Tomar conta do jogo não é bem como tomar conta de qualquer outra coisa. Embora seja mandar no jogo, como se manda noutra qualquer circunstância!
É pegar no jogo e impor a sua lei, a lei mais universal e mais antiga que existe: a do mais forte! Tomar conta do jogo é muito mais que controlá-lo. Muitas vezes há equipas que conseguem manter o jogo controlado sem que tenha tomado conta dele. Para controlar o jogo basta saber defender, marcar territórios. Normalmente muito recuados.
Por exemplo, o Sporting de Sá Pinto tem sabido controlar os jogos sem que consiga tomar conta deles. Lá bem atrás, vai segurando as pontas enquanto vê os adversários jogar à bola. E segurando os resultados, o um a zero da praxe! Há excepções, claro. Se não também não haveria regra. O último quarto de hora do jogo desta quinta-feira com o Atlético de Bilbau é essa excepção: sem nada para controlar - estava a perder – teve que mudar de agulha. E, para surpresa de toda a gente, acabou por tomar conta do jogo e dar a volta ao resultado (para 2 a 1). Uma volta que até poderia bem ter sido maior!
O Barcelona é a equipa que melhor sabe tomar conta dos jogos. É viciada nisso, não sabe jogar de outra maneira. O árbitro – muitos deles são tão ou mais viciados nisso que o próprio Barcelona, mas já lá vamos – apita para dar início ao jogo e lá estão eles, mandões, a tomar conta do jogo. De tal forma que ficam a bola só para eles, os adversários andam por ali atarantados a correr atrás deles e dela – da bola. Nem por isso conseguem evitar dissabores, como aconteceu esta quarta-feira com o Chelsea.
Mas há equipas que não precisam de tomar conta dos jogos para os ganhar. Arranjam quem tome conta por eles: assim uma espécie de outsourcing! Ou um anjo da guarda, sempre pronto a velar para que nada corra mal: sempre tudo sob controlo!
Já se percebeu que se está a sair do relvado, das quatro linhas. Pois! Também há quem tome conta do jogo sem sequer pisar o relvado.
É verdade. Há por aqui quem o faça com muito maior eficácia que o Barcelona!
Começou por tomar conta de uns sujeitos que, cabendo-lhes apenas velar pelo jogo, sabem bem como exceder-se nos cuidados e tomar conta dele. Depois viciou-os nisso para passar a mandar neles e, a partir deles, no jogo. Até acabar por tomar conta dele. Já lá vão trinta anos – foram assinalados num dos dias desta semana - e não se sabe por quantos mais continuará a tomar conta do jogo.
O êxito é tanto que não falta quem procure desvendar o segredo de uma receita de tamanha eficácia e longevidade. Ou mesmo fazer alguns ensaios laboratoriais – desastrados, como se está a ver - na expectativa de descobrir a fórmula mágica.
Falham os pequenos detalhes, mas é nos detalhes que está o segredo. Por exemplo, o original, o verdadeiro, tinha falado em Lisboa a arder, mas sem nunca sequer chegar a lançar um fósforo. Foi o suficiente para que aparecesse um sujeito a experimentar em laboratório mandar incendiar um bocadinho de Lisboa. Pagava umas viagens, e os bilhetes de avião eram emitidos nuns nomes que, correspondendo à pessoa do passageiro, eram estranhos, careciam de descodificação. No seu ensaio de laboratório o que o sujeito faz é um depósito bancário depois de uma viagem de avião. Não é a mesma coisa, e depois há ainda o detalhe de umas câmaras de vídeo nada indiscretas. As escutas telefónicas, no original, no verdadeiro, no mestre, não servem para nada. Até acabariam por se perder e deixar de existir, não fosse o pequeno detalhe ter aparecido uma coisa chamada YouTube. No ensaio no laboratório deste challenger ainda não se sabe o que lhes irá acontecer. Pode ser que nesse detalhe tenha corrido bem!
Mas – francamente – quem não se consegue tomar conta de detalhes deste tipo, nunca conseguirá tomar conta do jogo!
Pegar no jogo é mais uma expressão do futebolês que parece jogar com as palavras.
