O Brasil comemora hoje os 200 anos de independência, diz-se. E escreve-se.
Não estou tão seguro disso. Parece-me mais que hoje o Brasil celebra mais o medo que a independência. Pessoas com medo de sair à rua, que Bolsonaro quer encher de camiões e tractores, e desfiles oficiais inundados de cartazes de activistas pró ditadura militar (1964-1985) dão mais uma imagem de medo do que de festa da independência!
Há 200 anos, D. Pedro gritou "independência ou morte" nas margens do Ipiranga. Hoje, o ponto de exclamação vira de interrogação: independência ou medo?
Foram condenados a penas entre os quase 10 e 13 anos de prisão, nove dos doze independentistas catalães envolvidos na preparação e execução referendo separatista sobre a independência da Catalunha, em 2017, por esta altura do ano.
As penas ficam longe dos 25 anos reclamados pelo Ministério Público, que somava a acusação do crime de rebelião à lista de crimes em julgamento. Caiu a rebelião, mas não caíram as outras acusações, como a sedição, ou o estranho desvio de fundos públicos.
Pensava eu que não estaria a ser muito exigente quando ontem, a partir da fotografia publicada pelo Sr Puidgemont, aqui o imaginava aos empurrões a disputar o lugar para o seu rabo com o da Dª Soraya de Santamaria. Era o mínimo que se poderia esperar... Afinal o mínimo é de mais para esse senhor. Não está sequer ao nível dos mínimos e isso era exigir-lhe de mais!
Afinal o Sr Carles Puidgemont tinha apenas aproveitado para publicar uma fotografia que tinha lá no arquivo, e àquela hora já estava a caminho do exílio. Afinal, logo que o governo espanhol bateu o pé, Puidgemont meteu o rabinho entre as pernas e fugiu...
Nunca ninguém terá esperado muito deste fulano, mas também ninguém terá esperado tão pouco. A independência nunca é oferecida em bandeja. Como para participar nos Jogos Olímpicos, há uns mínimos para a independência... O primeiro é desde logo determinação de lutar por ela. Lutar nem sempre é vencer, mas é sempre digno. Perder sem lutar é cobardia.
Portugal foi sempre capaz de afirmar a sua independência porque sempre ousou lutar por ela. Provavelmente é por ter tantos Puidgemonts na sua História que os catalães estimam e admiram os portugueses...
PS: Para evitar conclusões mais apressadas, tão comuns nestas coisas, devo esclarecer que não quero dizer que a Catalunha deva ou não deva ser independente, acho que isso só aos catalães, e a mais ninguém, diz respeito. E muito menos que desejaria que estivessem de armas na mão a lutar por ela. Não é de nada disso que estou a falar. É de estatura, de dimensão humana, de causas, de elites, de liderança...
Aí está a Catalunha no ponto. Provavelmente a esta hora o Sr Carles Puigdemont e a Dª Soraya de Santamaria disputam a mesma cadeira, dentro do mesmo gabinete. Empurrão daqui, empurrão dali, algum dos rabos acabará encaixado na cadeira. Sabe-se lá se não mesmo os dois...
Até pode acontecer que isto se repita todos os dias até 21 de Dezembro.
A imagem é caricata, mas se calhar nem está muito longe do que seja a actual estratégia do governo de Madrid, acreditando que, nas condições actuais, as eleições marcadas para a data do solestício de inverno sejam um plebiscito à integridade do estado espanhol.
Bem vistas as coisas, até se poderia dizer que seria a mais sensata das atitudes de Rajoy em todo este processo...
Depois de ter contribuído decisivamente para empurrar a questão catalã para um beco sem saída, Mariano Rajoy decidiu lançar a bomba atómica sobre uma Catalunha encurralada. Já não tinha por onde fugir mas... da bomba atómica não há como fugir, mesmo que que haja por onde.
Optando sempre por respostas desproporcionadas, Mariano Rajoy incendiou a Catalunha. Convencido que quanto mais endurecesse a sua posição, quanto mais aproximasse a independência e os independentistas da humilhação, mais dividendos políticos retiraria, cego de oportunismo, Rajoy acabou por prestar um péssimo serviço à integridade da Espanha.
É indiscutível que alcançou uma grande vitória política. Mas é uma vitória de Pirro... Capturou o PSOE, com Pedro Sanchez completamente encostado à parede, e sem estatura nem coragem para de lá sair. Tudo correu mal para a Catalunha, sem que nada corresse bem para a Espanha... Agora sem alternativas, e mesmo com muito poucas escapatórias!
Sem que demos muita conta disso, aqui ao lado, a Espanha está a arder. Não no sentido literal, como tem acontecido em Portugal, mas num fogo ainda mais destrutivo.
Quando em Portugal estivermos a caminho das urnas para eleger os nossos representantes autárquicos, na Catalunha, 8 milhões de catalães estarão a fazer o mesmo caminho, mas para dizerem que não querem ser espanhóis. Ninguém tem dúvidas que não querem, e que o resultado do referendo será, três ou quatro dias depois, a declaração da independência daquela que é a mais rica região da Península Ibérica.
