O famoso questionário que a ministra Mariana Vieira da Silva anunciou com 34 questões, que afinal são 36 é, como aqui disse na altura, a ideia mais estúpida e parva de António Costa. E é exclusivamente o resultado do estado a que António Costa se deixou chegar.
Este inquérito "estúpido e parvo", que tem exactamente o efeito contrário do anunciado, surge por três razões fundamentais:
1) Progressiva degradação da exigência para o exercício de cargos políticos, da responsabilidade dos partidos, em especial dos dois maiores que, mais que dividir, têm repartido o poder;
2) Criação de uma sensação de impunidade, agravada com a recente maioria absoluta, com manifestos sinais de absolutismo, levados à exuberância naquela pose pombalina de António Costa na entrevista à Visão, há cerca de um mês;
3) Sucessão de casos neste governo, um dos quais com António Costa apanhado de "calças na mão" em plena Assembleia da República, obrigando-o a recorrer à sua especialidade de tirar coelhos da cartola, donde acabaria por sair precisamente este.
António Costa tem responsabilidade em todas estas três instâncias. Tem-na na primeira, porque lidera o partido vai para dez anos. E porque toda a sua vida foi feita lá dentro. Tem-na na segunda porque criou a ideia de senhor absoluto do partido, do governo e do país. Com essa ideia, cria à sua volta uma ideia de impunidade. Quem está com ele, por muito mal que tenha feito, acredita que nada de mal lhe pode acontecer. E, claro, não é por ter sido Mariana Vieira da Silva a fazer aquela triste figura, que não tem a exclusiva responsabilidade neste "coelho" que ele próprio "tirou da cartola".
Que não evita que cheguem aos mais altos cargos da governação quem não tem condições para ser governante. Pelo contrário, evita que lá cheguem quem quem as tem.
Pessoas credenciadas, rigorosas, honestas, escrupulosas, realmente imbuídas de espírito de serviço público, pessoas realmente de bem, não aceitam sequer sujeitarem-se a assinar aquele questionário e um compromisso de honra a atestar a sua probidade. Se, pela crescente degradação da vida política do país, já vinha sendo difícil recrutar os melhores para os governos, a partir de agora passa a ser impossível!
Que Portugal é um país sem governo - ingovernado - não vai parecendo carecer de prova.
A maioria absoluta é o maior axioma da governabilidade. As agências internacionais, que procuram encontrar sinais de estabilidade nos países para garantir a sua viabilidade, que é como quem diz, estabilidade para os investimentos, e que muitas vezes se baralham, e precipitam nas suas conclusões, vêm sempre com os melhores dos olhos as maiorias absolutas de governação.
António Costa, acabado de receber no colo a tão inesperada quanto desejada maioria absoluta, ainda a beliscar-se para confirmar que não estava a sonhar, apressou-se a declarar que “a maioria absoluta não significa poder absoluto. Pelo contrário, a maioria absoluta corresponde a uma responsabilidade absoluta para quem governa”. Só que rapidamente trocou a ordem dos pressupostos, com o "poder absoluto" a passar a perna à "responsabilidade absoluta", a ponto de asfixiar por completo a responsabilidade. Absoluta ou relativa!
E caiu na irresponsabilidade. É certo que nem tudo é culpa exclusiva da maioria absoluta. Esta, conjugada com ausência de oposição - com o maior partido mergulhado na sua própria incapacidade, e o segundo, que apenas espera que a receita do populismo levede, a servir-lhe de fermento - acabou por convencer António Costa que "o poder absoluto" tornava a responsabilidade dispensável. Daí, ao absoluto descontrolo da governação dos últimos meses, foi um pequeno passo para António Costa, mas um grande salto para o "desgoverno".
Basta então encontrar sinais de ingovernabilidade.
É evidente que o "desgoverno" acabará, mais dia menos dia, com este governo. Tão evidente como a incapacidade e a pulverização da oposição se revela incapaz de gerar alternativas fiáveis. A erosão a que este governo fatalmente condenará o PS torna a "geringonça" irrepetível. E o populismo, levedo, acabará por tomar conta da alternância que tínhamos por adquirida, sem que se torne alternativa.
Se isto se não tornar evidente para António Costa, e se, mesmo que se torne, não tiver já condições para assumir as responsabilidades que lhe cabem, esta maioria absoluta acabará com a governabilidade e, definitivamente, com o regime.
O mecanismo de escrutínio prévio (mep), apresentado por uma ministra em esfinge palerma (mep), a Mariana estrela precoce (mep) do governo, é apenas a ideia mais estúpida e parva (mep) de António Costa. Mais uma, sem ponta por onde se lhe pegue.