Se tudo se pega - e os brasileiros pegam ainda muito mais que nós - pega-se a sarna e pega-se em tudo, até touros se pegam - de caras e de cernelha – por que é que se não há-de poder pegar no jogo?
Pega-se no jogo, como se agarra o jogo e até como se segura o jogo! Nas cartas como no futebol!
Pegar no jogo quer apenas transmitir uma ideia de ascendência sobre o adversário, mexer os cordelinhos do jogo e ditar as regras.
Quer dizer, criar as condições para mandar no jogo, como já aqui vimos. Impor os ritmos de jogo e atingir uma ascendência sobre o adversário que lhe permita exercer o controlo e desfrutar de uma posição dominante. De assegurar o domínio sobre o adversário.
Pega-se e deixa-se cair, pega-se e larga-se. Num jogo de futebol também assim acontece. Para pegar no jogo é fundamental entrar bem. Que é como o futebol: é isso mesmo! Entrar bem no jogo, deitar mãos á obra desde o apito inicial do árbitro, sem estar à espera do que o jogo dá ou mandando às malvas o período de estudo, é mais que meio caminho para pegar no jogo.
Ouve-se cada vez menos mas era habitual em Portugal ouvir os comentadores fixarem o tal período de estudo. Normalmente de estudo mútuo! Era assim como que umas tréguas, só que no caso eram tréguas antes do início das hostilidades – expressão também muito utilizada para determinar o fim do período de estudo. Normalmente é uma iniciativa de um determinado jogador, não necessariamente do jogador que pega no jogo mas do que dá uma sapatada no jogo, que solta o grito de revolta.
Em Portugal o período de estudo era sagrado. Não havia jogo que não começasse com o estudo do adversário, o que tem um nome: cábula! Já não era estudar na véspera do exame, era não estudar de todo e começar apenas quando já estava no exame!
Hoje não é assim. Hoje fazem-se os trabalhos de casa, como em todo o lado, e já se chega ao exame pronto a deitar mãos á obra!
Por isso é que, das oito equipas apuradas para os quartos de final da Liga Europa (na Champions é que não temos cabimento!), três são portuguesas: Benfica, Braga e Porto. Prova disso é o Porto, que ontem começou a garantir o apuramento com um golo aos 40 segundos! Caído do céu, como frequentemente lhe acontece, mas golo. Que vale tanto como qualquer outro! Que vale tanto como o outro que o guarda-redes russo lhe ofereceu e que lhe garantiu a vitória e o apuramento!
Se o futebol português deixou de ser cábula e já consegue pegar no jogo antes que ele esteja bem agarrado pelo adversário, o italiano continua pouco interessado nisso. As equipas italianas estão-se nas tintas para o domínio do jogo: o que querem é especular com o jogo. Cínicos, como lhe chamam. Incapazes de olhar os adversários nos olhos…
As coisas, que lhe correram bem durante décadas, estão agora a mudar. Safa-se o Inter, campeão europeu em título por obra e graça de Mourinho!
Se, em Portugal, quisermos encontrar uma equipa que entra bem, que pega no jogo, mexe os cordelinhos, manda no jogo e dita as regras essa é, sem dúvida, o Porto. Esse é um mérito que se lhe não pode negar!
Este campeonato em curso é disso a melhor prova: entrou bem – sempre a ganhar –, pegou no jogo a seu belo prazer – pôs e dispôs como muito bem entendeu –, mexeu os cordelinhos para afastar a concorrência e mandou no jogo e nos adversários para manter a concorrência afastada, sempre ditando as regras, novas ou velhas. Uma, por exemplo, diz assim: marcam-se penaltis a favor sempre que tal se mostre necessário; contra só em última análise e, se marcado e convertido, mandar-se-á repetir até que o adversário o falhe! Outra diz que se podem agredir os adversários a partir das bancadas com bolas de golfe.
Esta acaba até de receber, já esta semana, um forte impulso do governo (afinal o Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, é do Porto) com a redução da taxa de IVA do golfe – a tal que a RTP confundiu com o modelo Golf, da Volkswagen – de 23 para 6%! Aí, no governo, é que ninguém consegue pegar no jogo...
