Como não poderia deixar de ser, aí está a catástrofe!
Passos Coelho ainda há dois ou três dias dizia que “não existe necessidade de alterar a trajectória”. Ainda ontem dizia que estava tudo bem, que a sétima avaliação tinha corrido bem, como hoje confirmaria em detalhe o ministro das finanças. Mas afinal os detalhes de hoje de Vítor Gaspar não confirmam nada disso. Confirmam a catástrofe que já se sabia, mas que a sociedade Passos & Gaspar ia tentando manter debaixo do tapete!
Isso mesmo: o inimputável Gaspar deixou de o ser. A partir de hoje não é mais inimputável!
O ministro das finanças só não meteu dó porque quem faz o que ele tem feito não consegue sequer despertar esse sentimento. E porque uma legião de jornalistas domesticados (uma única excepção para o jornalista da SIC) – serão os jornalistas presentes nas conferências de imprensa do salão nobre do ministério das finanças escolhidos pelo ministro? – pactua com aquele discurso opaco e misterioso, abdicando de perguntas assertivas e resignando-se às respostas manhosas e às omissões do ministro.
O défice é de 6,6% e não os 4,9% com que ainda há semanas Passos se cobria de glória, garantindo o cumprimento da meta do défice. Nem outro qualquer do cardápio que Vítor Gaspar hoje quis apresentar, pretendendo transmitir a ideia que, como os chapéus, défices há muitos. Que é só escolher e que o Eurostat escolheu aquele. Mas que ele escolhe outro. Ele escolhe o défice primário estrutural!
Que é coisa que não existe – e como é estranho que nenhum jornalista lhe tenha dito isto -, é virtual. Existe nas suas folhas de Excel, como se fosse em laboratório bacteriologicamente puro!
As previsões macroeconómicas são de novo revistas, confirmando a implosão do orçamento em curso. A recessão, que no orçamento está fixada em 1%, e que há um mês, logo em Fevereiro, foi revista para o dobro é, agora, um mês depois, estimada em 2,3%. Mas ainda não desta que acerta: está mais próxima da realidade, mas é ainda insuficiente. O PIB cairá mais que isso!
Gaspar já prevê o desemprego a crescer aos 19%, anunciando que lá para 2016, daqui a três anos, estaremos de regresso à actual taxa de desemprego. Isto porque lá para o último trimestre do ano diremos adeus à recessão, e em 2014 já cresceremos 0,6%. Quer dizer, e tendo em conta a falta de jeito para previsões, o país que Gaspar e Coelho criaram em menos de dois anos vai ficar com um desemprego estrutural acima de 20%!
Os PIB nominais que estão por trás destes números é que não se conhecem: diz Gaspar que ainda precisam de umas afinações antes de poderem ser divulgados. Bonito. E sério!
Ah! E em 2040 teremos acertado o passo com os níveis de endividamento requeridos pelas regras da moeda única, os tais 60% do PIB. Ridículo: quem não acerta uma previsão a dois meses, lança-se numa a 30 anos. E motivante: em excesso de dívida, e portanto sem autonomia para coisa nenhuma, por mais 30 anos!
Gaspar e Coelho criaram tudo isto em menos de dois anos. Começaram a cavar este buraco quando, logo que tomou posse, o governo foi buscar aos portugueses metade do subsídio de natal e aumentou indiscriminadamente o IVA, sem que tal fosse estritamente necessário para o objectivo do défice, garantido pela habilidade da transferência dos fundos de pensões da banca. Não foi só a primeira grande machadada no consumo interno, foi também desbaratar a confiança, mesmo que residual, que ainda existia e substituí-la pelo pânico. Generalizado!
Depois foi sempre a aprofundar, a cavar cada vez mais fundo, com uma espiral de fundamentalismo a alimentar outra espiral: a da recessão. De pouco vale hoje falar de mais tempo, o mesmo mais tempo que ainda hoje Vítor Gaspar, completamente perdido, continuava a negar. Como poderá negar mais tempo, se é tanto mais tempo que já nem cabe no tempo do programa?
Como poderá negar mais tempo, quando tempo é a única variável que manipula?
