Fechou o mercado de transferências do futebol, e com isso a torneira mais apreciada pela nova maneira de fazer notícias numa das mais apetecidas valências do jornalismo actual.
O último dia do mercado é normalmente vivido em ambiente de alta histeria, com o climax no count down final, segundo a segundo até ao último da meia noite. Ás vezes, esses segundos não chegam, como acontecera há um ano com Adrien. E Bruno de Carvalho, inevitavelmente...
Tudo estava preparado para que desta vez tudo se repetisse. Mas falhou. Faltou mercado, ou faltaram loucuras. Pelo que deu para ver só a RTP percebeu isso, e desligou por completo, poupando-se àquela 24ª hora de encher chouriços em chorrilhos de patetices. Nenhuma das outras televisões resistiu ao engodo, e lá ficaram a contar os segundos penosamente.
Valeu-lhes ... Fábio Coentrão. Isso mesmo, foi ele a estrela da noite com a sua sensacional transferência do Real Madrid para ... o Rio Ave. E com o último suspiro do seu choro comovente: "Depois do que fiz, nem uma chamada do Sporting"!
Como se a sua conduta moral, o seu carácter e a sua escala de valores e princípios não tivessem nada a ver com o destino que a vida lhe traçou... Diz-se nestas circunstâncias que é um problema de cabeça. A cabeça dos jogadores de futebol tem frequentemente as costas largas. Fábio Coentrão não terá a melhor das cabeças - percebeu-se isso vezes de mais - mas não é de cabeça o seu principal problema. É de coluna!
Os mercados - ei-los de novo - estão nervosos. E terão razão para isso: por todo o mundo as bolsas caem e os rumores de novas bolhas prontas a rebentar sucedem-se. Na Europa as coisas não estão melhor, antes pelo contrário. Em Espanha - sem governo, nem solução à vista - o IBEX (o índice bolsista da Bolsa de Madrid) já caiu, este ano, mais de cem milhões de euros. Em França, a Societé General, o maior banco francês, afunda-se. E, the last, not the least, nos mercados ninguém acredita na solvência do Deutsche Bank. Isto é, também a poderosa e irrepreensível Alemanha está a assistir ao colapso do seu maior banco.
Não são, pois, poucas as razões de susto para os mercados. Reparo, com surpresa, que nenhuma tem o que quer que seja a ver com Portugal. Alguma coisa me deve ter falhado, porque Herr Schäuble, o visionário ministro das finanças alemão, para gáudio dos seus admiradores em Portugal - na primeira linha dos quais está Passos Coelho, que até já aproveitou a maré - gritou bem alto, e com o habitual dedo (torto) em (pouco) riste, que "Portugal não pode continuar a perturbar os mercados".
É isto a Europa de Schäuble e da direita míope que a está a destruir. Não há qualquer problema económico numa economia que há anos está estagnada e que não encontra saída para o crescimento. Não há problema social que tire o sono a ninguém, quando o desemprego continua sem solução. Não há problemas políticos para resolver em lado nenhum, quando valores democráticos - fundamentos da integração e condição indispensável à adesão - estão postos em causa nalguns países membros. Não há nenhum problema no seu sistema financeiro, quando os seus maiores bancos começam a dar maus sinais. Não há qualquer problema com Schengen. Não há problemas com a Inglaterra. Não há problemas com os milhões de refugiados que estão a entrar pelas suas fronteiras dentro. Não há qualquer problema que regiões do globo estejam a ser destruídas, e a alimentar o infindável surto de refugiados que de lá são obrigados a fugir.
Problema, problema sério, é Portugal. Só porque a maioria dos eleitores disse que a receita do Sr Schäuble, aplicada durante quatro anos, e ao contrário do que ele continua cegamente a garantir, não funcionou. E que, por isso, tinha de ser abandonada!
Também à meia noite fechava o mercado para a colocação do Novo Banco, uma espécie de Rolando que o governo tinha nas mãos do Banco de Portugal, uma espécie de Jorge Mendes, mas com bem menos jeito para o negócio.
Como no outro mercado, também aqui há uns que fecham mais tarde. E ao contrário do outro, há ainda os que, depois de fechados, reabrem. Sabe-se lá com que custos... Até porque aquilo está a sair pior que com o Ola John: então não é que, no último dia, no verdadeiro dia D, quando, a apresentar alguma coisa teria de ser de arromba, tipo fintas e mais fintas, remates e golos, não encontram melhor para apresentar que 252 milhões de prejuízo no primeiro semestre?
Fechou o mercado de transferências, como habitualmente com um último dia – que não foi 31 de Agosto, por ser domingo – muito agitado … e cheio de truques.
