Esta semana fica assinalada pela presença entre nós da pequena Greta Thunberg, marcada por grande agitação e espectáculo à chegada, e por invulgar descrição nos dias seguintes. Mais do que os inicialmente previstos. De passagem para Madrid, para participar numa manifestação à margem de mais uma cimeira do clima, a COP 25, iniciada na passada segunda-feira e a decorrer até ao fim da próxima semana, a jovem activista sueca acabou por ficar mais uns dias em Portugal. E acabou por apenas partir na noite de ontem, momento que inevitavelmente voltaria a merecer grande destaque mediático.
Mas não foi por nada disso que as redes sociais se voltaram a agitar. Foi mesmo por ela, e pelo que representa.
O palco de eleição do escárnio e do mal dizer voltou a erguer-se para bater na pequena Greta. Não acolheu no entanto todos os que, com mais ódio do que o que lhe apontam, saem à rua para lhe atirar pedras. Outros, que dizem abominar as redes sociais e tudo o que por lá se passa, subiram a palcos mais exclusivos para, dai, fazerem exactamente o mesmo. Quiçá com mais violência ainda.
Já não é grande a imaginação, pelo que se limitam a repetir-se uns aos outros. Que” devia era estar na escola”. Que só por isso que a juventude a segue, que tudo o que seja faltar às aulas tem adesão e popularidade garantidas entre os jovens. Que vive do espectáculo. Que é instrumentalizada. Que destila ódio, como se eles próprios fizessem outra coisa. Que é doente. Que precisa de ser internada numa unidade de psiquiatria…
Ouvimos e lemos tudo isto e perguntamo-nos: porquê?
Por acaso é falso o que ela denuncia?
Não é verdade que não há planeta B?
Não está em causa o futuro das gerações, e designadamente daquela a que pertence?
Não é mesmo imperioso repensar e reformular todo um modo de vida que se esgota no horizonte dos que o vivem?
Não me parece muito difícil encontrar uma resposta afirmativa para todas estas interrogações.
Se assim é, por que reage assim tanta gente?
Porque a pequena Greta se tornou numa celebridade?
Porque se tornou numa referência para as novas gerações?
Talvez também por isso. Mas isso é o mensageiro que se quer matar para acabar com a mensagem. O que, acima de tudo, está em causa é a mensagem. Essa é que está a colocar em causa os mais poderosos interesses instalados no planeta. Que uns, poucos, têm por missão defender, e outros, muitos, se limitam simplesmente a imitar. Porventura por mimetismo!
Hoje poderia vir aqui escrever sobre as alarvidades que se disseram e escreveram a propósito da presença entre nós da pequena Greta. E talvez a elaborar uma tese que procurasse explicar por que é que a direita é tão grosseiramente impiedosa com a pequena activista e - quem sabe? - a concluir que não será tanto por serem broncos e ignorantes, mas mais por preconceito ideológico. A ideia que os recursos do planeta são finitos, estando já alguns à beira do esgotamento, pelo que a sua utilização terá que, inapelavelmente, ser sujeita a limites estabelecidos pelo Estado, choca violentamente com as suas mais profundas crenças.
Ou sobre a rara notícia do afastamento dos Tribunais de dois conhecidos juízes por suspeita de corrupção, um por expulsão - Rui Rangel - e outro - outra, Fátima Galante, uma das suas ex-mulheres - por reforma compulsiva. Para eventualmente concluir que esta é uma decisão com algumas décadas de atraso, mas talvez só agora possa ter sido possível.
Mas acabei por escolher escrever sobre um Relatório - a apresentar publicamente amanhã mas já hoje dado a conhecer - da OCDE e da Comissão Europeia que conclui que o nosso Serviço Nacional de Saúde é o mais eficaz a salvar doentes. “O Estado da Saúde na União Europeia (UE) 2019” - assim se chama o Relatório - conclui que em Portugal morre-se menos por causas evitáveis e tratáveis do que na média europeia.
Porque é a melhor notícia de hoje. E nem que seja apenas para dizer que, se é assim com todas as dificuldades por que passa e tem passado, imagine-se o que seria, aos 40 anos, o nosso SNS adequadamente financiado, e bem gerido... Se calhar, e na terminologia do Presidente Marcelo, seria aquilo que já foi: o melhor Serviço Nacional de Saúde do Mundo!
Hoje recebemos a visita da criança/jovem de quem se fala. Greta Thunberg atravessou o Atlântico de veleiro, vinda dos Estados Unidos, chega hoje a Lisboa e segue amanhã, de comboio, para Madrid, onde ontem arrancou mais uma cimeira, que se prolongará até ao fim da próxima semana à procura, se não de respostas, pelo menos de manter vivo o debate sobre a emergência climática em que nos deixamos cair.
A recebê-la, na doca de Santo Amaro, no porto de Lisboa, estará muita gente. Estará o Presidente da Câmara, estarão deputados ... Só não estará o Presidente Marcelo...
Não precisaria de estar. Muito menos precisaria de se prestar ao mais ridículo exercício de cinismo e hipocrisia política. Não está, e todos sabemos por que não está!
Mas, quem está em todo o lado, sem qualquer reserva e tantas vezes até sem pudor, não pode dizer que, para não estar presente, teve de reprimir os seus desejos para evitar "aproveitamento político". Essa é que não, Sr Presidente. Um bocadinho de decoro, se faz favor!
Hoje, no último dia do prazo, o Banco de Portugal entrega finalmente na Assembleia da República a lista dos grandes devedores da banca, depois de, em Janeiro passado, ter sido aprovada a lei que obriga as instituições de crédito a divulgar informação sobre os créditos que provocaram as perdas que as conduziram ao pedido de auxílio do Estado.
Depois de tanta resistência em fornecer esta informação, levantando sempre os maiores problemas, sempre perdidos nos excessos das tecnicalidades apenas acessíveis aos seus altos quadros, o Banco de Portugal acabou por fazer chegar ao Parlamento não uma, mas duas listas: uma para os deputados, e outra para divulgação pública.
É sempre assim, cada vez que falamos de transparência...
Amanhã, os alunos das escolas portuguesas, depois de em Março terem aderido ao grande protesto mundial dos estudantes ("não há planeta B"), vão participar numa greve climática para desenvolver acções de protesto pelas agressões ambientais em 34 cidades.
Mas há testes marcados para esse dia. E os alunos vão ter falta injustificada, justificada por todos os directores escolares, mesmo pelos que saúdam o seu abraço à causa, e juram encontrar toda a justificação para o protesto.
Hoje é dia de protesto dos jovens. Hoje é dia de greve às aulas... pelo clima. Não é contra os professores, nem contra o ministro. É contra todos nós. É um protesto pelo estado em que lhes estamos a entregar o planeta. Pela indiferença com que temos encarado e continuamos a encarar as alterações climáticas que dramaticamente lhes acabam com o futuro. Que é deles, mas cada vez menos lhes pertence.
Tudo começou há pouco mais de seis meses, com uma miúda sueca de 16 anos, Greta Thunberg e com a mais inquietante das suas interrogações: “porque hei de preparar-me para um futuro que pode não existir?”
A partir daí não parou de inquietar o mundo, e é hoje uma das mais fortes candidatas ao Prémio Nobel da Paz (sim, Mr Donald Trump). Que o seu exemplo seja hoje replicado. Em Portugal e por todo o mundo!
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