a melhor que tomaram… É por dizer que o governo deveria pôr os desempregados a trabalhar – de borla, evidentemente – nas grandes empresas. No seu BPI, pois claro…
É preciso ter lata!
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