Falcão, anunciado para o Real Madrid, a quem jurara já amor eterno, acabou no Manchester United, de Van Gaal, não sem algumas convulsões, e com o truque do empréstimo – empréstimo por um ano, por 8 milhões de euros, com opção de compra no final – porque em Inglaterra há uma coisa a que se chama fair play financeiro, que obriga a uma relação entre compras e vendas, investimento e desinvestimento, que o United, com um volume de investimento nunca visto, rebentou já por todos os cantos. E não são apenas os portugueses, ou os latinos, os especialistas a contornar leis… Para o Real Madrid, não se sabe para quê, seguiu o mexicano Chiciarito. E, do Manchester City para o Valência, Negredo, em vez do Jackson Martinez.
Por cá – e isso é que interessa – o Enzo fica. Por enquanto, como o nove do Porto, com quem o destino estava (está?) cruzado, como por aqui se foi dizendo. Porto que esteve de resto muito activo neste último dia, indo buscar mais dois miúdos e colocando praticamente todas as vedetas que adquiria na época passada, mas não se conseguindo livrar do Rolando.
Para o Benfica pode dizer-se que o mercado fechou da mesma forma que esteve aberto – sem grande critério, com uma estratégia difícil de perceber. Não dispensou os jogadores excedentários, os erros de casting maioritariamente cometidos este ano, colocando apenas os velhos Urreta (Paços de Ferreira) e Sidnei (Deportivo Coruña) e acaba por apenas contratar Cristante, um jovem italiano de 19 anos (na foto). Que, apesar da sua excelente qualidade, não deixará de ser uma contratação estranha, difícil de compreender. Não tanto pelo paradoxo da aposta na juventude estrangeira, quando à da casa é exigido que nasça dez vezes, mas porque faz da contratação anterior uma contratação falhada. Desastrada mesmo, porque o grego Samaris é um jogador para as mesmas funções, de menos qualidade e muito mais caro, já pelos valores que o presidente Luís Filipe Vieira tinha declarado fazerem parte do passado.
E não contratou qualquer avançado, a óbvia lacuna do plantel depois das saídas de Rodrigo e Cardozo, falhando sucessivamente todas as tentativas, a última das quais de Campbel, a estrela costa-riquenha do Arsenal. E ficando com um sério problema por resolver, não se vê quem consiga marcar golos…
Para encontrar razões de sucesso neste fecho de mercado temos que as procurar na continuidade de alguns dos seus melhores jogadores: Enzo, Gaitan e Salvio, evidentemente, mas também o lesionado Sílvio, cujo empréstimo foi renovado.
Mas, olhar para os avançados e dar de caras com o Jara, é medonho!
É impressionante a facilidade com que se lava em Portugal, tanto mais que não é exactamente um exemplo de país lavadinho. Lava-se dinheiro de toda a maneira e feitio, até com vistos gold, e lava-se gente como e nenhuma outra parte do mundo.
Hoje, já se percebeu, é dia de lavar Vítor Gaspar… Talvez porque fomos ao mercado aumentar a dívida, mas dar mais um passo para a saída do dito. Limpa, também ela. Lavadinha como as irlandesas...
No dia-a-dia temos os mercados, que tanto nos chatearam, dando-nos mesmo cabo da vida. No futebol temos o mercado!
Nunca percebi se a utilização do singular serviria para distinguir o mercado da bola - coisa que o povo percebe bem, que trata mesmo por tu, nada lhes escapando - do financeiro, que não entende de todo, que dele só sabe que serve de desculpa para os que lhes lixam a vida. Ou se, quando se trata de nos lixar a vida, há mesmo muitos e, quando o negócio é comprar e vender jogadores, basta um. À primeira vista dir-se-ia que há dois: o de Verão e o de Inverno, pelo que o uso do singular só pretende mesmo separar o trigo do joio. Mas logo podemos entender que Verão e inverno são apenas as duas faces da mesma moeda, duas épocas de um mesmo e único mercado. Assim como se fossem a época normal e a de saldos!
Seja lá como for as transferências de jogadores de um lado para o outro acontecem no mercado, e não nos mercados. E o mercado, ao contrário dos mercados - que só fecham ao fim de semana - fechou à pouco, há meia noite de ontem, e já só voltará a abrir de novo no Verão. Em boa verdade não fechou completamente, ficaram duas engras por onde ainda alguma coisa vai passar: a Rússia e a Turquia, onde não costuma faltar dinheiro!
E se não se pode dizer que a montanha pariu um rato, também não se pode exactamente dizer que não tenha ficado muita gente a chuchar no dedo…
Fica a ideia que, no Porto, Pinto da Costa vai ter de comprar algumas chupetas, se não quiser que o Fernando, o Otamendi e o Mangala estraguem os dedos. Que bem falta lhes fazem, é tudo gente que usa muito as mãos para jogar à bola. Os dois primeiros nem sequer tinham seguido com a equipa para a Madeira, veja-se bem o melão…
Da mesma forma que fica a ideia que o mercado foi generoso para o Benfica. Ou para Luís Filipe Vieira, sabe-se lá!
