O governo encontrou no luto pelo Papa Francisco um bom pretexto para não festejar o 25 de Abril. Que, de qualquer maneira, já não festejaria. Na realidade não se lhe conhecia qualquer iniciativa, nem sequer vontade, para festejar o 25 de Abril. Porque o 25 de Novembro é que é para festejar!
Ao final do dia, ontem, depois do Presidente Marcelo ter metido mãos à massa, obrigando Luís Montenegro a obrigar o secretário de Estado, Hernâni Dias lá apresentou a demissão. A contragosto Montenegro lá teve que aceitar a primeira baixa no seu governo. Sem falar, sem dizer nada...
Não é membro do governo, não é ministro, nem secretário de Estado, é consultor do Governo para esta lei em concreto. E, também como Hernâni Dias, não vê nesta acumulação de funções qualquer conflito de interesses. Exactamente tal e qual Luís Montenegro não viu, não via e continua a não ver!
O famoso logótipo que o Governo de António Costa encomendara ao atelier de Eduardo Aires - e que Luís Montenegro, como primeira medida do governo retirou, não lhe permitindo mais que seis meses de vida, para repor as quinas e os castelos, - no espaço de um mês arrecadou dois prémios.
Quando, ontem, se voltou a ver na página oficial do governo, pensou-se que, fosse por tanto prémio, ou por tanto entusiasmo no apoio à candidatura de António Costa à Presidência do Conselho Europeu, Montenegro tivesse decidido repo-lo.
A última reunião do Conselho de Ministros, presidida pela segunda vez pelo Presidente Marcelo, foi a primeira nas suas novas instalações. Mas não é esta, mesmo com os beijos e abraços de Costa e Marcelo, a lembrar os bons velhos tempos, como se nada se tivesse passado, a notícia do dia: essa é a do maior excedente orçamental da História do País.
Poderia dizer-se que é a picada final de António Costa no presente que deixa a Montenegro. O cheiro a veneno já anda no ar - mesmo com" os cofres cheios", como para aí se diz, não vai dar para o novo governo cumprir muito do que foi prometido!
Na na véspera das eleições, como sempre achando que tudo pode e que tudo lhe fica bem, Marcelo tinha mandado dizer que, não só "o não, é não", como, por ele próprio, o Chega não entraria nunca, em circunstância alguma, no Governo.
Continuando convencido "tudo pode e que tudo lhe fica bem", começou a receber os partidos para, nos termos da Constituição, os ouvir para depois indigitar o líder do mais votado para constituir governo, ainda antes de conhecidos os votos dos portugueses emigrados. Por acaso, e como é sabido desde a noite de 10 de Março, decisivos para apurar os resultados eleitorais. Os tais que darão a conhecer o partido mais votado.
Ontem foi a vez de receber em Belém precisamente o Chega. À saída, André Ventura proclamou de imediato que Marcelo lhe "negou categoricamente" colocar algum obstáculo à sua entrada para o governo.
Não confirma ter dito o que Ventura diz que lhe disse. Mas também não desmente. Também não confirma que tenha mandado dizer que não queria o Chega no governo. Mas também não desmente. Refugia-se no "não comenta", logo ele que nada deixa de comentar. Sejam declarações, notícias, hipóteses, suposições, ou efabulações...
É Marcelo cada vez mais enterrado no lodo em que transformou este seu último mandato.
João Paulo Catarino é Secretário de Estado da Conservação da Natureza do governo que acordou com o PSD a entrega do assunto a uma Comissão Técnica Independente. Do governo cujo ministro da tutela já dissera que Santarém é longe de Lisboa.
Pois, mas é mais perto de Proença-a-Nova, onde o Secretário de Estado presidiu à Câmara.
A descoordenação do governo já não é notícia. Notícia é que a construção do novo aeroporto, seja lá quando for, já não está apenas sujeita ao "lobismo". Também lá entra o mais primário e desconchavado caciquismo.
Os portugueses que conseguem o "milagre" de lhes sobrar dinheiro no final do mês, mais os portugueses que têm e sempre tiveram dinheiro, correram aos certificados de aforro. Uns para aplicar as suas poupanças, outros, as suas fortunas.
Porque passaram de repente a gostar de aplicar o seu dinheiro em dívida pública?
Não. Porque os bancos portugueses, em cartel, por ganância, deixaram de remunerar os depósitos que recebem, para se "abotoarem" com as mais altas margens financeiras na Europa. Seja nas suas operações de crédito, onde praticam já taxas pornográficas, seja nas suas aplicações no BCE, pelas quais são remuneradas à taxa Euribor, que não tem parado de subir. Quer dizer, os bancos portugueses podem até não conceder crédito, para continuarem a ver crescer os seus lucros que, como se sabe, estão a bater recordes.
Como os bancos não pagam pelo dinheiro que lhe entregam, mas sabem pagar-se bem pelo que lhe pedem, os portugueses, os que têm dinheiro e não são burros, passaram a aplicá-lo em certificados de aforro, onde o Estado pagava juros de 3,5%. Os bancos não gostaram. Evidentemente. Mexia-lhe na "mama"!
No início da semana, João Moreira Rato, que por acaso fez (longa) carreira justamente na gestão da dívida pública, no Instituto de Gestão de Crédito Público (IGCP), e por acaso, Chairman do Banco CTT, veio a público dizer que o melhor que o governo tinha a fazer era, para já, interromper a emissão de certificados de aforro. Nem mais, nem menos!
