De novo na Luz, de novo cheia que nem um ovo, de novo o "novo" Benfica de Bruno Lage entrou a perder. Ainda se não tinha percebido - nem nada perto disso - o que o jogo tinha para dar e já Gil Vicente marcava, logo na primeira vez que chegava à baliza de Trubin. Ia o jogo com 8 minutos!
Nada de novo. Já assim tinha acontecido no último jogo na Catedral, o primeiro de Lage. Como já tanta vez tem acontecido. O Benfica - a equipa e os quase 60 mil nas bancadas - não se deixou abater, e partiu à procura da reviravolta. O que foi novidade foi, à medida que o jogo ia prosseguindo, perceber que nada disso - o golo prematuro do Gil e a reacção pronta do Benfica - dava ao jogo um sentido único.
Surpreendentemente a equipa de Barcelos dividia o jogo com o Benfica. Que, surpresa ou não, pagou com a mesma moeda: não foi à primeira vez que chegou à baliza adversária - pelo contrário, foi até no quarto canto conquistado - mas marcou na primeira oportunidade, menos de 10 minutos depois. Foi de novo um golo de canto, a novidade da era Lage. E foi o primeiro de Otamendi nesta época. Mais importante foi ter sido a resposta do capitão à sua própria responsabilidade no golo sofrido, nove minutos antes.
Com o Gil a continuar a dividir o jogo e a praticar futebol de qualidade, melhor mesmo só consumar a reviravolta à segunda oportunidade. Foi o que aconteceu apenas oito minutos depois e a meio da primeira parte, quando Kerem Aktürkoglu respondeu de cabeça a um grande cruzamento de Aursenes. A meio da primeira parte três golos, em três oportunidades. Só depois houve tempo para desperdícios, ainda assim poucos: dois para o Benfica; um para o Gil.
O Benfica veio para a segunda parte decidido a acabar com o atrevimento do adversário. No primeira metade demonstrou-o claramente, assumindo o domínio do jogo, sufocando mesmo, e criando sucessivas oportunidades de golo. Pouco antes do meio da segunda parte Andrew, o guarda-redes do Gil, provocou uma paragem no jogo para ganhar ar e quebrar o sufoco. E resultou!
O Gil voltou a ter bola, e a jogá-la bem. À entrada do último quarto de hora sentia-se que as bancadas tinham sido invadidas pelo receio. O Benfica não aproveitara aqueles 20 minutos de absoluta superioridade, o resultado estava em aberto, e o Gil já voltara ao registo da primeira parte. Bruno Lage já tinha mexido na equipa - fora mesmo o primeiro a fazê-lo - com a entrada de uma assentada de Cabral, Rollheiser e Amdouni (saídas de Pavlidis, Koçu e Aktürkoglu), mas nem isso tranquilizava as bancadas da Luz.
A equipa consegue dominar os jogos. Mas quando não tira proveito disso, e o resultado continua em aberto, tem evidentes dificuldades na altura de o controlar. Já se tinha percebido, e aqueles minutos confirmavam que esse é, para já, um problema que Bruno Lage tem para resolver.
Desta vez tudo acabou em bem - e até na maior goleada da época - porque Amdouni acabou com "o galo" dos ferros, e arrancou um grande golo, no momento certo. Foi como o ketchup, e os golos soltaram-se a partir daí. Florentino marcou o quarto, decalcado do que fizera da última vez na Luz - canto ao primeiro poste, desvio de Otamendi e finalização do médio, quase a meias com Cabral.
Antes, naquela dúzia de minutos que mediou entre o terceiro e o quarto golo, já mais umas tantas oportunidades de voltar a marcar tinham ficado para trás. Ao todo foram onze!
Depois, já na compensação, acabado de entrar, Prestiani (parece a perder espaço nesta configuração de Bruno Lage) assistiu o compatriota Rollheiser para o quinto da noite. Acabando em festa um jogo que foi isso mesmo - uma festa.
De que o Gil fez parte. E não foi por ser o bombo!
Ao terceiro jogo fora, a primeira vitória nessa condição. Ao quarto de Bruno Lage, a quarta vitória. Aconteceu no Bessa, onde os adeptos benfiquistas voltaram a não faltar. Foi como jogar em casa.
