O Chefe de Estado Maior do Exército apresentou a demisão, pela tradição homofóbica das gentes das armas. A Joana Vasconcelos disse umas palermices, na tradição dos artistas do regime. João Soares ofereceu umas bofetadas a uns cronistas, no melhor da velha tradição republicana, agora que já não há duelos. Francisco Louçã fez sucesso no Conselho de Estado com a sua gravata azul. Ó pá... lá se foi a tradição...
Esse grande vulto da vida nacional, e escriba emérito que responde pelo nome de Duarte Marques, citou-o num dos seus escritos que o Expresso publica. Alguém capaz de merecer a admiração dessa eminência do PSD só podia ser gente de pensamento profundo, injustamente votada ao anonimato, donde teria de ser imediatamente resgatada. O país não podia continuar a desconhecer o pensamento produzido e armazenado em tão brilhante mente!
Foi provavelmente isso que terá animado Francisco Louçã a partir à pesquisa dos seus feitos e a trazer Pedro Cosme Vieira, professor na Faculdade de Economia do Porto – seu colega, portanto – para o grande público. Não foi em vão, o tempo perdido por Louçã.
O país descobriu alguém que tem uma solução para a SIDA: o abate sanitário de todos os infectados. Sem qualquer problema na demografia: em apenas 15 anos, já sem ninguém infectado, seriam recuperados os 35 milhões de pessoas abatidas. E também solução para o drama dos que atravessam o Mediterrâneo para fugir da morte que lá têm por certa: atropelá-los em alto mar e “meter um tiro em cada um “ que consiga sair a nadar. Nos primeiros dias morrerão uns milhares, mas em pouco tempo deixará de haver do lado de lá “pretalhada” a querer entrar naqueles barcos.
É isto um professor universitário. É isto um modelo de referência da entourage Passista, de que Duarte Mendes é apenas um specimen.
Ah… Parece que, captada a fama, pôs agora a correr que tudo isto não passa de uma estratégia de comunicação. De uma forma de fazer ouvir o seu blogue na selva da blogosfera. Imagino a decepção do Duarte Marques…
Em boa parte das vezes não concordo com as suas posições, mas não posso deixar de concordar que se trata de um dos mais brilhantes parlamentares da democracia portuguesa, e seguramente o mais brilhante de todos os que com ele partilharam o Parlamento nos últimos treze anos. Falo de Francisco Louçã, que anunciou hoje o abandono da actividade parlamentar!
Se na condução da sua actividade política nem sempre foi exemplar, se – e as últimas imagens são sempre as que perduram – não foi exactamente feliz no que dispôs para a sucessão da sua liderança no Bloco de Esquerda, a verdade é que deixa uma imagem de um tribuno parlamentar único. Pela cultura, geral e política, pela inteligência e pela sagacidade!
Com espectáculo – é verdade, mas um tribuno é também um actor, é representação – mas com substância. Com verdade. Com verticalidade, mesmo se pisando as marcas dos limites…
Faz parte da minha geração, somos da mesma idade e fomos colegas no velho ISE, no Quelhas. Não me parece que esteja velho… Não posso aceitar que esteja velho. São opções. É a política...
A sucessão da liderança do Bloco de Esquerda não só tem animado o debate político - também ele de férias – como tomou mesmo conta dele. Talvez por isso – porque não gosta de ficar para trás, apesar da tese, velha e esfarrapada mas sempre actual, de que a sua sobrevivência política depende sempre da criação de inimigos externos – o Alberto João tenha sentido a necessidade de se intrometer, com um referendo que não o é nem pode ser. Por sorte sua, digo eu!
Bem trabalhadinha a pergunta a referendar, e lançado um verdadeiro referendo nacional, provavelmente arranjaria lenha para se aquecer!
Deixo por isso de férias a fuga para a frente – que não o leva a lado nenhum - de Jardim e trago ao activo a sucessão no Bloco.
