A Polícia Judiciária (PJ) realizou ontem buscas na Federação Portuguesa de Futebol (FPF), no âmbito de um inquérito criminal que está aberto desde 2021, relacionado com a venda da antiga sede da FPF na avenida Alexandre Herculano (Lisboa), em 2018.
Em causa estão indícios de crimes de corrupção, recebimento indevido de vantagem, participação económica em negócio e fraude fiscal qualificada, ocorridos durante o penúltimo mandato de Fernando Gomes na FPF (2016 a 2020), entretanto acabado de substituir por Pedro Proença, e acabado de eleger para a Presidência do Comité Olímpico Português (COP), cuja posse tomou também ontem, enquanto prosseguiam as buscas.
O Centro Cultural de Belém, espaço da tomada de posse de Fernando Gomes, estava apinhado de jornalistas. Que naturalmente se preparavam para o confrontar com a matéria das buscas.
Até aqui tudo normal. A partir daqui, nada mais é normal.
Não é normal que Luís Neves, director nacional da Polícia Judiciária (PJ) tenha surgido na tomada de posse de Fernando Gomes. Por que razão o director nacional da PJ aparece na tomada de posse do presidente do COP?
Não só não é normal, como é verdadeiramente insólito, que o director da PJ se tenha entreposto entre Fernando Gomes e os jornalistas para ser ele, qual assessor de imprensa, a responder-lhes.
Não é normal, e é até o completo desrespeito pelas suas próprias funções que, enquanto decorriam buscas (se não estavam concluídas, era porque ainda havia recolha de prova em curso), o director da PJ avançasse com a conclusão que o "Dr Fernando Gomes não está envolvido". Mais: que aproveitasse a despropositada ocasião para enaltecer o seu trabalho na FPF, e expressar a convicção que repetiria o sucesso no COP.
Não é normal, e é a completa subversão da hierarquia da Justiça Penal, que o director da PJ tenha usurpado as funções do Procurador Geral da República (PGR) para assumir a liderança da acção penal.
Não é normal que o PGR, Amadeu Guerra, um dia depois de tudo o que de extraordinário ontem aconteceu, permaneça em silêncio.
Não é normal que nada disto tenha merecido uma linha, sequer, nas primeiras páginas dos três diários desportivos.
Infelizmente começa a ser normal que as Instituições impludam, umas atrás das outras. Começa a ser normal que pessoas que tínhamos como referência institucional, e acima de qualquer suspeita, como era o caso de Luís Neves, não resistam a mostrar os pés de barro. Começa a ser normal vermos esfumear os últimos resquícios de decência na nossa forma de vida ...
Teve hoje início no Campus da Justiça, em Lisboa, o julgamento do caso BES. Dez anos depois!
Conta com 18 arguidos: três deles pessoas colectivas - Rio Forte Investments, Espírito Santo Irmãos, SGPS e Eurofin -, catorze pessoas mais ou menos conhecidas, entre elas Amílcar Morais Pires, o número dois, e Francisco Machado da Cruz, o contabilista, e Ricardo Salgado, a figura central, cuja presença o Tribunal recusara dispensar.
O seu advogado tinha requerido a sua dispensa, invocando a doença de Alzheimer de que é portador, mas o requerimento foi rejeitado pelo Tribunal Criminal de Lisboa. A juíza-presidente do colectivo, Helena Susano - que admitira justificar-lhe as faltas mediante atestado médico, que não foi apresentado -, depois de o ter chamado a identificar-se, o que fez, e de o ter questionado se queria que o julgamento decorresse na sua ausência, a que respondeu que sim, seguindo a indicação de um dos seus advogados, dispensou-o.
Ricardo Salgado abandonaria o Campus da Justiça a meio a manhã.
Não é por aqui que a Justiça não funciona: sendo a realidade o que é, não ficaria bem dispensar a sua comparência; mas também não seria dignificante obrigá-lo a permanecer em audiência. Onde não funciona é quando, para além das prescrições, os responsáveis pelos crimes praticados se tornaram inimputáveis!
- 671 crimes praticados, dos quais 119 imputados a Ricardo Salgado;
- 2 condenações;
- 18 mil milhões de euros de vantagens obtidas na prática dos crimes.
Os prejuízos para a economia nacional não estão apurados, nem poderiam naturalmente ser apurados pelo DCIAP. Tal como os dos "lesados directos", os chamados lesados do BES.