O futebol do Benfica já não tem nada - mesmo nada - a ver com o do tempo de Roger Schmidt. É certo que não tem havido tempo para treinar, e é claro que, com dois jogos por semana - pelo menos, e para já, até lá para o fim do ano - não vai haver. No entanto, sem tempo para treinar, a equipa joga de forma completamente diferente, e deixa-nos a sensação que irá evoluindo em competição, que o seu futebol vai sendo aprimorado com os jogos.
Hoje o Benfica tem profundidade e largura no seu futebol. Tem linha de fundo, e variações rápidas de flanco. E isso faz toda a diferença. Os adversários já não defendem comodamente, de cadeirinha, como faziam com o Benfica de Schmidt. E não faziam com os outros adversários.
Os jogadores parecem felizes, livres de constrangimentos, com fome de bola e olhos na baliza. Entram em campo para resolver os jogos, e resolvem.
Hoje, contra um Boavista dado por frágil - é curioso como foi preciso jogar com o Benfica para que fosse dada ênfase ao impedimento de contratar jogadores, como se esta não fosse uma situação que os axadrezados atravessam há já dois anos -, mas muito competitivo e pressionante em todo o campo (Cristiano Bacci, o treinador italiano a quem temos de tirar o chapéu, explicou que, sem jogadores experientes, não dá para especular com o jogo, e defender em cima da grande área à espera de uma oportunidade de contra-ataque que possa resultar), o Benfica foi avassalador.
Sob o comando de Kokçu (não importa se é 8 ou 10, joga no seu lugar e joga como nunca tinha jogado) e Aursnes (que já não "é pau para toda a obra", e joga no sítio onde o faz melhor), o 4x3x3 assume uma nova dinâmica. Os laterais fazem as alas (Carreras, cresce a olhos vistos e, com Bah lesionado, foi utilizado Tomás Araújo na direita), Di Maria abre as defesas, Akturkoglu fura-as e Pavlidis martela-as. Pelo meio marcam golos.
Poucos para as oportunidades criadas. Dois na primeira parte: o primeiro logo aos 11 minutos, à ponta de lança, depois de Carreras desmarcar Akturkoglu, que furou por ali fora até deixar Pavlidis ser ponta de lança, e marcar); o segundo às portas da meia hora, num grande remate de Kokçu. O último já nos último minutos, por Cabral, acabado de entrar.
Poucos, também, por falta de decência das arbitragens. Penáltis só para os rivais, já ambos bem aconchegados com uma média próxima de um por jogo. No Bessa voltaram a ficar mais dois por marcar. Se no primeiro, na primeira parte, sobre Pavlidis, o árbitro João Pinheiro ainda se deu ao trabalho de se desculpar com uma inventada falta de Tomás Araújo, já no último, aos 73 minutos, sobre Di Maria, ele e o VAR (Tiago Martins) quiseram apenas ser o que são.
Era importante que alguém da estrutura falasse nisto. Que não continuasse a passar ao lado do que as arbitragens repetem todas as jornadas. E não é só nos penáltis que marcam para uns, e não marcam para outros. É também nos cartões, tantas vezes mais importantes ainda.
É que Lage e os jogadores podem fazer muito. Mas não conseguem fazer tudo!
Depois da mudança de treinador, do fecho do mercado (as entradas de Akturkoglu e Amdouni, e a saída de Marcos Leonardo foram mesmo o último suspiro à janela), do regresso dos jogadores das selecções - esta paragem, com outra já dentro de um mês, é um absurdo -, e daquele episódio deprimente com que alguém que não tem noção (quem não tem a noção do tempo, não consegue ter a noção de nada) quis fazer prova de vida, o Benfica regressou à Luz. Que voltou a encher-se, como sempre, mas desta vez com a esperança renovada.
Com apenas dois dias para preparar o jogo, Bruno Lage manteve toda a linha defensiva. A partir daí apenas Florentino - a desempenhar sozinho a função de cobertura no meio campo -, Di Maria e Pavlidis se mantiveram na equipa. Kokçu e Rollheiser jogaram nas funções de construção, e Akturkoglu entrou directamente na equipa para completar, na esquerda, o trio de ataque.
O ambiente das bancadas era de entusiasmo, do maior que se viu nos últimos largos tempos. Foi sobre esse entusiasmo que, logo aos 20 segundos, o golo do Santa Clara caiu que nem um balde de gelo.
