Mesmo que ainda há poucos anos fosse de todo improvável, foi sem surpresa que este governo da Região Autónoma da Madeira, de Miguel Albuquerque, caiu. Já nem deveria ter tomado posse, se bem nos lembrarmos ... Mas Miguel Albuquerque e o PSD entenderam por bem passar por isto, e sujeitarem-se a cair por censura, sem honra nem glória. Por uma moção de censura aprovada por toda a oposição.
Nada disto foi nesta altura surpreendente. Há muito que a moção de censura tinha sido apresentada, e há muito que que toda a oposição anunciara que a aprovaria. Apenas foi empurrada por Miguel Albuquerque o mais possível para a frente.
E também não foi surpreendente que, com um microfone à mão, Alberto João Jardim tenha logo culpado a República disto tudo. Que só quer acabar com a autonomia... Vá lá que se esqueceu dos cubanos. Lembrou-se apenas que só depois de ter saído - "quando quis e não quando de Lisboa o empurraram" - é que o caldo se entornou. Que Miguel Albuquerque nunca conseguiu ter o partido na mão.
Depois de Alberto João Jardim lhe apontar o dedo da rua - "a Madeira não pode ficar refém de um homem só", declarou, alto e bom som - Miguel Albuquerque já não tinha por onde se segurar. Agora, que o JPP (Juntos pelo Povo, o terceiro partido na Madeira, com nove deputados) anunciou que também vai votar a favor da moção de censura, do Chega, depois de nove anos agarrado ao poder, está a cair desamparado.
Menos de seis meses depois das últimas eleições, oito meses depois das penúltimas.
Miguel Albuquerque quis ser Jardim. Só que não é Jardim quem quer. É quem pode, e já nem Jardim pode. Nem quer!
Não faltaram reacções ao sismo desta madrugada, de 5,3, 5,4 ou 5,9 na escala de Richter. Intensidades para todos os gostos (Instituto Português do Mar e da Atmosfera, Serviço Geológico dos Estados Unidos, ou Centro de Sismologia Euro-Mediterrânico), como as reacções. Também para todos os gostos.
Então é assim: há um sismo daqueles em que não é preciso fazer nada, e por isso nada foi feito. Mas foi um teste e correu bem.
Ainda bem. É que, na Madeira, o chefe do governo foi para férias em Porto Santo enquanto tudo ardia, para depois vir dizer que tudo tinha corrido bem. Só nos faltava agora que, com o chefe do governo da República de férias, no Brasil, um terramoto no continente não corresse bem.
A situação política na Madeira não tem nada a ver com a do país. Já percebemos que não.
Percebemos que não quando Miguel Albuquerque, o primeiro a exigir publicamente a demissão de António Costa, há pouco mais de dois meses, recusou determinadamente demitir-se. Quando Luís Montenegro, o segundo a exigir a demissão de Costa, declarou manter a confiança política em Albuqerque. E percebemos quando, do chefe do governo regional da Madeira sabemos que é, para além de arguido, suspeito de identificados actos de corrupção; enquanto, do chefe do governo do país, continuamos sem saber de que é suspeito. São tão diferentes que até a Polícia Judiciária, que dá sempre nomes sonantes às operações, chamou "influencer" a uma e deixou a outra sem nome, apesar do aparato: um Hercules C-130 (da esquadra bisontes), a aterrar na Madeira com 300 pessoas a bordo, transbordadas directamente para autocarros estacionados na pista, com os parques de estacionamento com a lotação esgotada por carros alugados para a operação.
Como uma coisa não tem nada a ver com a outra, a antecipação de eleições, que no país foi a decisão correcta, é absurda e sem nexo na Madeira - dizem. A melhor justificação para não aplicar na Madeira o que foi decidido para o país, acabou de ser apresentada por Manuela Ferreira Leite: o governo do PS já tinha oito anos; o do PSD, na Madeira, tem apenas dois meses!
Palavras para quê? São artistas portugueses, como dizia o velho anúncio...
Ontem a Madeira tremeu. Na escala política, equivalente à de Richter, o terramoto passou do grau 9. Não caiu tudo porque os alicerces são bem fundos. São muitos anos daquilo, uma espécie de construção anti-sísmica com perto de 50 anos.
Sabe-se que Miguel Albuquerque continua de pé, mas não firme. E sabe-se que, sabendo-se como as coisas foram acontecendo na Madeira nos reinados de Alberto João e Albuquerque, a terra alguma vez teria de tremer. Estranha-se é que tenha acontecido agora, e a partir de denúncias anónimas.
