Nas suas homilias dominicais na SIC Marques Mendes, no rasto de Marcelo, fala de tudo. “Do leitão às tácticas do futebol” como, com graça, a Marisa Matias se referiu a Marcelo neste fim-de-semana.
Por isso Marques Mendes não podia, como todas as televisões tinham feito, passar ao lado da notícia da semana. A curiosidade era grande: não podia ignorar o tema, que não atingia apenas o seu amigo e sócio Miguel Macedo. Atingia-o também a ele!
Falou da pouca-vergonha da devolução da sobretaxa, mesmo que habilidosamente. Falou de Cavaco, que sem surpresa voltou a defender. Comparou o incomparável, com Jorge Sampaio. E anunciou para amanhã a decisão do presidente, a decisão inevitável, como se esforçou por explicar. Com muitos pedidos de esclarecimento e mais ainda de garantias.
Disse que Elisa Ferreira não aceitou ser ministra do novo governo e, antes de fechar em apoteose com o patético almoço de Sócrates, no alinhamento combinado, lá saiu o tema dos vistos gold e o nome de Miguel Macedo da boca do pivot. Verdadeiramente incomodado, mas deixando evidente que não podia deixar de ser assim, Marques Mendes entrou pelo assunto dentro como se de uma penitência se tratasse. Como se a acusação fosse já bem mais que isso, ao ponto de não ter mais por onde se esconder que na exaltação do Estado de Direito... Quando pensávamos que fosse por ali fora e chegar ao seu próprio nome, também envolvido, o pivot tratou do assunto. Parou-o logo ali, lançando-lhe a bóia – “ainda não foi julgado, até lá é inocente” – que Marques Mendes aproveitou para, sem mais – nem mais uma palavrinha – encerrar o assunto. E passar rapidamente para o tema Sócrates…
Marques Mendes – e a SIC – entenderam fazer aquele número. Mais valia que tivessem passado ao lado do assunto. Teria sido mais sério: assim estão apenas a tratar-nos por parvos!
Um ano depois de deixar o governo por envolvimento no caso dos vistos dourados, Miguel Macedo foi esta semana acusado de quatro crimes. No âmbito desse processo, que envolve altos quadros da administração pública, mas ainda noutros, e envolvendo ainda outros altos quadros do ministério que titulava.
É a primeira vez que um ministro de um governo em funções é acusado por crimes - e tantos e de tanta gravidade - no exercício das sua acção governativa. Só por isto, mesmo que nada mais se passasse, é notícia. Tem de ser notícia!
Extraordinário é que não seja. Impressionante é que as televisões tenham passado totalmente ao lado desta acusação do Ministério Público. Que, com a notícia à frente, se tenham desviado dela para nem sequer a encontrarem. Que nem um único comentário tenha merecido a nenhum dos inúmeros comentadores espalhados por essas televisões todas.
E sabe-se que, em Portugal, se não passa na televisão, não aconteceu... Se ainda havia quem tivesse dúvidas sobre o estado a que isto chegou, ficou esclarecido. De vez!
Não sei se Miguel Macedo era um dos melhores ministros deste governo. Acredito que sim, e pelo que se conhece de todos os outros, é muito provável que sim. Não tenho grandes dúvidas que, de todo o governo, só dois ministros se aproveitam.
Miguel Macedo é um deles. O outro - e não sei se será uma questão de apelidos - é Paulo Macedo, ministro da saúde. Talvez pela forma como se soube preservar, e não tanto pelas facilidades da pasta - a administração interna não é uma pasta fácil, o ministro é que teve certamente o mérito de o fazer parecer -, Miguel Macedo esteve menos exposto e, por isso, menos sujeito a desgaste. As condições climatéricas, ajudando a fazer deste ano um dos mais tranquílos em matéria de incêndios, ajudaram-no bastante. Mas também não esquecemos que o ano passado foi sujeito a um dos mais difíceis de sempre. Nunca os incêndios tinham sido tão dramáticos, nem nunca tinham provocado tantas vítimas mortais entre os bombeiros. E nem assim Miguel Macedo saiu muito chamuscado pelas chamas...
Tem que ter, evidentemente, competência e carácter, atributos que hoje poucos reconhecerão à generalidade dos membros do executivo. E por isso, ao contrário de muitos dos seus colegas em circunstâncias de responsabilidades directas muito mais graves, não só reconheceu que não poderia continuar em funções depois do que foi conhecido no processo dos vistos dourados, como não se dispôs a fazer o frete ao primeiro-ministro, que queria mantê-lo a todo o custo, metendo-o no saco dos Cratos, das Teixeiras da Cruz e de outros que tais.
Mas Miguel Macedo não deixou deixou nesta sua demissão apenas uma nota de carácter. Deixou ainda uma de inteligência e de sentido de oportunidade política, tornando-se porventura no único ministro deste governo com futuro político asseguardo. A médio, ou mesmo a curto prazo!
Há poucos dias, na sequência da tomada das escadarias de S. Bento pelos polícias manifestantes, o Director Geral da PSP, Paulo Gomes de seu nome, demitiu-se e foi de imediato substituído exactamente pelo responsável operacional sobre quem deveria cair a responsabilidade por tal acto de sublevação.
Achou-se estranho, aqui mesmo foi dada conta dessa estranheza. O que não se sabia, mas sabe-se hoje, é que foi criado – inventado - um lugar na embaixada portuguesa em Paris para acolher o demitido Paulo Gomes. Chama-se a esse lugar oficial de ligação e tem, ao que se diz, a remuneração mensal de 12 mil euros.
Pode ser que isto tudo faça sentido. Pode até ser que o ministro Miguel Macedo continue a destoar – pela positiva – neste governo. Mas que também isto é estranho, é!
Dizem os jornais que o ministro Miguel Macedo exigiu que rolassem cabeças na Polícia mas, pelos vistos, teria preferido que tivessem rolado no governo.
Só assim se percebe que, perante a recusa do até aqui Director Nacional de PSP – Paulo Valente Gomes – em fazer sangue, demitindo-se, o ministro tenha nomeado para o substituir precisamente – e na circunstância - a primeira cabeça a exigir. É que novo Director Nacional de PSP, Luís Peça Farinha, era o comandante da Unidade Especial de Polícia…
E já que estamos em maré de esclarecimentos seria de aproveitar para também esclarecer o que se passou exactamente na RTP. É que está tudo muito confuso, e já não se percebe onde começa a mão do ministro Miguel Macedo e acaba a de Miguel Relvas. Que lá estão ambas é a parte menos confusa da estória!
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