A decisão da administração da TAP de substituir a sua frota automóvel poderá até estar carregada de racionalidade de gestão. A crer nas suas explicações, dadas em comunicado, até seria o caso, não fosse a poupança anual de 630 mil euros ficar à partida como suspeita quando se trocam carros da Peugeot por carros da BMW. E, mais suspeita ainda, a garantia dada pela administração que essa foi a opção mais barata.
Ainda poderíamos admitir que as contas da poupança revelada estivessem certas pela via fiscal. Os carros híbridos, na aquisição, mas principalmente no uso, gozam de vantagens fiscais consideráveis, que poderão eventualmente convergir naquele resultado. Já que uma proposta BMW seja mais barata que uma Peugeot, será bem mais difícil de admitir.
Poderemos admitir com elevado grau de probabilidade que, se os velhos Peugeots tivessem sido substituídos por novos Peugeots - híbridos, que também os tem - o assunto nunca se teria atingido a dimensão de escândalo nacional.
E no entanto, se acreditarmos nas justificações que a administração da TAP apresentou, o "escândalo" seria até maior.
Valha que, no fim, o bom senso que sempre faltou, e que, por mais estranho que pareça, nestas coisas da gestão tantas vezes se sobrepõe à racionalidade, acabou por chegar com a anulação da operação. Só faltava que agora tivesse de pagar uma indemnização qualquer...
Para custos já chegou. E são bem altos, os de reputação e de credibilidade de uma empresa onde, mais que nunca, tudo terá de ser gerido com pinças. E claro, com bom senso!
Leio e ouço por aí que, nas medidas do novo Plano de Estabilização Económica e Social, e no Orçamento Suplementar que hoje Centeno vai apresentar - o seu primeiro suplementar, mas também o seu último orçamento -, cabe a regra do um por um na contratação para a função pública.
Quer dizer que neste abrir de cordões à bolsa que nos há-de levar à recuperação da economia perdida com a pandemia, o Estado vai contratar mais. Pelos vistos, o dobro. Ao substituir a anterior regra de uma entrada por cada duas saídas pela nova, de uma entrada por cada saída, o Estado passará a duplicar a contratação de funcionários.
Não é preciso reflectir muito aprofundadamente para perceber que isto é um disparate. Que estas regras cegas não têm a mínima racionalidade, e se limitam a transmitir a irracionalidade instalada em toda a máquina da administração pública. E que ninguém aprendeu nada com tudo por que estamos a passar.
Por exemplo: este período mostrou, como já se sabia, que faltam profissionais nos serviços de saúde. Muitos, e em todas as áreas. Mas mostrou também que a necessidade aguçou o engenho e que a digitalização nos serviços públicos avançou mais nestes três meses que nos últimos três anos. Ou mais!
Eu próprio fiquei impressionado quando renovei a minha carta de condução em cinco minutos, sem sair de casa. Sem contactar com ninguém, e com a nova carta em casa uma semana depois. Na última vez que o tinha feito tinha passado horas numa fila no IMTT, ainda antes do horário de abertura. Quando as portas se abriram começaram a distribuir as senhas de acesso, que acabaram mesmo quando ia chegar a minha vez. E lá teve de ficar para outro dia, e mais não sei quantas horas numa fila...
É por isso natural, e mesmo imperioso, que o Estado precise de cada vez menos - muito menos - pessoas nos sectores administrativos. Mas, como se viu, precisa de mais - muito mais - na Saúde. Ou na Segurança. Como precisará mais de técnicos superiores que de pessoas de baixas qualificações.
Só por mero acaso o número das pessoas desnecessárias num lado é o mesmo das necessárias nos outros. Mas, mesmo que por incrível coincidência assim fosse, o impacto orçamental - que no fundo seria o que importaria controlar - seria sempre completamente distinto.
Em tempo de projecto de recuperação e de mobilização para as tarefas da retoma, falar em regras destas soa a qualquer coisa de medieval. Atropela o futuro e mata a esperança!
Desde que Antonoaldo Neves assumiu as rédeas da gestão, a TAP passou a acumular prejuízos ao ritmo dos seus piores tempos. Nos primeiros nove meses do ano somam já 111 milhões de euros, em cima dos 118 milhões do ano passado. Em dois anos os prejuízos subirão bem para lá dos 250 milhões de euros.