Das duas condenações, uma refere-se a Ricardo Salgado, mas retirada da Operação Marquês, que determinou, em primeira instância, uma pena de prisão de seis anos, agravada para oito depois do recurso para a Relação de Lisboa, e já confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça mas, como se sabe, pendente de execução (pela alegada doença de Alzheimer). A outra a Manuel Pinho, condenado a 6 anos e 3 meses de prisão em primeira instância, mas em fase de recurso.
Fora deste processo judicial, Ricardo Salgado foi condenado pelo Banco de Portugal e pela CMVM em coimas de cerca de 11 milhões de euros, que continuam por pagar.
Dez anos depois, é isto que há para contar. Tanto tempo com tão pouco!
Daqui a pouco mais tempo haverá mais para contar. Mas pouco mais que prescrições!
Na Madeira vamos tendo um governo sem programa, sem orçamento, mas com um chefe inamovível. Por cá, pelo continente, André Ventura não tem vergonha nenhuma da forma como "inquiriu" (na Comissão Parlamentar de Inquérito) a mãe das gémeas brasileiras. Marques Mendes diz que o "Dr Nuno", ao não dizer nada, continua a criar problemas ao pai, Marcelo. Que, nada mais dizendo disso, diz que as "poucas vergonhas" das escutas, e das violações do segredo de justiça, serão resolvidas com a reforma da Justiça, remetendo uma questão de "simples vergonha" para as calendas das reformas. Já não se adiam reformas, adiam-se os problemas de simples aplicação da lei para as sempre inexecuíveis reformas.
E Cristiano Ronaldo continua a dividir. E a extremar, com "haters" de um lado e, do outro, os "haters dos "haters".
Nem sei quem é mais extremista. Para os "haters dos haters" já vale tudo: um passe - uma assistência, a quinta em seis participações, que iguala o record de Poborsky, numa única - uma carícia numa criança, ou a recepção a invasões de campo para a selfie a preceito. Para os "haters" o passe só aconteceu por ter pensado que estava fora de jogo, e tanta invasão de campo, num território de competência como o alemão, só pode ser manobra da toda poderosa "Nike", o patrocinador da selecção alemã, da portuguesa ... e de Cristiano Ronaldo.
Poderemos até conceder que, sem meios - entre eles competência nos seus recursos humanos -, o Ministério Público reduza os seus processos de investigação a escutas telefónicas. Quem não consegue investigar segue pelo caminho da bisbilhotice. Não é assim que se faz Justiça, mas é assim que por cá se faz tudo.
Não dá é para conceder que essas escutas surjam a público nas televisões e nos jornais. Se as escutas divulgadas tiverem conteúdo probatório relevante, é um problema de funcionamento da Justiça. Porque não é à opinião pública que cabe fazer o julgamento judicial. Quando são divulgadas publicamente conversas absolutamente marginais ao que está em "investigação" temos um problema grave no regime. São as instituições a alimentar a velha prática bisbilhoteira que faz de Portugal um país eternamente atrasado.
Claro que vai haver recurso para a Relação. Que, se as penas aí forem confirmadas haverá, depois, novo recuros para o Supremo, e por aí adiante. O mais provável é que, quando transitar em julgado, já ninguém cá esteja para cumprir pena que eventualmente venha a subsistir.
Até aqui nada a que não estejamos habituados. É a Justiça a funcionar, dizem... Que seja!
Também não poderemos dizer que não estejamos habituados a que advogados de defesa nestes processos venham ao espaço público fazer aquilo que apenas lhes compete fazer na barra do Tribunal. De uma maneira ou de outra, todos eles - famosos, mediáticos e por isso altamente bem pagos - tratam de não deixar os seus créditos de notoriedade pública por mãos alheias. Mas aquilo a que pudemos assistir ontem à noite, na CNN Portugal, nunca tinha sido visto.
Num dos seus sucessivos espaços noticiosos, em "braking news", ou seja lá o que lhe chamem, depois de dar a notícia da sentença do Tribunal, a CNN Portugal convidou para entrevista em estúdio precisamente o advogado de defesa de Manuel Pinho, Ricardo Sá Fernandes. Precisamente o mais useiro e vezeiro em utilizar as televisões para vender "o seu produto".
Sem contraditório, dispôs de cerca de 10 minutos a seu bel-prazer para convencer a opinião pública do que não tinha conseguido convencer o Tribunal. Não tenho conhecimento de qualquer indignação. Fica aqui a minha!
Indignado me confesso com tamanho despudor. Da estação, da direcção aos jornalistas, e do próprio Ricardo Sá Fernandes, advogado, político e suposto activista. Que tem bem a noção do seu inaceitável comportamento. E da sua impunidade!