Cá pelo continente treme Luís Montenegro. Mas treme também o regime. Agora com mais violência.
E treme Sócrates, que já esfregava as mãos com a prescrição do pouco que o Juiz Ivo Rosa deixara sobrar. Três juízas da Relação "arrasaram" o Despacho de Instrução de Ivo Rosa, voltaram a confirmar as acusações e enterraram o fantasma de prescrição. Não sei se dá algum ânimo ao regime. Mas devia!
As eleições regionais da Madeira, ontem realizadas, animaram o espectáculo político do país.
O PSD já tinha deixado de ganhar sozinho na Madeira, já tinha precisado de dar o braço ao CDS, quando ainda se sabia o que valia. Apresentou-se coligado com o velho parceiro, que hoje, nem na Madeira nem em qualquer outro lado, ninguém sabe o que vale. Sabe-se - calcula-se - que valha pouco. Ganhou. Ganharam. Claramente, mas sem maioria absoluta e, consequentemente, com a necessidade de alargar a base parlamentar de apoio ao novo governo aos novos partidos que chegaram pela primeira vez à Assembleia Regional madeirense Chega, PAN e IL.
Bastando-lhe para a maioria parlamentar o deputado eleito pelo PAN, ou o outro eleito pela IL, pôde dar-se ao luxo de descartar, e assim continuar a empurrar com a barriga, a sombra arrepiante do Chega. É até provável que Miguel Albuquerque se socorra de ambos para se precaver de qualquer percalço, assim a jeitos dos que têm acontecido nos Açores.
Até aqui tudo normal. Mas não tão normal para evitar um fartote!
A jeito de aperitivo, começou pelo PS, objectivamente o maior perdedor, com Sérgio Gonçalves, o líder regional, a festejar por ter "mais votos em conjunto do que a terceira e quarta forças políticas que participaram neste ato eleitoral" e a garantir ter ficado “claro que o Partido Socialista é a única alternativa de governo para Madeira”. Continuou, como se fosse o prato de peixe, com Luís Montenegro a comparar "os 43,13% do resultado da coligação, os 41,37% que deram ao Doutor António Costa maioria absoluta". A caldeirada é prato de peixe, mas tão substancial que já dispensava prato principal.
Obviamente que não falta qualquer legitimidade eleitoral a Miguel Albuquerque para continuar à frente do governo regional. Legitimidade política e vergonha na cara é outra conversa!
E essa é conversa para continuar. A começar já no inevitável envolvimento do IL, do "menos Estado para tudo" na solução governativa que mais uso faz do " Estado para tudo" no nosso país!
O PSD ganhou as eleições regionais na Madeira à rasquinha. Perdeu a maioria absoluta, que mantinha desde sempre - há 43 anos, tantos quantos conta a História do estatuto autonómico - e apenas vai conseguir manter o poder porque, coligado com o CDS, tem mais um deputado que a esquerda. Ganhou à rasquinha e mantém o poder à rasquinha!
E no entanto, para Miguel Albuquerque foi uma vitória clara, inequívoca e estrondosa.
Mas nem assim o líder regional do partido e do governo conseguiu arrebatar o prémio do absurdo da noite eleitoral. O "non sense" absoluto ficaria mesmo para o apelo de Paulo Cafôfo ao CDS, e ao pleno da coligação negativa. Para o número 1 da lista do PS geringonça é coisa do passado. Agora é preciso passar para a geringonça com piruetas e mortais encarpados à retaguarda.
Já chegamos à Madeira?
PS: "Já chegamos à Madeira", vulgarmente utilizada em expressão de espanto, surpresa ou até de absurdo, é uma velha expressão mas não uma expressão velha. É bem nova. Há quem diga que decorre de se fazer no Funchal a primeira escala no transporte dos militares para a guerra colonial. Aí saídos, e pela primeira vez soltos das amarras da família e da ordem militar, os mancebos explodiam. Quando regressavam ao barco não eram mais os mesmos. E a ordem e o aprumo de até aí transformavam-se em caos para o resto da viagem.
O PSD ganhou, com maioria absoluta, as eleições regionais na Madeira. Nenhuma novidade, é assim há praticamente 40 anos... A novidade é que Alberto João Jardim continua a reclamar para si a vitória. Dá a ideia que se preparava para cobrar alguma coisa...
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