Não havia pior maneira de começar. A primeira vez que um jogador do Benfica tocou na bola foi para a tocar no círculo central, donde os jogadores da equipa açoriana tinham acabado de a tocar no pontapé de saída. Atrasaram-na para o guarda-redes, que a chutou para a frente. Otamendi, num movimento digno de um juvenil, falhou o corte e a bola ficou ali à frente do avançado do Santa Clara, bastando a Vinicius dar-lhe um toque para a fazer passar por cima de Trubin.
Se, por tudo o que acontecera nos últimos dias e semanas, a tarefa dos jogadores do Benfica já não era fácil, com este arranque de jogo - era o golo, mas era ainda consequência de um erro tremendo do capitão - ficava ainda mais complicada.
A equipa reagiu, mas as coisas não saíam bem. Via-se que a equipa procurava outra dinâmica - Bruno Lage tinha dito que mais importante que o sistema era a dinâmica - mas a ansiedade dos jogadores, e também naturalmente a falta de treino, levavam a uma sucessão de passes falhados, mesmo de baixo risco, que emperrava qualquer dinâmica. Há uma ou duas semanas, as bancadas reagiriam com assobios. Hoje estavam incondicionalmente com a equipa, e isso foi fundamental.
Se o colectivo não funcionava, se o jogo associativo se ia perdendo nos passes falhados e na oposição do adversário que, apanhando-se a ganhar, não saía lá de trás, tiveram que ser as individualidades a tentar resolver. Normalmente isso não funciona, mas hoje foi a forma da equipa se ir recompondo, passar a dominar o jogo, criar oportunidades para marcar. Ter marcado na primeira -antes Pavlidis vestiu-se de Gyokeres, mas não foi feliz no remate - também ajudou. Tranquilizou os jogadores e deu-lhes a confiança necessária para que as coisas passassem a correr melhor.
O primeiro golo, o do empate, resultou claramente da qualidade individual de Kokçu (passe picado para ultrapassar a densa linha defensiva contrária) e do estreante e seu compatriota Arkturkoglu, a desmarcar-se e marcar com um toque de classe. Seis minutos depois, aos 34, no primeiro canto do desafio, consumava-se a reviravolta.
Foi o primeiro golo de canto da equipa que mais cantos tem no campeonato. Percebeu-se o trabalho que antes se percebia não existir: canto curto, cruzamento rigoroso de Di Maria para o segundo poste, donde Otamendi assistiu, de cabeça para o golo de Florentino, de rompante no lado contrário.
Era o segundo golo, em duas oportunidades. Só a partir daí o Benfica passou a criar oportunidades sem concretizar em golo. Também o Santa Clara criou então a sua segunda oportunidade de golo, num remate ao poste direito da baliza de Trubin.
Ao terceiro canto, logo no arranque da segunda parte, num cabeceamento de António Silva, o Benfica fez o terceiro. Se já dominava completamente o jogo, com o terceiro golo, jogadores e adeptos sentiram que já nada impediria a vitória. O resultado acabou por se fechar com o espectacular golo de Di Maria, ainda antes de atingido o primeiro quarto de hora da segunda parte, num coeficiente de aproveitamento na ordem dos 40%.
Bruno Lage ainda chamou a jogo Amdouni (Rollheiser), Prestiani (Di Maria), Schjelderup (Arkturkoglu), e Cabral (Pavlidis). E bem. Sem ser no último minuto, e todos com tempo e oportunidade de mostrar que podem também ser titulares.
Bruno Lage tinha referido que a dinâmica importa mais que o sistema. Com dois dias de trabalho já foi possível ver que a equipa foi mais dinâmica. E - parece-me - é possível esperar que o treino trará as rotinas e dinâmicas de um futebol entusiasmante por que há muito aguardamos. E para a reviravolta!
O capitão do Moreirense escolheu o campo, neste Moreirense - Benfica, que inaugurou a quarta jornada deste campeonato. O Benfica ficou com a saída de bola, e não a largou durante três minutos, empurrando o adversário para junto da baliza. Quando a perdeu o Moreirense saiu de imediato para a frente, e criou a primeira ocasião para marcar. E só o não conseguiu porque o avançado deu um toque a mais na bola e adiantou-a a ponto de Trubin a poder recolher com alguma tranquilidade.
