A longa maratona de discussão e aprovação do Orçamento na Assembleia da República, que hoje chega ao fim, tem sido digna de uma longa metragem de forte carga dramática, com voltas e reviravoltas, emoção e suspense... As últimas cenas estão ainda a ser montadas pela realização e, embora saibamos que nada vai acontecer, estamos ainda na fase em que tudo pode acontecer.
Se isto é assim no primeiro orçamento da legislatura como será no próximo? E no seguinte, se lá chegar?
O PS apostou nesta fórmula. Sem maioria, mas com a arrogância dos vencedores - coisa que não acontecera na anterior legislatura - optou por não querer negociar nada com ninguém e seguir em frente, sozinho. Agora, sujeita-se...
Não tem por onde estranhar. Nem por onde reclamar contra coligações negativas. É simplesmente assim em todas as democracias parlamentares: quem não tem maioria não pode comportar-se como se a tivesse.
Claro que o PS não joga às escuras. Conhece profundamente o jogo, conhece todas as manhas e blufs que lhe pode aplicar. Primeiro, sabia que a alternativa de direita, dizimada nas eleições, iria entrar em convulsão interna. Agora, sabe que, com o Chega em crescimento acelerado, a última coisa que PSD e CDS quererão é uma crise política no país e eleições antecipadas. E acredita que, à esquerda, as memórias de 1987 e do suicídio do PRD impressionem ainda muita gente.
Por isso continuará a apostar nesta fórmula de fio da navalha, confiando que ninguém se distraia e cometa uma imprudência qualquer, garantindo ainda mais emoção e suspense para as sagas das próximas temporadas.
Cavaco - anuncia hoje o SOL - já não exige maioria para dar posse ao novo governo. Não sendo frequente que mude de opinião - há mesmo quem diga que é um incorrigível teimoso, que raramente tem dúvidas e que nunca se engana - o que é que o terá feito mudar de ideias?
O que é mudou?
Não estou bem a ver... Estão aqui a dizer-me que o que mudou foram as perspectivas eleitorais da coligação. Não. Não pode ser, não estou a ver que um presidente da República, possa ser tão parcial. Isso seria batota...
Mas já que estão a falar nisso... Então, quando toda a gente pensava que o PS ia ganhar as eleições, Cavaco avisava que só os deixaria governar se tivessem maioria. Porque o país precisa de estabilidade, o que a vitória sem maioria de António Costa não garantia, ainda que tivesse, á esquerda, todo um largo espectro de hipóteses de construir consenos, pontuais ou mais estruturais. Agora, que as sondagens apontam para a vitória da sua coligação, que sem maioria não tem por onde nunca lá chegar, Cavaco vem dizer que afinal pensou melhor, e que não é preciso maioria nenhuma. Nem estabilidade, o que é mesmo preciso é que esta sua gente continue a tomar conta disto tudo...
O que Cavaco ontem fez, sem disso porventura se dar conta e provavelmente contra a sua vontade, foi um forte apelo à vitória do PS no dia 4 de Outubro. Ao fazer o apelo da extremamente desejável solução de governo estável e maioritária, quando sabe que, por mais apelos que faça, ninguém chega á maioria, Cavaco está a dizer aos portugueses que devem dar a vitória a António Costa. Por muito que não queira, dê-se ou não conta disso, é justamente isso que Cavaco está a dizer.
Por uma razão muito simples: se Costa perder fica obviamente sem espaço na liderança do partido, nem vale a pena explicar por quê. Abandonaria no minuto seguinte, e os partidos da coligação de direita ficariam a falar sozinhos, sem interlocutor no PS. E, evidentemente, sem qualquer condição para chegar á solução de governo que Cavaco extremamente deseja.
Se, pelo contrário, for a coligação a perder, mesmo que o PSD não perdoe a Passos e o obriga a saltar fora, ainda sobra Portas, o sempre em pé.
E nem é preciso fazer contas à esquerda, águas que o PS evidentemente nunca navegará. Para tranquilidade de Cavaco!