Goste-se ou não, é indiscutível que Louçã é dos políticos mais influentes da vida política nacional da última década, pelo menos. Que é dos mais bem preparados e dos melhores tribunos, também não oferece grandes dúvidas. Tem defeitos. Obviamente que sim. Quem os não tem? E quando se fala de políticos…
Resvala facilmente para algum populismo e, ironicamente, é na popularidade que encontra o seu maior handicap. Não chega facilmente ao povo, não se sente muito à vontade no contacto com as massas e não consegue transmitir aquela carga de afectividade indispensável a qualquer político que aspire ao poder.
Tão indiscutível quanto a sua influência, a sua preparação e a sua capacidade oratória, é a sua inteligência. Creio que todos o reconhecerão!
É precisamente em nome desse reconhecimento que mais terá custado a entender a sua exposição ao maior dos pecados de um líder, em democracia, bem entendido: intervir activamente e condicionar a sua própria sucessão. Que abriu o debate e a discussão pública, levando-os para fronteiras bem mais vastas que as da mera sucessão num pequeno partido.
Não creio, ao contrário do que muita gente diz, que Louçã esteja a revelar qualquer costela estalinista – que, de resto, sempre rejeitou – ou alguns genes mais avessos à democracia. Também não me parece que a sua indicação no sentido de uma liderança bicéfala – Catarina Mendes e João Semedo, ao que se diz – tenha alguma coisa a ver com uma estratégia de dividir para reinar, de disseminar o poder para o manter informalmente. Resta então uma terceira via – há sempre uma terceira via – que muitos defendem: com esta indicação pretende apenas proteger o partido. Evitar que se reacendam as lutas internas tendo como protagonistas as forças políticas que estão na génese da sua fundação, e em especial a UDP, de Luís Fazenda, actual líder parlamentar.
Tendo a validar esta tese. Mas, validar esta tese, significaria que Louçã tem consciência que nem tudo correu bem nesta história de sucesso. Significaria que, em quase vinte bem sucedidos anos, o Bloco foi capaz de se afirmar para o exterior mas incapaz de o fazer internamente. Que não foi capaz de conviver com as diferenças e de esbater os pontos de partida. E que os muitos quadros – e muitos de grande valia – que já nasceram no partido, ou que o partido entretanto angariou, são reféns da nomenclatura fundadora.
Não seria isto que estava na cabeça de Miguel Portas quando, logo em cima do desaire eleitoral do ano passado, propunha o abandono dos fundadores do partido. Estou certo que ele conhecia bem os novos valores do Bloco, e que acreditava que eles têm todas as condições para romper quer com a história quer com a estratégia do partido.
Rompimento que passa fundamentalmente pela radical alteração do posicionamento de poder: ser um partido de contrapoder ou um partido com vocação de poder. Ser um partido capaz de abrangências, consensos e de pontes, ou manter-se como partido de protesto!
É isto que está em causa nesta passagem de testemunho. É isto que terá de ser clarificado para garantir a sobrevivência do partido. E isto só poderá ser feito através de um grande debate interno mobilizado pelos candidatos à liderança. Nunca o será através de qualquer solução de mera continuidade, seja ela monocéfala, bicéfala, ou tricéfala!
Creio que Louçã teria cumprido o seu papel se, em vez de pretender tapar o sol com a peneira - com a tal solução do século XXI -, se retirasse deixando esse debate bem aberto.
Mais do que saber quem ganhou – e desde já adianto que, em minha opinião, Louçã ganhou o debate desta noite com Sócrates – parece-me importante fazer notar que foi um debate que teve como pano de fundo o combate com o PSD.
Sócrates tinha Louçã à sua frente – um já velho ódio de estimação e precisamente quem mais eleitorado lhe tem roubado – mas mostrou-se mais preocupado com o PSD. Poderá dizer-se que é normal, que é uma questão de focalização no adversário principal e de uma estratégia de marcação cerrada, directa e impiedosa. Que, de resto, já também havia sido seguida ontem por Pedro Passos Coelho no debate com Jerónimo de Sousa. Pois, mas pese o tom cordato, amigável e avesso ao confronto que o marcou, não foi bem assim!