Estava dado o mote do jogo: o Benfica com bola, em cima da área adversária, e o Moreirense a contra-atacar a toda a velocidade logo que a recuperava. E não havia novidade. Tem sido assim!
Há muito tempo que é assim. Sem alas rápidos e desequilibradores (apenas Di Maria faz alguma coisa parecida), sem criatividade, sem ideias, sem rotinas e, agora, sem Rafa para as transições rápidas, que no ano passado resolviam a maior parte dos problemas, o Benfica não consegue outra coisa que não seja jogar para o lado e para trás.
Na primeira parte o Benfica teve a bola em quase 70% do tempo. E no entanto não criou uma única oportunidade de golo. Nem por uma única vez a bola chegou a Pavlidis em condições. Nesse entretanto o Moreirense teve esse primeiro lance, obrigou Trubin a uma boa defesa e marcou um golo, já em cima do intervalo, que viria - e bem - a ser anulado pelo VAR, por falta (pisadela no Barreiros) do marcador no início da jogada.
Ao intervalo Schmidt deixou Florentino (amarelado) no balneário - substituiu-o por Renato Sanches -, desfez a dupla de médios defensivos de que faz imagem de marca, e o Benfica conseguiu uns minutos de um mínimo de qualidade aceitável. Durou o primeiro quarto de hora, resultou em duas oportunidades de golo, ambas desperdiçadas, e acabou. A última meia hora foi tão má quanto toda a primeira parte. E no mesmo registo de uma equipa desmotivada, sem atitude, desorganizada e perdida em campo.
Ainda assim o Moreirense não conseguiu tantas saídas como na primeira parte. Assustou com um remate de cabeça de Maracás, na sequência de um livre lateral, logo que se fechou esse primeiro quarto de hora. E chegou ao golo mais de 20 minutos depois, e já perto dos 90, depois de um passe defeituoso de Carreras, em mais uma transição falhada, que acabou num remate que desviou na perna de António Silva, enganando Trubin.
As pernas dos adversários servem evitar que a bola entre na sua baliza. As dos jogadores do Benfica servem exactamente para o contrário - para a encaminhar para a própria baliza.
Pelo momento do jogo, e pelo que (não) havia jogado, a segunda derrota, ao segundo jogo fora de casa, era praticamente inevitável. Só não foi porque já a meio dos 6 minutos de compensação surgiu um penálti, que Marcos Leonardo (entrara para substituir Prestianni) converteu no golo do empate.
Na véspera do clássico de amanhã em Alvalade, o Benfica deita fora o quinto ponto, em quatro jogos. Se nada for feito, agora que o campeonato é interrompido pelo calendário das selecções, a distância para os dois rivais não vai parar de aumentar. E a participação na Champions será um suplício. É que continuar a fazer as mesmas coisas, e esperar resultados diferentes, é insanidade. Nem é preciso ser Einstein a dizê-lo!
À terceira jornada - e segunda consecutiva em casa - tudo continua na mesma no Benfica. A casa continua a encher - perto de 60 mil novamente na Luz -, os adeptos, já sem João Mário para assobiarem, continuam a assobiar o treinador, e a equipa, mais que continuar a não empolgar, continua longe do futebol que tem a obrigação de apresentar, e longe de exibições e resultados que lhe tragam, a ela própria, e às bancadas, a crença e a tranquilidade.
O Estrela da Amadora, que há cinco dias, no último jogo, levou um "banho de bola" do Famalicão, e perdeu em casa por 3-0, pareceu hoje, na Luz, uma equipa intransponível, de jogadores com três pernas e dois metros e meio de altura. Ora, teremos todos uma enorme dificuldade em achar que isto seja mérito próprio.
O Benfica não jogou mal. Já o disse noutras ocasiões que não é frequente jogar mesmo mal. Os jogadores correm, e não se negam a esforços. Nem são toscos, é evidente a sua qualidade individual. Só que isso não basta. Apenas com isso encontrarão sempre uma perna a mais à frente da bola na hora do remate, um pé a mais a interceptar o último passe ou o cruzamento decisivo. As cabeças dos adversários chegarão sempre mais alto e primeiro às bolas cruzadas. Sem dinâmicas instaladas, sem rotinas estabelecidas, sem estratégias acertadas, os adversários têm sempre jogadores com três pernas e dois metros e meio de altura. Os jogos nunca estão controlados, nem os adversários realmente dominados.