Isolado, e barricado no fanatismo austeritário com que espera a salvação eleitoral, o governo de Passos e Portas vê-se obrigado a entregar a defesa do indefensável a gente menor, com isso menorizando ainda mais os portugueses. Já sem gente de dimensão á sua volta, o governo entrega a sua defesa a figuras menores, bem próximas da indigência. É também uma questão de dignidade…
Ontem, no Prós & Contras da RTP – o formato até poderá responder aos quesitos de um bom programa de informação/espectáculo, mas uma apresentadora/moderadora cada vez mais incapaz de tratar qualquer tema que vá um bocadinho para além do mais básico dos básicos, deixa-o ao nível do lixo televisivo – foi mais uma vez evidente o nível a que baixou a defesa das posições com que a maioria conta para a campanha eleitoral em que se encontra. Foi entregue a uma figura dada a conhecer por Pedro Sampaio Nunes, empresário e residente em Bruxelas – circunstância que não se cansou de repetidamente referir – que foi simplesmente deprimente. Lugares comuns, frases feitas, ausência de qualquer raciocínio estruturado, ignorância e muitos tesourinhos deprimentes. Um deles é que a electricidade não é um bem transaccionável, não se pode exportar… A ponto de José Manuel Fernandes, o seu colega de pró, que não é exactamente homem de grande vergonha (lembramo-nos, por exemplo, das escutas de Belém), ruborizar levemente ali por cima da barba.
Foi certamente por isso que a sua apresentação se ficou pelo empresário residente em Bruxelas, escondendo que, afinal, tem ocupado inúmeros cargos (alguns ligados á energia) na esfera do poder laranja, entre os quais o de Secretário de Estado da Ciência e Inovação do governo de Pedro Santana Lopes!
A presidente da Assembleia da República convidou os militares para a sessão comemorativa dos 40 anos do 25 de Abril, no Parlamento. Os militares de Abril aceitaram o convite na condição de não serem uma mera jarra decorativa, mesmo que cheia de cravos, para dar um ar pitoresco à festa. Sim, mas com direito à palavra… A intervir … A dizer das suas, sem mordaças… Porque dessas trataram eles há 40 anos atrás!
Mas democracia é democracia, mesmo com mordaça. E nesta democracia logo a maioria do PSD e do CDS tratou de explicar que… era só o que faltava. Então mas nós, democratas da mais alta estirpe, voz do povo porque o povo assim quis, somos lá gente para estar aqui a ouvir desaforo?
Não falam, e não se fala mais nisso… Se querem vir que venham, mas caladinhos. Se não, mandamos evacuar as galerias e vai tudo corrido a bastão e pontapé!
O Tesouro americano diz que é a Alemanha a culpada de tudo o que se está a passar no sul da Europa. Que, para acumular excedentes, não hesitou em impor as políticas austeritárias que destruíram as economias portuguesa, espanhola e italiana.
Álvaro Santos Pereira, recuperando o pio diz, agora já do lado de fora, que a austeridade pode levar ao surgimento de ditaduras na Europa e que a dívida portuguesa só poderá ser paga se renegociada para prazos de pagamento de 40 ou 50 anos.
Mas na Assembleia da República, no dia 1 da discussão do Orçamento, a ministra das finanças diz que está tudo bem. Que tudo estava certo, que tudo correu bem, e que só há que apertar mais um bocadinho. Que já só falta um último esforço, que estamos lá, na praia. Até já ela fala em baixar impostos, para não deixar Paulo Portas a falar sozinho… Porque 2015 está já aí!
Por isso aí está uma gigantesca onda de optimismo que sai da maioria e do governo como se fossem o canhão da Nazaré. Que estamos a sair da recessão e que o desemprego está baixar, dizem eles, sem cuidar de perceber que alguma vez a economia teria de parar de cair, que há sempre um fundo, por mais fundo que seja. E escondendo que o desemprego continua a subir e não a descer. Que descem apenas os números – e muito pouco - porque Portugal atingiu os mais altos níveis de emigração dos últimos 40 anos. Chamam-lhe até milagre, mas as pessoas não estão a sair do desemprego, estão a abandonar o país que as abandonou!
E esta não tem nada a ver com aquela emigração analfabeta e desqualificada das décadas de 60 e 70 do século passado, que não perdia os laços com o país, e de que a economia e as finanças do país tanto beneficiaram. Esta é uma emigração que deixa o país muito mais pobre e ineficiente. Agora sai gente em cuja educação o país investiu muito. Gente – e veja-se o absurdo – que o país impede de retribuir o que lhe deu, e que prefere entregar de bandeja aos outros.