Uma variável ilimitada. Numa folha de Excel pode sempre acrescentar-se mais um, dois, três… dez anos. Até que o tempo permita esquecer quantos são…
O país é que não é ilimitado. Os portugueses - por muito que custe ao Ulrich - é que não aguentam. Não aguentam que tudo por que passaram não tenha servido de nada, nem aguentam que em cima da pobreza a que chegaram seja ainda posta mais pobreza. Todos os anos, mais em cada ano. Porque foi apenas este mais tempo a que Gaspar e Coelho conseguiram chegar!
Como vi hoje algures escrito pelo Pedro Marques Lopes: “ Um ministro das finanças consciente, no fim desta conferência de imprensa, dirigia-se a S. Bento e pedia a demissão. Um primeiro-ministro normal metia-se no carro e dirigia-se a Belém para anunciar a sua própria demissão ao Presidente da República”.
Mas então o que é que se passou? O que é que motiva ou justifica tantos foguetes?
Já não somos lixo?
Já temos um rating de gente grande?
Já podemos ir à vontade aos mercados, como gente séria e respeitável?
Já não corremos o risco de nos chamarem caloteiros, aí numa esquina qualquer?
Nada disso!
A Standard & Poor´s manteve a classificação de lixo, a notação BB que utiliza para investimentos de alto risco. E naturalmente pouco recomendáveis. O que a Standard & Poor´s anunciou hoje foi isso mesmo, que manteve a notação absolutamente inalterada. Mas que alterou a sua perspectiva: o outlook, como eles dizem!
Passaram de um outlook negativo para um estável. Quer dizer, antes achavam que era lixo mas ainda podia piorar; agora acham que é o mesmo lixo e que por aí se vai manter. Que daí não vamos sair…
Dirão agora os mais optimistas, aqueles que vêm sempre o copo meio cheio: “Bem, pode não ser bom, mas também já não é mau que essas agências pensem agora que, para pior, isto não vai”!
Lamento desiludi-los, mas a Standard & Poor´s também explicou por que é que fez tão significativa alteração. Por que é que hoje já pode achar que o lixo é estável quando ainda ontem achava que o lixo ainda podia piorar. Uma simples justificação: porque os ministros das finanças da União decidiram apoiar o alargamento dos prazos que Portugal e a Irlanda terão para pagar os seus resgates.
Quer dizer, à Standard & Poor´s essa coisa do "mais tempo" diz alguma coisa. Não diz grande coisa, mas…
No meio de tanta desgraça, sem nada a que se agarrar, Passos Coelho corre atrás da primeira cana de foguete que vê. E quer que festejemos com ele… Ridículo!
O inimputável é, apesar de tudo, um bocadinho mais esperto: vejam lá se o ouviram dizer alguma coisa?
O Ecofin acabou de aprovar mais tempo. Quanto mais tempo e em que condições mais tempo, são coisas que não sabemos.
Mas há coisas que sabemos. Sabemos – disse-nos o inimputável Vítor Gaspar – que não será nada parecido com os quinze anos reclamados … pela Irlanda. Sabemos que Vítor Gaspar e Passos Coelho, que sempre recusaram esse cenário, como se sabe, pediram-no a medo, com vergonha e muito baixinho, a ver se por cá se não ouvia. E sabemos que quando assim é, quando o pedido tímido e envergonhado surge em lugar da convicção, da determinação e da objectividade, o resultado é frouxo. Tão ou mais frouxo que o pedido!
Sabemos que a Europa sempre fugiu das decisões frontais de combate à crise, que sempre preferiu as meias tintas e os pequenos passos à solução efectiva. Que em vez de ir directamente ao assunto, gosta de andar à volta dele. Que só em última instância, e sempre tarde, lá chega. Quando chega…
Sabemos que Vítor Gaspar diz que o mais importante é a Europa reafirmar a confiança no processo de ajustamento português. Que, para ele, não há nada mais importante que a manifestação da convicção da Europa no êxito do programa para Portugal. E sabemos o que isso significa. O que é que isso quer dizer, em que é que isso se traduz…
Sabemos bem que assim, dando agora mais tempo – nas maturidades dos empréstimos e no deferimento das metas do défice – mas deixando tudo o resto na mesma, não sobra qualquer impacto para a economia. Sem estímulos à economia e ao emprego, simplesmente mais tempo, é simplesmente mais tempo em crise. É simplesmente prolongar a crise…à espera que, daqui a uns anos, dos escombros de uma sociedade completamente destruída nasce uma coisa qualquer. O quê?