Poderá também dizer-se que Sócrates sente que as sondagens estão a apontar para uma quebra significativa do Bloco de Esquerda, e que, de acordo com as teses maioritárias – que eu não subscrevo, como já aqui dei conta – tal quebra resulta de uma transferência de votos que o benificia directamente. Do regresso a casa de muitos dos votos que fugiram em 2009! E que este sentimento lhe terá reforçado a convicção de que seria mais rentável aproveitar o debate para atacar o ausente do que propriamente para se bater com o adversário que tinha ali à sua frente.
Mas não foi nada disso! Até porque Louçã não perdeu tempo a estudar o adversário: entrou ao ataque. Tão decididamente que me pareceu justificar a atribuição da sempre tão discutida vitória no debate!
Sócrates mandou-se ao PSD neste debate, como acontecerá nos outros e em todas as oportunidades, pela simples razão de que o que há para discutir são as propostas do PSD. Desde que no passado domingo o PSD apresentou o seu programa eleitoral, o PS – que, ao contrário que apregoa, não tem programa (não há uma medida objectiva, quantificada e calendarizada, portanto não se pode dizer que haja programa) – não faz outra coisa, porque não tem outra coisa para fazer, que dedicar-se às medidas desse programa. Combatendo-as e atacando-as mas sem apresentar as suas: não faz mais que isto!
Como se viu no debate de hoje, com a proposta de baixar a taxa social única. Mas como o debate mostrou – e tire-se o chapéu a Louçã – essa medida não é só uma imposição do programa da troika que os três partidos subscreveram: essa é uma medida com a qual Sócrates, por carta, se comprometeu perante as entidades externas!
Mais uma habilidade de Sócrates … Esta foi desmontada, espero que toda a gente o tenha percebido!
A propósito da moção de censura ontem anunciada pelo Bloco de Esquerda recomendo a leitura deste post do Rui Rocha no Delito de Opinião. A não perder… E que tem a ver com as ideias a seguir alinhavadas…
O Bloco de Esquerda surgiu com sucesso no panorama político nacional porque havia um espaço à esquerda propício ao seu aparecimento, um espaço que nem o PC, por todas as razões conhecidas e que agora não vêm ao caso, nem o PS, como partido de vocação de poder, conseguiriam ocupar. Resultando da federação de um conjunto de forças políticas, normalmente arrumadas na ponta mais extrema da esquerda do nosso xadrez político, conseguiria um conjunto de sinergias com potencial eleitoral: pela mera soma aritmética de votos até aí dispersos, pela congregação de um conjunto de líderes já com muitos anos de experiência política e pela própria embalagem que teria de se criar para poder arrumar lá dentro tanta coisa de difícil arrumação.
Depois, Louçã, com aquele seu jeito de seminarista (que me perdoem os seminaristas – consumados ou interrompidos, convictos ou arrependidos – mas é apenas uma figura de estilo) fez o resto. Louçã e o PS, em particular Sócrates, que criaram um alargado espaço de verdades que ficaram ali logo à mão de um Bloco cada vez mais estimulantemente moderno, prá-frentex ou fracturante. E cresceu … cresceu … até se tornar num quisto. Que, também ele, foi crescendo … crescendo … até dar nisto.
Com esta moção de censura o Bloco apenas quer evitar eleições e manter Sócrates ligado à máquina, como bem diz o Rui Rocha. Como o seu deputado José Manuel Beleza deixaria bem claro quando, já hoje, dizia que “se a direita aprovar a moção cairá no ridículo”.
O Bloco de Esquerda não se tornou apenas no maior aliado de Sócrates. Tornou-se no seu quisto gémeo!
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