Há por aí gente a dizer que o governo fez muito bem. Se pode pagar 2,5% por que há-de pagar 3,5? E que com isso ganhamos todos. Por mim, digo que se o governo fosse tão rápido a reagir às necessidades dos portugueses como reage às dos bancos, viveríamos num grande país. Num país certificado!
"Obviamente demito-o" - a frase com que Humberto Delgado prometia demitir Salazar se ganhasse as presidenciais de 1958, é uma das mais célebres da política portuguesa.
Obviamente demito-o - era a frase que toda a gente esperava ter ouvido hoje a António Costa, relativamente ao ministro João Galamba. Toda a gente, e mais ainda, depois das suas declarações de ontem, à chegada a Lisboa, e à saída do aeroporto.
Durante toda a manhã ambos - e não só - discutiram o assunto. João Galamba saiu de S. Bento, a meio da manhã, sem gravata, indumentária que lhe "sustentava" a posição de ministro. Tendo entrado com gravata, e saindo sem ela, "a leitura" era que João Galamba ... já era...
Ao início da noite João Galamba apresentou o pedido de demissão. Estranhou-se que fosse tão tarde. Só uma agenda o poderia ter determinado e, essa, teria que ser a da reunião de Belém, ao fim da tarde.
Surpreendentemente, poucos minutos depois, o primeiro-ministro anuncia ao país que não tinha aceitado o pedido de demissão do ministro das infra-estruturas. Estava ainda a comunicar ao país a sua surpreendente decisão quando a Presidência da República emitia um comunicado, informando que discordava dela.
Obviamente demito-o - é o que o Presidente diz nas entrelinhas do comunicado. Obviamente, António Costa não lhe deixa alternativa.
António Costa, como qualquer observador minimamente atento, sabia que Marcelo exigia que esta oportunidade fosse aproveitada para uma remodelação do governo. Que não se contentaria com a simples substituição de Galamba que, já o tinha dito, não poderia continuar no executivo. O primeiro-ministro, mesmo que quisesse - e admito até que quisesse - não tem condições para a fazer. Ou, pelo menos, para fazer uma remodelação credível e verdadeiramente renovadora. E por isso levou a Belém apenas "a cabeça" de Galamba, retirando-a logo que pôde confirmar que, para Marcelo, não chegava.
Quem ouviu a comunicação de António Costa, sem mais dados, terá ficado surpreendido pela atitude política. Via-lhe coragem. Desafiava o Presidente da República, perante o permanente cenário de dissolução que vinha alimentando. Se é para dissolver, então dissolva agora, e não quando mais lhe der jeito. Por outro lado, deixava uma mensagem exactamente contrária àquela que tem sido dada - a do passa culpas. A da culpa passar sempre para segundas figuras, deixando cair toda a gente para salvar a pele que mais importe salvar, sem sombra de solidariedade. Costa assumia toda a responsabilidade, e todo o risco. Entre "a espada e a parede", António Costa enfrentou a espada.
Isto, em política, rende!
Na realidade, Costa não surpreendeu. Não foi corajoso, não teve sentido de Estado. Foi, tão só, político. E, para isso, habilidade não lhe falta. O Galamba que, "corajosamente" e obrigado pelo "dever de consciência", segurou lá bem alto, é o mesmo da cabeça que ele levara a Belém. Por isso, e só por isso, o Galamba demitido a meio da manhã, acabou a pedir a demissão ao fim da tarde.
A batata quente está agora a queimar as mãos do Presidente Marcelo. Só que, antes das dele, estão as de todo um país. Escaldadas!
Poderia ser mais uma trapalhada, mas é bem mais que isso. É mais um carimbo de descrédito num governo de aldrabões.
Apertados nas trapalhadas, logos os trapalhões criaram a aldrabice do parecer jurídico que garantia robustez à prova de bala à decisão de demitir, com justa causa, a CEO da TAP. Instigados a apresentá-lo na Comissão Parlamentar de Inquérito, fingiram que não percebiam.
Pressionado, e ameaçado de crime de desobediência, em Nota Oficial da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, o governo alega "a salvaguarda do interesse público" e acrescenta que "o parecer em causa não cabe no âmbito da comissão parlamentar de inquérito" e que "a sua divulgação envolve riscos na defesa jurídica da posição do Estado".
Se não fosse insistir na aldrabice, seria insistir na trapalhada. Admitir haver riscos na sua divulgação, era negar a sua própria robustez. Se só poderia piorar, piorou, com Fernando Medina a confirmar a mentira, com a maior desfaçatez: "Não há nenhum parecer"!
Como já se adivinhava que não havia, mesmo sem se imaginar que os aldrabões pudessem chegar a tanto. A partir deste episódio já se pode deixar de carregar na tecla do "regular funcionamento das instituições" e passar para a da "salvaguarda do interesse público".
Depois de despedir a francesa, o governo está a despedir-se à francesa. De fininho, deixando a conta para trás...
António Costa veio a terreiro dizer que o e-mail que o ex-secretário de Estado Hugo Mendes enviou à presidente executiva da TAP sobre o chefe de Estado "é gravíssimo do ponto de vista da relação institucional com o Presidente da República e inadmissível no relacionamento que o Governo deve manter com as empresas públicas".