Mas, ouvindo o compatriota e sucessor de Fernando Pinto, está tudo bem. Não há problema de qualquer espécie, até porque, como não se cansa de repetir, quem sabe daquilo é ele. É ele o único especialista naquela ciência oculta que é o negócio da aviação, e tem sempre explicação para tudo.
E explica que o prejuízo deste ano se deve a "variações cambiais sem impacto na tesouraria" - deve ser por isso, por não terem impacto na tesouraria, que já aí está o segundo empréstimo obrigacionista do ano, no valor de 300 milhões de euros, depois dos 400 milhões que recolheu em idêntica operação no primeiro semestre -, como os prejuízos do ano anterior haviam sido explicados por situações não recorrentes. Ou excepcionais, que na TAP mais costumam ser regra, como indemnizações por atrasos, por exemplo.
Valha que, mesmo com rating de lixo - a TAP só não tem o pior rating das companhias de aviação porque o genial David Neelmam (outro charlatão que este país transforma em génio) tem mais três empresas no sector e todas em pior estado - o Sr Antonoaldo ainda vai encontrando quem lhe empreste dinheiro para financiar os resultados da sua brilhante gestão.
A aproximação a zonas de forte turbulência está a fazer-se a grande velocidada. E, como no Titanic, a orquestra toca...
Segundo revela hoje o jornal i os administradores da PT receberam entre, salários e prémios anuais, 12,1 milhões de euros, o máximo dos últimos seis anos. Nos últimos dez anos os gestores da operadora, que agora, eventualmente para pagamento de favores pessoais, destruíram os 900 milhões de euros – mais de um terço do valor da empresa – no GES, encaixaram um total de 112,74 milhões de euros, o que dá uma média anual superior a 11 milhões.
Isto quando, segundo o mesmo jornal, a empresa sofreu uma desvalorização acumulada de 78%. E quando os custos com pessoal, nos últimos 8 anos, caíram 21%. Mas não foi só porque a empresa extinguiu 1300 postos de trabalho, o custo médio dos encargos anuais com pessoal baixou 38,5 mil euros para 30,4 mil euros por trabalhador.
Que dizer, a empresa perde valor, mas os administradores não têm nada a ver com isso, ganham cada vez mais. Quem perde são os accionistas e os trabalhadores. Conforme realça o jornal, um funcionário com um vencimento médio da PT necessitará de 30 anos para ganhar o que um administrador da empresa recebe num só ano.
Bem sabemos que, no tema, é fácil resvalar para o populismo. Mas também sabemos como se constroem as teias destes súper gestores, premiados all over the world, com carta branca para tudo, até para fazerem o que está hoje à vista que impunemente fizeram!
Na PT, na EDP, na banca... É também por estas coisas que se vê no que isto foi dar…
Portugal é um país de super gestores. Do Parlamento para o Governo, do Governo para as empresas e, depois, das empresas para as empresas.
Para outras empresas, umas atrás das outras, porque devem dar o exemplo de mobilidade, a nova descoberta da competitividade do ministro da economia? Não, umas ao lado das outras. Umas a acumular com outras!
Um relatório da Comissão para os Valores Mobiliários (CMVM) publicado ontem diz-nos que há um gestor que tem assento em mais 70 Conselhos de Administração. O que é o Michael Phelps ao pé deste homem? Uma insignificância!
Diz-nos mais: que 17 gestores ocupavam lugares de administração em mais de 30 empresas cotadas em Bolsa e que, em média, cada gestor desempenha funções executivas na Administração de oito empresas cotadas, nem sempre do mesmo grupo.
Com super gestores destes temos certamente empresas bem geridas. E com empresas bem geridas temos uma economia concorrencial, florescente e competitiva. Como se vê!
Hoje o futebolês vai partir à procura das contratações: a palavra mágica que tudo agita - mercados, media e adeptos. É uma bandeira que, bem agitada, faz verdadeiros milagres: vende jornais que não se vendiam, promove cambalhotas em disputas de poder e transforma derrotas em vitórias.