Carla Alves, seja lá quem for, tomou ontem posse como Secretária de Estado da Agricultura. Hoje, está nas primeiras páginas dos jornais, e no topo da actualidade nacional, como mais um caso. Ou casinho. Ou melro ...
Diz que as contas bancárias arrestadas, e os processos judiciais por a bota (aquelas contas) não bater com a perdigota (dos rendimentos declarados), não são assunto seu. Mas do marido, por acaso também metido nas lides. Foi presidente de câmara. É isso. Nestes caso há sempre o marido. Ou a mulher. Ou o filho. Ou a filha. Ou o primo. Ou a prima. Ou o gato ... E o melro!
Já não dá para perceber o que é maior - se a trafulhice, se a incompetência. No meio disto tudo até já tenho pena do Costa. Mesmo que ele não ma mereça!
Não há dúvida - António Costa está tão desligado da realidade, que nem a realidade do partido atinge.
Foi na "prata da casa" que António Costa encontrou a solução para substituir Pedro Nuno Santos no Ministério das Infraestruturas e da Habitação. Dividiu o ministério em dois e entregou o das Infraestruturas a João Galamba, até aqui Secretário de Estado da Energia. O da Habitação não foi mais que passar de Secretaria de Estado a Ministério, passando Marina Sola Gonçalves, a Secretária de Estado, a Ministra.
Quando, por tudo o que têm sido estes ainda tão curtos meses de governação, em permanente convulsão, e os mais evidentes sinais dos pecados capitais que o Presidente, ainda ontem, na sua mensagem de Ano Novo, identificou - “erros de orgânica, descoordenação, fragmentação interna, inação, falta de transparência e descolagem da realidade” -, e sem pressão de tempo, pelo contrário, com o Presidente ausente do país, tinha até mais tempo para aproveitar esta oportunidade para proceder a uma remodelação que pudesse inverter o que tem sido uma governação desastrada, António Costa apenas dá mais um sinal de esgotamento.
Mais que confirmar que já não só não tem capacidade de recrutamento na sociedade civil, mostrou que o seu campo de recrutamento se restringe já, e apenas, ao próprio governo. Se António Costa não estivesse acossado, fechado no seu círculo de fidelidades, e "descolado da realidade", teria ele próprio apresentado a demissão ao Presidente da República. Não para criar uma crise política, mas para criar a oportunidade para constituir um governo novo, capaz de assegurar um rumo novo à governação.
Mas, se não consegue recrutar fora do governo sequer um ministro, como poderia encontrar uma dúzia de ministros novos para um governo novo?
E, já agora, será que o primeiro ministro acredita mesmo que não há nada para explicar sobre Fernando Medina? Que acredita que ele tem condições para continuar Ministro das Finanças? E que acredita que ele vai ser deixado em paz?
Diria que não. Que apenas acredita que consegue sempre virar a página sem virar de página.
A mensagem de Ano Novo do Presidente Marcelo foi mais um inventário - o que também é apropriado para esta altura do ano - do que uma lista de desejos. Em vez das dozes passas no salão, Marcelo foi ao "armazém" inventariar os "pecados capitais" do governo. Só contou seis - “erros de orgânica, descoordenação, fragmentação interna, inação, falta de transparência e descolagem da realidade”.
Os outros deveriam estar em zonas de mais difícil acesso...
Afinal António Costa não vai ao Catar. Mas não deixa a selecção sem governo neste terceiro jogo, com a Coreia do Sul. Vai lá estar Ana Catarina Mendes, a irmã do seu novo "mais que tudo" nas sucessivamente falhadas tarefas de coordenação do seu descoordenado governo.
Vamos lá ver se, agora, depois da exoneração de um secretário de Estado que contrariava tudo o que o respectivo ministro afirmava, e de, só não pode dizer mais um, porque é uma, secretária de Estado que, para além de fazer o mesmo, ainda tinha também uns problemazitos com a Justiça, a coisa se coordena mais um bocadinho.
Se o problema é coordenação, pelo menos foi dado um bom sinal. É que, mesmo sem lá ir, Costa coordenou tudo muito bem com o que se passava no Catar... Tudo foi tratado enquanto a selecção ganhava, ficava apurada, e ocupava sozinha o espaço mediático.
Este governo não está apenas em desorientação total, com casos e casinhos diários; continua sem rumo, sem estratégia e sem seriedade.
Na sua proposta salarial para a administração pública, ontem apresentada pela ministra Mariana Vieira da Silva, insiste em trapalhadas, habilidades e truques, como já fizera no anúncio da actualização das pensões. Mistura números para atirar com números, e chegar a médias a partir de somas de alhos com bugalhos.