Como fica a ideia que continuam por lá toupeiras… Só isso explica a notícia antecipada do negócio do André Gomes. Que é afinal idêntico ao do Rodrigo, e onde Jorge Mendes não é Jorge Mendes, mas um fundo do Jorge de Mendes. Porque, aí, o mercado é igual aos mercados, onde os fundos são quem mais ordena.
O Benfica encaixou 70 milhões de euros e, para já, perde apenas um jogador: Matic, como há muito se sabia e já havia sido assimilado pela massa adepta. O Rodrigo fica a jogar até ao fim da época, tal como o André Gomes, no banco. É quase certo que o Garay ainda vai sair pela engra russa que ainda ficou aberta, no que será certamente o pior negócio de todos. Mas inevitável. De uma incompreensível inevitabilidade!
O mais excitante fecho de mercado aconteceu no entanto em Alvalade. Este Sporting não pára de surpreender!
Investindo como pequeno está a fazer o campeonato de grande. E bastam-lhe 500 mil euros para ser a estrela maior da noite de fecho do mercado. A Lisboa já tinha chegado uma estrela faraónica, com nome de jogador, sem dúvida, mas de mau presságio: Shikabala. Shik, abala!
Bastou isso para que, entre Shik abala e Shik fica, ficasse provado que nem só de milhões se faz a excitação dos grandes negócios. Para se ter uma ideia do suspense hitchcockiano, às cinco para a meia-noite, Shik abalava. E à meia-noite, em ponto, Shik ficou!
Mas mais. O Sporting foi ainda o rei da noite porque, mesmo assim, foi quem mais se reforçou. Ao egípcio juntou ainda o cabo-verdiano Heldon, contratado ao Marítimo por 1,5 milhões. Que festa, com dois milhões!
Nem tudo correu bem, mas disso não há imprensa que fale. Não conseguiu livrar-se do Elias. Mas livrou-se do Jeffren, que também não era pêra doce!
O Banco Central Europeu não pôs as rotativas a trabalhar mas foi quase como se pusesse. Colocou uma pipa de massa ao dispor da banca, para injectar liquidez: uma boa notícia!
Os bancos, 522 bancos europeus, correram a esse dinheiro como lobos famintos atrás de um rebanho e sacaram quase 500 mil milhões de euros. Os mercados financeiros, em vez de se tranquilizarem com esta volumosa injecção de dinheiro no sistema, ficaram ainda mais nervosos: acharam que toda aquela fome de dinheiro era mau sinal. Resultado: os juros das dívidas soberanas dispararam e o risco de incumprimento subiu para uma série de países europeus, entre os quais já a Áustria e a França! E a taxa de juro para a Itália voltou para os 7%!
Vá lá a gente perceber isto… Preso por ter cão e preso por não ter!
O que restava da EDP nas mãos do Estado foi parar a mãos chinesas. Dizia-se por aí que seriam os alemães da E-ON, que Angela Merkl tinha dado a volta a Pedro Passos Coelho, o que nem sequer era muito difícil. Mas não, o governo privilegiou o encaixe em detrimento de opções mais naturais, como seriam a alemã ou a brasileira. Terá sido a melhor opção?
Há quem defenda que sim, que para além de receber já mais dinheiro, o governo, com esta opção, favorece as condições de financiamento da EDP. Mas também há quem veja esta opção como de curto prazo, e errada do ponto de vista estratégico. A China não vem acrescentar valor, nem traz quaisquer outros apports sinergéticos!
Mas vá lá a gente perceber isto: então privatizar não é, por definição, entregar a privados? Ora o governo vendeu ao Estado Chinês, a uma empresa pública chinesa! O maior accionista da EDP continua a ser o Estado. Só que o chinês!
Hoje voltamos a estender a mão. Precisávamos de mais 1,2 mil milhões e lá fomos … aos mercados!
Pagamos caro. Muito caro: 6,83%, já roçar os tais 7%!
Mas Teixeira dos Santos veio dizer que tinha corrido bem. “Correu bem” – disse, como na maioria das vezes a mentir, dizem os miúdos à saída de um teste no meio do período.
A nós, como aos pais daqueles miúdos que sabem que estão a mentir, pareceu-nos mal. Nem conseguimos perceber o que pudesse ter corrido bem!
Este “correu bem” lembrou-me aquele ar de “desta já me safei” do primeiro-ministro quando da aprovação do orçamento na semana passada!
Está estendida a passadeira para receber o FMI … Por culpa dos mercados, claro!
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