A sua força é tal que o futebolês decidiu apropriar-se dela em regime de exclusividade. Não ouvimos praticamente falar de contratações fora do futebolês. No mundo dos negócios – dos outros negócios – fazem-se contratos e contratualiza-se, não se fazem contratações. Até os sinónimos são completamente diferentes. Repare-se: no futebolês, o sinónimo de contratações é transferências. Lá fora é recrutamento que nada tem a ver com transferências!
Mas há mais demonstrações claras da importância das contratações: só se podem efectuar em duas alturas do ano: no defeso de Verão e em Janeiro. Em férias: nas grandes e nas de Natal! E não se fazem sem um empresário, essa entidade misteriosa que se enche de dinheiro e que vai e vem como as ondas do mar. Como no surf - já que a conversa foi à água - uns aguentam-se mais tempo que outros na crista da onda e nunca mais do que um em simultâneo. Aí a onda já se parece mais com um poleiro: só lá cabe um galo de cada vez. Foi o Manuel Barbosa, o José Veiga … Agora é o Jorge Mendes, vamos lá ver até quando…
Mas quem está sempre na crista da onda das contratações é o Benfica. Os jornais não querem outra coisa: todos os dias vêm charters de jogadores para o Benfica. Porque vende, é certo! Mas também porque há por lá gente que alimenta essas coisas!
É por isso que o Benfica é sempre o glosado (bem dito seria mesmo “gozado”) campeão da pré-época. E ultimamente gozado mesmo, quando, no fim de contas, as anunciadas contratações acabam por ir direitinhas lá mais para norte. E, como um mal nunca vem só, acabamos depois por, mais que vê-los brilhar por lá, vê-los cintilar transformados em raras estrelas cintilantes.
Este ano, porém e apesar de a procissão ainda estar no adro – estamos ainda a mais de três meses do fecho do mercado e já lá estão 40 jogadores – o Benfica apostou no lado da venda para realizar a sua quota de disparates. Falo, evidentemente, do caso Coentrão: um flagrante case study (pela negativa) de gestão desportiva. Servirá para ensinar nas escolas de gestão a melhor maneira de estragar um bom negócio: desvalorizar estupidamente o produto que quer vender!
Como se isso não fosse suficientemente grave e danoso, decidiram matar dois coelhos com uma única cajadada: matar o produto e o mercado!
Evidentemente que o Fábio Coentrão não tem culpa nenhuma disto. É apenas mais uma das muitas vítimas da incompetência da gestão do Benfica. E Mourinho e Cristiano Ronaldo apenas ajudaram: limitaram-se a valorizar o produto que o Benfica tinha para vender, e não têm culpa nenhuma que ninguém tenha sabido aproveitar isso. A uma gestão competente competia, à medida que a época se aproximava do fim - sendo evidente o seu interesse na venda, e óbvias quer a pressão que os eventuais compradores iriam exercer quer a vulnerabilidade do Fábio Coentrão (evidente no episódio do apoio a Sócrates na recente campanha eleitoral), um acompanhamento cuidado e profissional do jogador, e não, como sucedeu, abandoná-lo, entregue a si próprio. Falhada essa oportunidade preventiva, o jogador lançou alertas e deu todos os sinais do que se estaria a passar. Dir-se-ia que pediu ajuda! Mas em vez de ir a correr blindar o jogador preferiram a negligência de nada fazer para evitar o pior. Aconteceu então o que era de esperar: a fatal entrevista a um jornal desportivo espanhol.
No fim de tanta asneira, o mínimo que se exigia agora era chamar o jogador e o empresário – Jorge Mendes, já cá faltava esta figura – e, a três, montar uma estratégia para remediar todo o mal que estava feito. Mas não. Ainda não estava esgotado o rol de incompetências: era preciso passar da gestão incompetente à danosa! É aí que cabe o inquérito disciplinar ao jogador. E atiram-lhe para cima com toda a lama que tinham à mão e destroem o que mais deveriam proteger: a ligação afectiva dos jogadores ao clube e a preservação, intacta, dos seus ídolos, a extensão natural do clube. Para que não subsista uma única hipótese de recuperar o jogador, de longe o melhor da equipa. E para que não subsista outra hipótese que não seja vender, agora, ao preço que o Real Madrid quiser pagar.
Um autêntico mimo de gestão. Como o do caso Nuno Gomes! Como foi possível?