A recuperar do isolamento imposto pelo temporal vou-me dando conta que o mundo não parou. Que entretanto Obama tomou posse para o seu segundo mandato, num imenso happening em Washinton.
Que entretanto afinal o governo pediu “mais tempo”, o tal que não seria necessário. Nem nunca pediria porque, diziam, importante era vermo-nos rapidamente livres da troika. Tretas, como se sabia! De mansinho Vítor Gaspar chama-lhe revisão de maturidades…
Que entretanto Seguro continua à toa e sem rumo. Achando que isto está para brincadeiras, diz que tem surpresas para os portugueses… Assim... tipo Kinder!
Ó Tó Zé, já não há nada que nos surpreenda. Vocês são todos tão iguais e tão previsíveis… E tão irresponsáveis!
A reunião de ontem do Eurogrupo no Luxemburgo confirmou a já conhecida decisão da troika de dar mais tempo – mais um ano – para o processo de ajustamento português. Mais tempo que o governo sempre recusou e que boa parte dos que se lhe opõem sempre reclamaram!
Estes dizem agora que esta decisão da troika lhes vem dar razão e que o governo teria poupado o país a grande parte da destruição da sua economia se, a tempo e horas, tivesse reclamado mais tempo para o ajustamento. Os que defendem o governo, por sua vez, dizem que a troika tomou agora esta iniciativa justamente porque o executivo cumpriu rigorosamente com todas as obrigações. Porque Portugal foi bom aluno é que agora foi premiado pela troika!
Se dúvidas havia foram hoje dissipadas.
O FMI veio dizer que calculou mal o impacto da austeridade, veio fazer um tardio mea culpa, e reconhecer que a receita estava errada, como há muito toda a gente excepto o governo afirmava. E veio, diria que dirigindo-se directamente ao governo, dizer que aumentar impostos põe em causa o crescimento económico a longo prazo. O FMI não só disse que se tinha enganado como disse parem com isso. Não continuem a aumentar impostos porque isso é errado!
Independentemente da lata revelada pela Senhora Lagarde – é mesmo preciso ter lata – é coisa rara que uma instituição como o FMI venha fazer um acto de contrição como este.
A Comissão Europeia, pela voz de Olli Rehn, veio pedir justiça social na aplicação do aumento de impostos, falou em esforços de consolidação mas de forma socialmente justa e no respeito pela equidade social, ao mesmo tempo que apelava ao espírito construtivo das diferentes forças políticas em Portugal.
Uma linguagem, a exemplo da do FMI, nunca antes ouvida. E que, evidentemente, tem a ver com tudo menos com a estória do bom aluno. Porque a atitude do governo nunca foi a do bom aluno mas a do cábula e do graxa. O bom aluno há muito que tinha autoridade para dizer que a coisa não iria funcionar. O cábula nunca o percebe e o graxa só serve para dizer sim…
A troika simplesmente concluiu, depois de toda a gente mas antes de Vítor Gaspar e Passos Coelho, que o programa não funciona. Não funciona na Grécia, não funciona em Portugal e não funciona em lado nenhum.
Mas não se julgue que está empenhada noutro, numa estratégia e num programa que resolva este imbróglio em que estamos metidos. Não. Por enquanto apenas quer lavar as mãos, saltar fora …
Já se está a imaginar a cara de António José Seguro: só queria mais um ano e, agora, aparecem estes a reclamar dois. Nada lhe corre bem!
A de Passos Coelho – que continua na sua “nem mais tempo nem mais dinheiro” – nem dá para imaginar. Esforçamo-nos por imaginar e não vemos nada. Não está lá nada, já não tem cara!
Vítor Gaspar, anda pela China. Agora são as olheiras em bico que já lhe tapam a cara…
Ah! A cara é aquele sítio onde as pessoas guardam a vergonha… Há gente que não tem vergonha apenas porque não têm onde guardá-la.
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