Toda a gente sabe que o acordo imposto à Grécia pelo Eurogrupo não resolve coisa nenhuma. Nem à Grécia nem à União Europeia, daqui por (poucos) meses tudo volta á mesma!
Tsipras disse-o desde logo: “assino, mas não concordo” – mais ou menos isso – e por todo o lado, gente de todos os quadrantes afirmou e reafirmou que nada tinha ficado resolvido, tudo tinha sido adiado, empurrado para a frente. Muitos salientaram ainda os riscos da humilhação. A História está farta de os mostrar, e se alguma coisa emerge deste acordo a que a Grécia foi forçada é justamente a humilhação a que foi sujeita.
Vem isto a propósito da onda de indignação que por aí anda por parte da mais cega ortodoxia da direita a propósito de um eventual plano secreto do governo grego para abandonar o euro, confirmado até num suposto vídeo de Varoufakis. A Grécia é – dizem – o cavalo de Tróia do euro!
Sendo evidente para toda a gente que se a União Europeia não mudar – e não só não se vê como possa mudar, como essa mesma ortodoxia de direita e germanófila não quer que mude – a Grécia não cabe no euro (nem, nessas condições, Portugal, mas isso eles não percebem), normal é que o governo grego esteja a trabalhar num plano de regresso à sua moeda. A não ser que fosse ainda mais incompetente e irresponsável do que o que o pintam. O governo grego só não saiu – nem teve condições de ameaçar fazê-lo, e daí ter de se sujeitar à humilhação – pelo seu próprio pé porque não estava em circunstâncias de o poder fazer. Por razões (menores, apesar de tudo) conjunturais de política interna – os gregos queriam manter-se no euro – mas acima de tudo – que não é pouco, é mesmo tudo – porque não teve apoio externo. Nem Rússia, nem Estados Unidos, nem China, e sem reservas de divisas para pagar importações, nunca podia adoptar uma moeda própria …
Antes de acusar o governo grego de cavalo de Tróia, haveria que acusar a União Europeia de fazer da Grécia um bombista suicida. Se o governo grego estiver a preparar a sua saída está apenas a fazer o que a realidade lhe impõe. O que lhe compete. O que a lucidez aconselha.
Que no meio disso tudo recuse apertar os explosivos à cintura é o que nós devemos ardentemente desejar!
Há pouco mais de uma semana os gregos disseram "não" a mais austeridade. Ontem, uma sondagem inidicava que os gregos diziam "sim" a mais um programa de austeridade, aprovado pelo Parlamento já madrugada dentro, bem para além do limite da meia-noite imposto pelos credores (sim, não há outra designação).
Tsipras não acredita no programa, e disse-o com todas as letras. Que assinou, que teve de assinar e defender no Parlamento grego. Que o aprovou com votos de oposição, com a maioria dos votos contra a partir do partido de Tsipras.
É destes paradoxos que se faz hoje a história da Europa. Foi até aqui que o directório alemão que manda na Europa nos trouxe. Todos querem expulsar a Grécia, mas ninguém quer ficar com esse ónus. Queriam que fosse o Syriza a fazer-lhe o favor, mas Tsipras percebeu isso. E percebeu que nesta altura está tudo virado ao contrário. E que é justamente o seu eleitorado, os mais desfavorecidos dos gregos, os que mais sofrem, que mais ainda teria a perder. Ganhar, ganhavam os outros, os que tinham dinheiro e o tiraram todo do país... para depois, incólume e reforçado, se servir à vontade do espólio que sempre fica entre os destroços.
E para que a história dos pardoxos não acabe aqui, os mercados acordaram esta manhã em euforia com o "sim" grego. Como se só eles não percebessem nada do que se está a passar... Como se só eles estivessem convencidos que aquilo que o Parlamento grego votou tem algum tipo de aplicabilidade, quanto mais alguma probabilidade de sucesso.
Uma fotografia de Passos Coelho ao lado da sua mulher, de cabeça descoberta, publicada no Correio da Manhã num dia qualquer da semana passada, provocou grande agitação nas redes sociais. De um lado gente que não se coibia de achar que o primeiro-ministro estava em modo de despudorado aproveitamento da doença da mulher, que já retirara do domínio privado no livro que encomendara e apresentara há umas semanas atrás, com os mesmos fins eleitorais. De outro, gente da máquina laranja que não se cansava de partilhar a fotografia, replicada como um virus, como que a querer dar razão aos primeiros. E por fim, de outro ainda, gente politicamente correcta que se insurgia violentamente contra os primeiros, sem porventura ter reparado nos segundos.
Era gente conhecida, gente de referência de direita e de esquerda, que manifestava a sua repugnância pela fauna das redes sociais, desprovida de valores e sentimentos e capaz das maiores atrocidades. Energúmenos que não medem as alarvidades a que dão corpo, como a de não conseguirem ver na imagem daquela cabeça descoberta uma prova de invulgar coragem da senhora, para verem apenas uma demonstração de canalhice do seu marido e chefe do governo do país.
Confesso que ao ver desfilar tudo isto à minha frente, e como somos sempre tentados a tomar partido em tudo o que seja polémica, me inclinava muito para o lado do politicamente correcto. E achava tão estúpidos os que ousaram pensar que Passos Coelho pretendia tirar partido da doença da mulher quanto a acéfala rapaziada do partido, que só por isso se prestava à triste figura de dar razão aos outros.