A resposta é simples: pela mesma incompetência de gestão, que não faz ideia do que sejam as variáveis intangíveis que determinam o sucesso de um clube. Ouviram falar em mística, mas não fazem ideia do que seja, pensam que se resume ao nome da bonita revista que lá se edita. Aqui o problema não é saber que o responsável é o Jorge Jesus. O problema é mesmo que continue soberano em matérias para que, claramente, não está qualificado. E que a sua esfera de decisão não esteja reduzida às suas limitadas competências.
Na semana passada a comunicação social deu eco de uma passagem de Pedro Passos Coelho (PPC), nas jornadas parlamentares do PSD, a propósito das empresas públicas que acumulam prejuízos. A imagem que passou foi que PPC “quer fechar as empresas públicas que dão prejuízo”.
Muitas explicações foram, depois, dadas para esclarecer a ideia. Mais ou menos esta: as empresas públicas com constantes prejuízos para as quais exista uma alternativa de gestão privada que preste o mesmo serviço, com a mesma qualidade, e cumprindo o objectivo social pretendido, devem ser privatizadas. Nas restantes, onde os privados não possam ser alternativa, o Estado continuará a assegurar a sua gestão mas de forma mais disciplinada e rigorosa.
Como é habitual em comunicação e em política estes esclarecimentos já não passaram: o que passa primeiro é que fica!
Ninguém ligou nada a esta explicação. Ninguém excepto Sócrates. Que, evidentemente, veio logo voltar a agitar o fantasma do Estado Social – o mesmo que ele próprio vai destruindo e enterrando a cada dia que passa – e, incontornável e bem à sua esgotada maneira, enfeitar o discurso com o “ … eles depois bem tentam emendar, mas a gente percebe …”
Não é, no entanto, a ideia de PPC e do PSD para a prestação do serviço público, nem o número de ilusionismo de Sócrates, nem sequer o que tudo isto possa ter a ver com despedimentos na função pública (e eu até acho que tem mesmo a ver com a introdução do tema), o que mais me prende a atenção nesta polémica. O que mais me choca nesta discussão é o entendimento de que existam empresas para dar prejuízo!
As empresas não existem para dar prejuízo, isso á absurdo. Mesmo as empresas sem fins lucrativos, que existem para realizar um conjunto de fins que não o lucro, não existem para dar prejuízos. As empresas, públicas ou privadas, que prestem serviço público são pagas para isso. O Estado paga a essas empresas o serviço público que prestam. É do Orçamento Geral do Estado que devem vir as verbas para o pagamento do serviço público prestado.
Se a prestação de cada um dos mais diferentes serviços públicos é efectuada por empresas públicas ou privadas é outro problema. O que importa é o serviço público, cuja razão da existência é, terá que ser, servir as populações e não servir as empresas, públicas ou privadas. Seria outra discussão!
Não podemos aceitar que as empresas públicas acumulem prejuízos, ano após ano, financiados através de endividamento. Isso corresponde a desorçamentação, a encobrimento do défice e reflecte-se, evidentemente, nos números insustentáveis da dívida externa. As empresas públicas têm que estar estruturadas e dimensionadas em função da actividade que exercem, o que quer dizer do serviço público que prestam. E o Estado tem que orçamentar e pagar os custos que financia desse serviço público.
Se assim fosse, como é evidente, não haveria prejuízos: os custos estariam cobertos pelas receitas da prestação dos serviços públicos, pagos pelos utentes e pelo Estado. Os lucros ou os prejuízos seriam marginais: as que fossem mais eficientes teriam lucros e as que, ocasionalmente e não por sistema, não fossem tão eficientes teriam então prejuízo. Como qualquer outra empresa em qualquer sector de actividade…
Todos sabemos que não é assim: que as empresas públicas estão há décadas sobredimensionadas porque servem de albergue a todas as clãs das clientelas políticas. Que, por isso e pelo endividamento que atingiram, têm custos a mais. Muito a mais! E, para maquilhar o défice, proveitos a menos.
Este é que é problema. Isto é que deveria ser discutido… Claro que toda a gente percebe que não é possível continuar com esta mentira. As empresas não podem dar prejuízo toda a vida… Mas já o dão há quase 40 anos!
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