Não jogar mal não é jogar bem, como diz Roger Schmidt no final de cada jogo. Tal como o problema, como quis fazer crer no final deste, também não é apenas a finalização.
Hoje o golo (Kokçu - o melhor em campo -, assistido por Pavlidis) até surgiu relativamente cedo, ainda antes do meio da primeira parte. Mas nem isso mudou nada, e as bancadas permaneceram inquietadas até ao fim do jogo, até com a sensação que, se o Brígido não tivesse dado aquele meio frango, o Benfica não teria conseguido ganhar o jogo.
Uma nota para as lesões de Aursenes (uma lesão muscular, mais uma, agora num jogador que jogava sempre, e em todo o lado) e de Tiago Gouveia. Não são também boas notícias. E outra para a estreia de Renato Sanches, que também não é boa notícia. Poderá vir a ser o transportador de bola que a equipa precisa, mas hoje percebeu-se que isso está ainda muito longe. Em tempo e em peso.
Cheguei bem mais cedo ao Estádio que o habitual, faltava pouco menos de uma hora para o início do jogo. Estava pouca gente, visivelmente menos de 10% da capacidade, quando foi pela primeira vez anunciado o onze inicial. Ao nome de João Mário saíram das bancadas uns mal notados assobios, logo apagados quando o "speaker" prosseguiu. A ordem era a numérica, e o 20 era logo o quinto. No fim, ao rematar com "e o nosso treinador é ...", os assobios daqueles cinco ou seis mil pareceram de quase 60 mil, que menos de uma hora depois enchiam as bancadas da Luz. Sem grande diferença dos que se ouviram à saída para o intervalo. Ou nas substituições, aos 65 minutos, quando foi anunciada a saída de Prestiani, um dos poucos jogadores com prestação aceitável para aqueles 60 mil.
Se dúvidas existissem sobre o ambiente de hostilidade a Roger Schmidt ficaram logo esclarecidas. O "speaker" teve o bom senso de não voltar a referir o seu nome, e as bancadas - visivelmente com muitos emigrantes, alguns deles com a infelicidade de ter a claque por vizinhança, o que quer dizer petardos, bombas e desacatos - quiseram poupar os jogadores (à excepção, mais uma vez, de João Mário) ao seu desagrado com aquele futebol. Pobre, cristalizado no passe para o lado e para trás na zona central do terreno.
Sem largura, sem alas e sem profundidade. Com dois médios centro - Florentino e Barreiro - de tracção traseira, e mais dois a fazerem de alas, que não são. Quatro, portanto. Como Prestiani também anda por ali, atrás de Pavlidis, a fazer de 10, é meia equipa que fica ali emperrada.
São os laterais que dão abertura, pensará Schmidt. Mas não dão, como se viu. Nunca vão à linha de fundo, e não criam desequilíbrios. Bah nunca o fez durante toda a primeira parte. Beste ficou logo de início fora de combate, com uma lesão muscular, justamente quando corria para uma solicitação pelo corredor. Entrou Carreras, que acabou por mexer mais com o jogo.
A equipa não funciona, como toda a gente vê. O primeiro remate do Benfica surgiu apenas aos 26 minutos, obra de João Mário e objecto de uma boa defesa do guarda-redes Patrick Sequeira. Passou-se a primeira parte nisto, com o Casa Pia a ir assustando aqui e ali, como aos 37 minutos, com Obeng a ter a possibilidade de marcar, depois de um bom cruzamento de Larrazabal.
Ao intervalo a equipa partiu para o balneário sob gigantesca assobiadela. De lá regressou na mesma, sem uma alteração, apenas mais mexida, muito por obra de Carreras e Prestiani, o único a continuar a tentar agitar o futebol da equipa. O tempo passava, e percebia-se que não seria assim que o Benfica conseguiria ganhar o jogo a um adversário muito fraco, que defendia com nove jogadores, queimava tempo e enervava ainda mais as bancadas.
É então que Schmidt faz algo de realmente raro: três substituições de uma vez, a vinte e cinco minutos do fim!