Mas hoje é Dia do Pai. Para todos os pais, independentemente da cor e do credo, um feliz Dia do Pai. Junto dos filhos. E dos pais, para quem tenha esse privilégio...
No futebolês, o verbo mandar tem grande paralelo com o verbo queimar, aqui trazido há duas semanas. Também é de uso e abuso!
Poderíamos ser tentados a pensar que o verbo mandar tivesse passado de moda: não se manda, tomam-se decisões. Decide-se colegialmente, nada se impõe! E implementa-se, não se manda fazer! Lidera-se, pura e simplesmente…
Mas isso é nas novas teorias das organizações e na modernice dos novos processos de liderança. Ou simplesmente no domínio do todo-poderoso politicamente correcto! No futebol, apesar do seu contributo para as teorias de gestão, e em particular das comportamentais, com gurus de dimensão mundial – com Mourinho à frente de todos –, ainda se manda! E de que maneira!
Manda-se no jogo. Bom, dir-se-á que quem manda no jogo é o árbitro. E de certa forma assim é! Mas isto traz-me à memória aqueles azulejos que se viam nas lojas de artesanato ou de artigos regionais – pelo menos na minha região. Diziam assim (hoje já não seria politicamente correcto): “Cá em casa manda ela … e nela mando eu”!
Pois, no jogo manda o árbitro. Mas, depois, há quem mande nele! Tem havido…quem, assim, tenha mandado no jogo!
Mas mandar no jogo não é sequer isso. Não é nesse sentido. Mandar no jogo, assumir uma atitude mandona, tem a ver com isso mesmo. Com a atitude com que e equipa entra no jogo, impondo-se claramente ao adversário. Impondo a lei do mais forte e subjugando o mais fraco. Pode até deixá-lo respirar, não o sufocar. Mas subjugá-lo claramente! Assim como o Barcelona fez ao Real Madrid no início desta semana!
Isto de mandar no jogo tem que se lhe diga. Diz-se em futebolês que um joga o que o outro deixa. Transfere-se assim para o domínio da relatividade o desequilíbrio no confronto de duas equipas num jogo de futebol: pegando no exemplo anterior, o Barcelona jogou muito porque o Real, jogando pouco, o deixou; ou, ao invés, que o Real jogou pouco porque o Barça, jogando muito, não o deixou jogar mais.
Transportando isto para o mandar também se poderá dizer que cada um manda o que o deixarem mandar. O que não deixa de apontar para uma subliminar mensagem de apelo à subversão. Mesmo à revolução!
Mandar é mesmo atitude de mandão, de patrão à maneira antiga que não à patrão do futebolês – que é bem outra coisa, como aqui vimos já há muito tempo. De dono e senhor! E por isso mandar no jogo é também tornar-se dono e senhor do jogo!
No entanto no jogo manda-se em muitas coisas e mandam-se muitas outras. Mesmo sem mandar no jogo!
Manda-se o árbitro para todo o lado. Que se vinga e manda os jogadores para a rua. E os treinadores! Veja-se o caso do Vilas Boas: dois empates, duas vezes para a rua. E já disse que ainda iria mais vezes… Eu espero que sim. Mas, se têm de o mandar para rua cada vez que empata, como será quando começar a perder?
Também os jogadores fazem tudo para mandar os colegas (??) adversários para a rua, quando deveriam ser eles próprios a ser mandados porta fora. Há por aí muitos especialistas. Fazem cada fita… Quando começarem a ser mandados ficar de fora talvez se emendem. Por vergonha e por lealdade é que já vimos que não!
E também ainda se manda à fava. Ou às ortigas. Foi o que Jorge Jesus fez no domingo ao repórter da TVI. Mandou-o à fava e, com um tchau, deixou-o a falar sozinho.
Uns acharam bem. Outros nem por isso. Uns acham que é apenas mais um episódio no folhetim de um ataque aberto da comunicação social. Outros que não passa de mais um sinal da desorientação que este ano se apossou do treinador do Benfica
Uns e outros poderão ter alguma razão. Quem a não tem, e que nada tinha a ver com isso, é seguramente o FC Porto, que se apressou a emitir um comunicado descabido: mais uma mera acção de guerrilha. Mandar o barro à parede? Não, apenas mandar areia para os olhos!
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