Conhece-se a História. Sabemos o que a Catalunha sempre fez pela independência, sabemos até que muito da nossa própria independência se deve a isso. Sabemos que têm uma língua própria, de que nunca abdicaram, e que reservam ao castelhano o mesmo papel que ao francês e ao inglês. E sabemos, por muito que possamos estranhar, que são os jovens que estão na primeira linha pela independência.
E talvez seja isso que traduza o mais profundo sentimento de independência dos catalães. Que explique que as aspirações independentistas de séculos se mantenham vivas, mesmo numa União Europeia naturalmente vocacionada para esbater nacionalismos, e numa Espanha moderna, bem sucedida e europeia.
Mas, neste referendo, e no terramoto político que se seguirá, há muito da incapcidade política de Mariano Rajoy. Porque nunca na História houve tantas condições politicas para tratar dessa velha aspiração catalã, ou do velho problema da Catalunha, como se preferir.
Na impossibilidade de, como no passado, responder com bombardeamentos (houve até um general - Espartero - que dizia que a forma de resolver o problema era bombardear a Catalunha de 50 em 50 anos) e execuções em massa, Rajoy recorre aos mecanismos jurídicos. Pretender que o problema não existe porque a Constituição não o permite, é o limite da cegueira política. Um erro que vai sair muito caro!
É curioso que esteja a escrever estas linhas quando, em Estrasburgo, Juncker fala do estado da União...
Já aqui tínhamos dado conta da indepedência do funcionamento do Estado. Não é só com este governo, mas em moldes especialmente grosseiros com este governo. Da forma como, contra os cidadãos, inverte o ónus da prova. Ou como é o pessoal da administração interna que comanda os inquéritos às polícias. Ou como é o das finanças a inquirir os actos do pessoal das finanças, e de como "no fim bate tudo certo".
Nada de novo. Tudo como dantes: quartel general em Abrantes... A Inspecção Geral de Finanças, inspecciona .... as Finanças. E, claro... no pasa nada!
A famosa lista VIP de Paulo Núncio não tem nada de mal e já está tudo arrumado. Porque afinal é como a pescada... Antes de o ser, já o era. Já existia, mesmo antes de ser criada... Não digam que não é notável.
É assim que, por cá e com esta gente, as coisas se passam. A ministra da Administração Interna também deu trinta dias para o inquérito da IGAI à actuação do polícia em Guimarães, e da polícia no Marquês de Pombal, nos festejos do Benfica...
É com esta independência, e com esta transparência toda, que as coisas se resolvem. A malta das Finanças investiga a malta das Finanças. A malta da Polícia investiga a malta Polícia... E por aí fora... No fim bate tudo certo!
Logo ao início do dia, aqui em baixo, convidava ao aproveitamento deste feriado. Porque iria acabar! Quando vemos as coisas a acabar é que lhe damos valor, é que entendemos que as devemos aproveitar…
Entretanto, ao longo do dia, multiplicaram-se os protestos pelo desaparecimento deste dia do calendário de feriados nacionais. Protestos atribuídos a nacionalistas, adjectivo há muito desvirtuado!
No entanto, muitos dos nacionalistas de outros dias e de outras circunstâncias, permitindo que a sua nobre motivação de seguir e defender tudo o que seja medida do actual governo suplante as suas mais profundas convicções nacionalistas, dizem que não há qualquer problema em acabar com este feriado. Tive oportunidade de ver justificações fantásticas. Dois exemplos: comemora-se o dia do pai e, no entanto, não é preciso que seja feriado; ou outro é o dia dos namorados!
Comemora-se hoje, pela última vez em feriado, o dia da restauração da independência. Depois de mais de quatro séculos de independência, uma independência reconfirmada mas não perdida entre 1383 e 1385, perdera-se na sequência de Alcácer Quibir e da crise dinástica, mas também da divisão e do desnorte das elites nacionais e da bancarrota (mais uma) que se lhe seguiram. Foram sessenta anos de domínio filipino e de opressão castelhana a que, graças à coragem e patriotismo dos conjurados, mas também à atenção que os castelhanos estavam obrigados a dedicar à Catalunha, o povo português pôs termo a 1 de Dezembro de 1640.
Na opinião daqueles nacionalistas agora mais dados ao seguidismo governamental, a data pode muito bem continuar a ser assinalada mesmo sem feriado. Sabemos que não é assim. Se, mesmo sendo feriado, uma grande maioria da juventude actual não faz a mínima ideia do que se comemora, daqui a poucos anos não restará memória desta data fundamental da História de Portugal. Claro que a culpa não será apenas deste governo que mata o feriado. Será de todos nós que permitimos que se apaguem todas as memórias…
Não permitimos apenas que se perdessem as memórias. Permitimos que se perdesse a própria independência nacional. Portugal, que deixamos enxamear de Miguéis Vasconcelos, está hoje muito longe de ser um país independente, como bem sabemos.
Daí que me permita a dar uma ajuda aos que procuram argumentos para justificar o desaparecimento deste feriado. É bem simples: não se comemora o que não existe! Se o objecto da comemoração desapareceu, desaparecem, naturalmente, os motivos para comemorar. Ninguém festeja o aniversário depois de morrer!
E assim vai morrendo o país. E assim vamos todos morrendo!
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