Quando vi e ouvi o que foram as declarações de Passos Coelho no final do Conselho Europeu de ontem, um bolo de hipocrisia em que a reivindicação da paternidade da ideia que tudo desbloqueou era a cereja que faltava, veio-me logo à cabeça a polémica das redes sociais. E fiquei com a sensação que, se calhar, me tinha deixado enganar...
Cá para mim, quem faz aquilo... Para garantir votos é capaz de tudo. Até das coisas mais abomináveis!
Já noticiaram que se chegou a um acordo, e que está aí o terceiro programa de resgate da Grécia. Mas alguém se esqueceu de avisar que a Europa acabou.
Há uma ligeira possibilidade de não ter sido esquecimento: é possível que quem ficou de o informar tenha simplesmente decidido não cumprir a missão. Resta saber se por cobardia ou se por vergonha. Mas vergonha não é coisa que abunde por aí...
Começa finalmente a perspectivar-se alguma solução para a crise grega, que não para o problema grego, esse permanece e continuará a crescer.
Depois das piruetas de toda a gente, de Tsipras pisar as linhas vermelhas e de Juncker, presidente da comissão, Lagarde, do FMI, e Donald Tusk, presidente do conselho europeu, terem pisado as do ridículo, juntando-se a Jack Lew, secretário do Tesouro norte-americano, para pedir um alívio (perdão) da dívida grega. E depois de Schauble lhe ter proposto trocar a Grécia por Porto Rico, e Merkel jurar que poderá fazer tudo à dívida grega menos cortá-la na forma clássica (há certamente formas neoclássicas), o governo grego passou a apresentar propostas sérias e credíveis (Hollande), em texto completo (Dijsselbloem, o holandês que preside ao eurogrupo), e tudo se encaminha para a concertação.
Que não para o conserto: o que se destruiu na Grécia já não tem conserto!
Bem me parecia que nesta coisa dos ziguezagues Tsipras não andava sozinho. Se são precisos dois para dançar o tango, quantos são precisos para dançar zorba?
"Varoufakis demitiu-se", era a surpreendente notícia desta manhã. "Mo More Minister", escreveu no twitter...
A notícia não era: "Depois da vitória no referendo, Tsipras demitiu Varoufakis". E no entanto foi isso que, evidentemente, aconteceu. Depois de surpreender com o anúncio do referendo, Tsipras não perdeu tempo para voltar a surpreender.
Com uma vitória estrondosa no bolso, com redobrada legitimação de poder e sem oposição, Tsipras voltou a mostrar que é um político sagaz, e pouco diferente dos outros, que usam gravata. Porventura mais esperto, e provavelmente mais desconcertante!
Preparava-me para começar a escrever sobre o incontornável tema do dia (da semana, do mês, do ano...), sobre o claro e rotundo NÂO que é um SIM à honra de um povo, como ontem, em cima da hora, aqui expressei, quando me deparei com este texto do Pedro Santos Guerreiro. Li-o, e quando acabei percebi que não tinha nada a acrescentar: era aquilo!
O melhor é mesmo não escrever mais nada. Para não estragar... O título é o mesmo, como não poderia deixar de ser. A fotografia também de lá vem, e percebe-se por quê.
Sei que há gente que não gosta. Só tenho a acrescentar que... desses, tenho pena.
Miguel Relvas ressuscitou. Estamos de resto a atravessar um extraordinário período de Páscoa… Com a aproximação das eleições, e com o terreno bem adubado pelo efeito grego, o campo do governo tornou-se num espaço de alta fertilidade. De repente, o governo passou da Idade Média para o Renascimento. Mas sem nunca largar o obscurantismo!
Estas coisas agora fazem-se com livros. Até Relvas – “vai estudar malandro”, veja-se a ironia – ressuscita num livro. E à volta do livro – como se da gruta tumular se tratasse – reúnem-se as várias testemunhas da ressurreição, que hão-de partir mundo fora a anunciar a boa nova. Na circunstância: Relvas voltou. Está vivo e anda por aí!
O apóstolo principal não era Pedro. Nem Simão, nem Tomé. Chama-se José Manuel: José Manuel Durão Barroso, como se sabe um dos grandes responsáveis pelo inferno em que estamos metidos, mas que anda por aí como se nada tenha nada a ver com isso. Que não teve pejo em, também ele, meter as mãos – sujas, sujas até ao pescoço – no saco do adubo grego para alarvemente alimentar a revegetação do seco e árido campo do governo
E vai daí, o ex-presidente da Comissão Europeia, sem se perceber o que é que o cu tem a ver com as calças - que é como quem diz: o que o livro tem a ver com a coisa? - desata a aconselhar os portugueses a olharem para a Grécia, e a concluir que Portugal só não está na mesma situação graças à determinação do governo e de Pedro Passos Coelho. Ainda se fosse graças a Miguel Relvas… Ou ao "O outro lado da governação"…
Coitados dos gregos. Servem a esta gente para tudo. Até para que ninguém fale dos escândalos das privatizações que o Tribunal de Contas denunciou no início da semana. Até parece que não se passou nada… Até parece que em qualquer país a sério, um governo que tivesse sido acusado do que este foi, não estava já no olho da rua!
Ah! Afinal o efeito grego é mais soporífero que adubo...
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