"São assim as primeiras páginas dos principais jornais desportivos espanhóis, hoje. Fosse em Portugal e a A Bola e o Record tinham o Amorim na primeira página, e o O Jogo o Samu ou uma treta qualquer do Pinto da Costa. É a diferença entre futebol e futebolite, entre uma das melhores e mais competitivas ligas do mundo e uma liga insignificante, uma liguilla".
"Primeiro levaram os negros Mas não me importei com isso Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários Mas não me importei com isso Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis Mas não me importei com isso Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados Mas como tenho meu emprego Também não me importei
Agora estão me levando Mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém Ninguém se importa comigo."
Bertolt Brecht (1898-1956)
Tudo o que está a acontecer na Global Notícias - ou lá como lhe chamam agora -, nos centenários Diário de Notícias e Jornal de Notícias, no mais novo e "arregimentado" O Jogo, e na TSF, que há perto de 40 anos revolucionou a rádio para dela se tornar referência, cabe, inteirinho, neste poema de Brecht.
Às manchetes dos jornais requer-se imaginação. Em nome da criatividade e da imaginação pode perdoar-se algum deslise na sua construção, de léxico ou até de gramática.
Não é o caso desta do DN de hoje: "Mais médicos do SNS pediram, até Setembro, a reforma que em 2021".
Sem nada a dever à imaginação, nem à criatividade, não há perdão para coisa tão mal parida.
Mas é disto que se fazem os jornais que vamos tendo. Sem respeito pelo leitor. Nem pela sua própria História!
Parece que vai para aí uma onda de roubos de produtos alimentares nos supermercados, a crer na primeira página de hoje no jornal de referência da nossa tão pobre praça jornalística.
A notícia que faz primeira página é depois desenvolvida na secção "Sociedade". E aí começamos por ver que, da participação deste roubos à PSP, "só há dados até Junho", mas que " o crescimento de casos acelerou neste segundo semestre". Sem dados, e que ainda vai a meio...
Sem dados mas com um - um, repito - testemunho de um segurança de um supermercado. Pungente. Relata que "tem apanhado muitos idosos a tentar levar pão, salsichas ou atum". Que "há mulheres com filhos que dizem que já não têm como lhes dar de comer. E conta: "Prefiro que me peçam. Não sou rico, mas posso oferecer alguma coisa. E eu próprio vou à caixa pagar”.
No entanto, quando passa à informação que os supermercados estão a instalar alarmes em alimentos, a peça recorre ao testemunho de dois funcionários de uma cadeia onde isso está a acontecer, que o justificam por haver "quem os leve em mochilas para depois os vender a preço mais baixo no mercado negro.”
Escrevendo em manchete que a "crise faz disparar roubo de comida" este jornalismo de referência fala de roubo de comida para matar a fome para, depois, se formos ler, misturar com o roubo de comida para alimentar expedientes.
É tudo resultado da crise. Até da crise do jornalismo que por cá vai engordando!
Numa viagem pelos jornais do dia encontramos o Benfica e Luís Filipe Vieira em praticamente todas as primeiras páginas. Com duas únicas excepções: o Jornal de Negócios, e o jornal i, este particularmente interessado em continuar a bater no Costa e a promover o Ventura.
É impressionante. Sobre a inconsistência e a propaganda das declarações de Vieira, nada. Sobre a sessão de campanha eleitoral para as eleições que vai antecipar, para retirar tempo a quaisquer novas iniciativas, e fixar a concorrência na que já é conhecida, coisa nenhuma. Nem uma palavra.
E no entanto tudo está tão à vista... Tristes jornais, triste jornalismo!
Não é a primeira vez que aqui trago capas do i, que é, para mim, sem qualquer dúvida, o líder destacado do campeonato das primeiras páginas dos jornais portugueses. Hoje, esta das laranjas, mesmo com muitas muito azedas, é deliciosa!
Os valores recorde da produção de laranjas podem nem casar muito bem com a agitação laranja que por aí anda, e que, pelo menos até à próxima terça-feira, vai continuar a dar mais batatada que laranjada. Mas que é uma capa cheia de sumo, lá isso é!
Os jornais de hoje saíram para as bancas traídos pela realidade. Todos optaram por encher a primeira página - dividida com o grave acidente na Madeira - com a greve dos motoristas de transportes de matérias perigosas ... Que já acabou.
Olhar para as capas dos jornais com os piores cenários de qualquer coisa que já não existe soa a estranho. E não prestigia nada a imprensa, que deixa a ideia de dar tudo por uma má notícia. Por uma certa ânsia do quanto pior, melhor.
Não fosse isso e talvez tivessem levado em conta que quando o governo saca Pedro Nuno Santos da manga para negociar não há nada que não se resolva. E depressa!
A falta de vergonha dá nisto. Andaram meses a fio a publicar e a explorar dados e informação privados, que sabiam obtidos de forma não só ilegítima como criminosa. Durante todo esse tempo tudo ia bem, o que difundiam era insuspeito e a fonte era inatacável. Hoje, o que era informação insuspeita é um "assalto", e a fonte é o "pirata dos mails". Hoje, o que difundiram é um crime, e a fonte um criminoso. Como se nada se tivesse passado. Sem um acto de contrição. Sem uma desculpa. Sem vergonha!