Retirou os redundantes Barreiro e João Mário, e Prestiani, o jogador que mais queimado estará a ser por esta estranha obsessão de Schmidt por quatro médios-centro. Entraram Tiago Gouveia, para a ala esquerda, Kokçu para a construção, e Marcus Leonardo para se aproximar de Pavlidis, a permitir-lhe dedicar-se a procurar espaços e bola. E o jogo mudou finalmente!
Cinco minutos depois da substituição já Tiago Gouveia assistia para o golo de Pavlidis, na primeira explosão da Luz (as outras daquela rapaziada do topo que gosta mais de pirotecnia que de futebol não entram nestas contas). Dez minutos depois era o próprio Tiago - naturalmente o homem do jogo - a marcar, numa jogada onde fez tudo: recuperou a bola, atravessou com ela meio campo, tabelou com Aursenes e marcou. E mais dez minutos depois, já em cima dos 90, Aursenes, depois de um grande passe de Kokçu, fez o terceiro.
Schmidt salvou-se nas substituições. Falta saber se é uma verdadeira salvação, ou se apenas resistência fortuita a uma condenação inevitável. Falta saber se percebeu o que mudou aos 65 minutos.
Se calhar não percebeu. Como também não terá percebido que a última substituição, que reservou para os 87 minutos para fazer entrar Otamendi e sair Tomás Araújo, depois do Renato Sanches ter passado, por duas vezes, largos minutos em aquecimento, não cai bem. Se havia algum sentido em lançar alguém para jogar 3 minutos, naquelas circunstâncias, teria de ser Renato Sanches. Mas Schmidt preferiu aproveitar para mandar o Tomás Araújo para o banco, e prestar vassalagem ao capitão.
Foi mais do mesmo. A estreia do Benfica no campeonato, em Famalicão, foi mais do mesmíssimo Benfica do campeonato anterior.
Tendo por paralelo a última deslocação a Famalicão, naquele jogo em que o Benfica entregou o título ao Sporting, pode até dizer-se que foi pior. Quando os jogadores adversários têm sempre as melhores soluções para os problemas que o jogo levanta, há qualquer coisa de muito errado.
Os jogadores do Famalicão foram sempre melhores a tapar espaços, ou a abri-los. No passe longo, ou no curto. No drible. Na pressão, onde quer que fosse preciso. E quando os jogadores do Famalicão são melhores que os do Benfica o mundo gira ao contrário.
O Famalicão marcou logo aos 12 minutos, por Sorriso, quando já era visível que o Benfica nunca se entendia com aquela pressão, nem com aquela intensidade. Nunca se entendeu, de resto.
Com Roger Schmidt a lançar o onze afinado na pré-época - sem olhar a nomes, diríamos ao conhecê-lo - o primeiro remate (João Mário) do Benfica aconteceu aos 58 minutos, à beira da hora de jogo. Quando perdia desde o minuto 12!
Só isso diz tudo. Isso e que apenas num curto período da segunda parte, já depois das substituições, e depois da entrada de Di Maria, quando o Famalicão se deixou empurrar para dentro da sua área, conseguiu - mesmo sem largura no jogo, mesmo sem linha final, sem automatismos e mesmo sem nada que desse certo - duas ou três oportunidades para empatar o jogo. Mas antes de marcar o segundo golo, aos 90 minutos, de novo por um tal Zaydou, como no último jogo, já o Famalicão desperdiçara duas claras oportunidades para marcar, em lances em que fez gato sapato dos adversários.
Poderíamos queixar-nos que o guarda-redes adversário não nos ofereceu um golo. Que nem o árbitro nem o VAR - e bem podia - conseguiram arranjar-nos um penaltizinho. Bastava um, nem era preciso dois. Nem uma expulsão, sequer. O guarda-redes defendeu o pouco que teve para defender, e o Fábio Veríssimo só tinha amarelos para oferecer, a torto e a direito. Mas só temos de nos queixar de uma equipa que não teve nada a ver com o que mostrou nos jogos de pré-época. E de um treinador que dissera que a equipa estava pronta para arrancar o campeonato, e depois não teve explicação para o que aconteceu.
Esta entrada do Benfica não é só a Lei de Murphy. É uma tonelada de sal despejada sobre as feridas da época passada!
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