De tudo isso ressalta que não tem uma estratégia para o país, e que, afinal, a maioria absoluta não serve para mais nada que gerir o curto prazo. Que a estratégia para o país não vai além da orçamental, e que, para além do curto prazo do orçamento anual, apenas vê o médio prazo das próximas eleições.
Há poucas semanas o governo reconhecia que tinha um problema de salários no problema do Serviço Nacional de Saúde. E prometia resolvê-lo, em particular no caso dos médicos. Há poucos meses reconhecia que o país tinha um problema de salários. E que nem era tanto de salário mínimo, mas de salário médio. Há poucos meses anunciava que o objectivo da legislatura era aproximar o peso dos salários no PIB ao da média da média europeia, o que implicaria um aumento médio dos salários em reais em 20% no conjunto dos próximos quatro anos. Há poucas semanas, ou meses, reconhecia a necessidade absoluta de reter cérebros, de evitar que os mais qualificados continuassem a sair do país. Há poucas semanas, ou meses, reconhecia que a Administração Pública, a Saúde, ou a Educação, teria que ter condições para atrair os melhores. Há poucas semanas, ou meses, dizia que isso se conseguiria premiando os melhores desempenhos.
Ontem, com a proposta apresentada, percebeu-se que nada disso era para levar a sério, e que tudo é para continuar inamovível. Que apenas os salários alinhados com o SMN são aumentados em linha com a inflação. E que basta um vencimento bruto acima de 2.600 euros para se ficar com 2% de aumento nominal, e voltar a cortar - o governo não gosta do verbo, mas é o que é, sem volta a dar-lhe - mais 6% nos salários.
Nas palavras, a solução é aumentar salários. Nos actos, é cortá-los. É esta a estratégia errática de António Costa!
Os erros, mesmo que "obviamente graves" corrigem-se. Não se passa nada, e siga a dança... mesmo que com passes trocados, e pares desacertados.
Mais uma trapalhada. E já houve um governo com apoio parlamentar maioritário que caiu de trapalhada. Não é, desta vez, o caso deste. Não quer dizer que não seja na próxima. A batata da lógica fica quente, e a escaldar as mãos de António Costa. Mais ninguém lhe pega.
No novo aeroporto, em vez de levantarem e aterrarem aviões, há décadas que levantam e aterram trapalhadas. O tráfego é tão intenso que corre o risco de ficar saturado ainda antes de começar a ser construído.
A última era de ontem, antes de hoje, logo pela manhã, chegar mais uma, fresquinha.
Ontem foi publicado um despacho assinado pelo secretário de Estado das Infra-estruturas, Hugo Santos Mendes, do ministério de Pedro Nuno Santos, a determinar o aprontamento do Montijo para 2026, complementado pela construção do de Alcochete, a concluir em 2035, e ainda de mais obras na Portela, que encerraria com a abertura de Alcochete. À noite, o ministro passou pelas televisões a assumir a solução como decisão final. Finalmente!
As críticas não pararam de chover, de todos os lados. Ninguém tinha sido ouvido, e havia leis para alterar. Desde logo a que obrigava a parecer positivo dos municípios envolvidos, que há muito não estavam pelos ajustes. Era a maioria absoluta a funcionar em todo o seu esplendor, apenas uma semana depois do primeiro-ministro ter garantido no parlamento que aguardava a decisão do presidente eleito do PSD, Luís Montenegro, sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa para que houvesse “consenso nacional suficiente” tendo em vista uma decisão “final e irreversível” sobre esta matéria.
Não "batia a bota com a perdigota", mas isso já começa a não surpreender. Surpresa, que também já não surpreende, foi a reviravolta desta manhã, no comunicado publicado pelo gabinete de António Costa: “O primeiro-ministro determinou ao Ministério das Infra-estruturas e da Habitação a revogação do despacho ontem [quarta-feira] publicado sobre o novo aeroporto da região de Lisboa”... e “reafirma que a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição e, em circunstância alguma, sem a devida informação prévia ao Presidente da República”. O remate final do comunicado, para quem pudesse ter ficado com dúvidas sobre mais um episódio da guerra aberta entre Costa e Pedro Nuno Santos, é esclarecedor: “Compete ao primeiro-ministro garantir a unidade, credibilidade e colegialidade da acção governativa..."
Agora é só esperar pela lógica demissão do ministro das Infra-estruturas. Ou, na falta dessa lógica, pela lógica exoneração de Pedro Nuno Santos pelo primeiro-ministro. Ou ainda que a lógica seja uma batata, que começa a ser a maior lógica deste governo que, tendo tudo para governar com alguma lógica de rumo, prefere prosseguir a navegação à vista, mesmo que no meio das nuvens.
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