O Dr Nuno meteu uma cunha ao pai para que as duas gémeas brasileiras fossem tratadas em Portugal com o tal tratamento de milhões. O pai do Dr Nuno, presidente da República Portuguesa, despachou o assunto para a Casa Civil da Presidência. Que encaminhou o assunto para onde bem entendeu, "a bem da Nação".
Isto aconteceu há cinco anos. E veio a público há mais de seis meses.
Do Dr Nuno, não se soube mais nada. Do pai do Dr Nuno, soube-se que foi "metendo os pés pelas mãos", dizendo e desdizendo. Entre o que disse e desdisse, acabou, há apenas umas semanas, a dizer que cortou relações com o filho, com quem nada quer ter a ver.
Da Casa Civil da Presidência nunca mais se ouviu falar. Nem de "quem é quem".
Foi hoje divulgado um manifesto que, nas palavras de Rui Rio, um dos signatários e uma dos agentes políticos que há mais tempo, e com maior insistência vem metendo o dedo na ferida, pretende provocar um sobressalto cívico.
O título dado ao manifesto - subscrito por personalidades dos diversos quadrantes políticos, e outras ligadas à Justiça, como como João Caupers (antigo presidente do Tribunal Constitucional), Germano Marques da Silva (penalista e professor catedrático) ou Fernando Negrão (juiz) - “Por uma Reforma da Justiça em Defesa do Estado de Direito Democrático”, tem tanto de comprido como de claro.
Um título longo poderá não ser o mais indicado para fazer passar a mensagem, mas ela está logo lá dentro. E bem expressa: o estado da Justiça está a fazer mal à democracia. E isso justifica um "sobressalto cívico"!
Tenho a ideia - poderá estar errada, mas a é minha convicção - que a maioria dos portugueses se sobressalta com o estado da Justiça em Portugal. Por isso percebo mal que o governo, sem ignorar o manifesto, se tenha limitado a chutar para fora, mandando a bola bem lá para o fundo do pinhal. Mais valia que o tivesse ignorado...
João Galamba demitiu-se, finalmente: "...para assegurar à minha família a tranquilidade e discrição a que inequivocamente têm direito”, justificou. Ou para não ser demitido amanhã, como estava mais que anunciado?
Parece-me mais isso. Mas isso é defeito meu, que por feitio nunca acredito em nada do que Galamba diga. O que não quer dizer que não me incomode a perseguição e as esperas que lhe têm feito à porta de casa.
Incomoda-me. Como me incomoda tanta coisa que está a acontecer por aí. Como me incomoda que se prendam pessoas para serem interrogadas. E que sejam libertadas depois. É tudo ao contrário. Normal seria, se fosse caso disso, que as pessoas fossem presas depois de interrogadas. Como me incomoda que, uma semana depois, se continue sem saber o que é que a Procuradora Geral da República foi fazer a Belém. Como me incomoda que um primeiro-ministro "fale ao país" para falar à Justiça. Que o Ministério Público troque nomes na transcrição de escutas. Ou que invoque portarias que nada têm a ver com o que evoca.
José Sócrates já está no Brasil, para a tomada de posse do Presidente Lula. Para o mesmo efeito, o Presidente Marcelo parte hoje, pelo que lá se encontrarão.
Marcelo - que em Julho, quando lá esteve a fazer umas tristes figuras, já tinha avisado que lá estaria, na posse de quem quer que fosse - faz parte de uma lista de chefes de Estado que confirmou a presença na cerimónia; Sócrates, como se sabe, faz parte dos amigos pessoais de Lula. Que faz parte da lista de cumplicidades de Sócrates...
Chocando mais, menos, ou nada, não é a presença de Sócrates no Palácio do Planalto, em Brasília, para a tomada de posse de Lula que é notícia. Nem que, tendo, quer o Ministério Público quer a juíza Margarida Alves, do Tribunal Criminal de Lisboa, entendido haver perigo de fuga - entendimento reforçado durante as diversas viagens de Sócrates ao Brasil, sem delas ter informado as autoridades judiciais portuguesas - a única medida de prevenir esse risco tenha sido obrigá-lo a apresentações quinzenais num quartel da GNR. Notícia mesmo é que, para esta Justiça, quinze dias não é tempo suficiente para quem quer que seja desaparecer do seu radar.
Não faço ideia se Sócrates comunicou, ou não, à Justiça que ia sair do país. Creio até que, não ultrapassando os cinco dias de ausência do país, nem a isso estava obrigado. E como, se tudo correr bem, Sócrates estará de volta para se apresentar na GNR no próximo décimo quinto dia - a 8 de Janeiro -, fica demonstrado que, em 15 dias, ninguém foge à Justiça portuguesa!
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