Poderemos até conceder que, sem meios - entre eles competência nos seus recursos humanos -, o Ministério Público reduza os seus processos de investigação a escutas telefónicas. Quem não consegue investigar segue pelo caminho da bisbilhotice. Não é assim que se faz Justiça, mas é assim que por cá se faz tudo.
Não dá é para conceder que essas escutas surjam a público nas televisões e nos jornais. Se as escutas divulgadas tiverem conteúdo probatório relevante, é um problema de funcionamento da Justiça. Porque não é à opinião pública que cabe fazer o julgamento judicial. Quando são divulgadas publicamente conversas absolutamente marginais ao que está em "investigação" temos um problema grave no regime. São as instituições a alimentar a velha prática bisbilhoteira que faz de Portugal um país eternamente atrasado.
Parece-me que é já evidente, com o que se conhece "nesta altura do campeonato", que a "operação influencer" é a demonstração mais clara do estado de degradação aque chegaram as instituições da nossa democracia. E que tem muito mais de "Golpe de Estado" do que de normal funcionamento das instituições.
Ficou hoje a saber-se que o tal último parágrafo - "No decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido. Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente" - do comunicado da PGR naquele dia 7 de Novembro, que António Costa invocou para a demissão, foi escrito pela própria senhora procuradora-geral da República, Lucília Gago. Já se estranhara a sua nunca explicada deslocação a Belém, pelo meio das duas reuniões dessa manhã entre o primeiro-ministro e o presidente da República. Agora ficou a saber-se que fica pessoalmente ligada a esta relação causa-efeito, reforçando a ideia de um "Golpe de Estado" preparado durante quatro anos por alguns agentes do Ministério Público.
Aquele último parágrafo era desnecessário. Provavelmente, depois de todos os "casos e casinhos" que atravessaram este governo, teria bastado o envolvimento de pessoas tão próximas como o seu chefe de gabinete - e em especial o insólito caso do dinheiro guardado/escondido no gabinete -, ou o "seu melhor amigo", para António Costa se demitir. Soa, por isso, a estocada final da senhora procuradora-geral da República.
No momento certo?
Talvez se conheça a resposta a esta pergunta quando se souber o que foi a procuradora-geral da República fazer a Belém. Um dia se saberá. Por agora só sabemos que, vontade de deitar o governo abaixo, era coisa que há muito não faltava a Marcelo. E que só lhe faltava o momento, mesmo que não fosse o certo.
Boa parte dos adeptos portistas começou a descobrir por estes dias, ontem e hoje, depois de 40 anos de práticas criminosas, de coacção e agressões, que Pinto da Costa fez do FC Porto uma organização à imagem da Mafia e, do Porto, uma cidade geminada com Palermo.
Já o Ministério Público, mais dado à política que à bola, depois de 40 anos disto, e de 20 de "apito dourado", precisou disto para desconfiar que é capaz de haver alguma razão para abrir um inquérito.
A descoberta dos adeptos portistas, a gente percebe: já não ganham. Enquanto ganhavam tudo ia bem, o guarda Abel era um zeloso agente da autoridade, a escolta pretoriana de Pinto da Costa um grupo de escuteiros, e o Madureira um cidadão exemplar. Que só agora o Ministério Público tenha encontrado motivo para abrir um inquérito, é que cheira a mistério.
João Galamba demitiu-se, finalmente: "...para assegurar à minha família a tranquilidade e discrição a que inequivocamente têm direito”, justificou. Ou para não ser demitido amanhã, como estava mais que anunciado?
Parece-me mais isso. Mas isso é defeito meu, que por feitio nunca acredito em nada do que Galamba diga. O que não quer dizer que não me incomode a perseguição e as esperas que lhe têm feito à porta de casa.
Incomoda-me. Como me incomoda tanta coisa que está a acontecer por aí. Como me incomoda que se prendam pessoas para serem interrogadas. E que sejam libertadas depois. É tudo ao contrário. Normal seria, se fosse caso disso, que as pessoas fossem presas depois de interrogadas. Como me incomoda que, uma semana depois, se continue sem saber o que é que a Procuradora Geral da República foi fazer a Belém. Como me incomoda que um primeiro-ministro "fale ao país" para falar à Justiça. Que o Ministério Público troque nomes na transcrição de escutas. Ou que invoque portarias que nada têm a ver com o que evoca.
Pelo que já ouvimos da pronúncia de decisão instrutória do processo Marquês, que ainda decorre no momento em que escrevo, sabe-se já que Sócrates não vai ser julgado por corrupção, a acusação principal. Todas as acusações daquela natureza caíram, e as que foram consideradas já tinham prescrito.
Apenas cinco arguidos chegam a julgamento - Sócrates, Carlos Santos Silva, cada um apenas por três crimes de branqueamento de capitais e por outros tantos de falsificação de documentos, e Ricardo Salgado, por abuso de confiança, Armando Vara por branqueamento de capitais, e João Perna, o motorista de Sócrates, por posse de arma ilegal.
Poderá haver quem acuse o juiz Ivo Rosa de excessivamente garantístico, ou até de suspeitar da sua capacidade julgadora. Mas a verdade é que o seu despacho decisório está perfeitamente sustentado, e o que fica claro é a total incapacidade e incompetência do Ministério Público, a quem o juiz não poupou nas palavras. Nunca se terá ouvido um juiz tão cáustico para este órgão de investigação da Justiça Portuguesa.
Acabou por acontecer o que mais se temia. Temia-se acima de tudo que o Ministério Público não conseguisse blindar a investigação, e produzir uma acusação à prova de bala. E assim foi!
Todos tínhamos a sensação de um Ministério Público mal servido de meios, e particularmente de competência técnica, mas também julgávamos que, dado que estava em causa neste caso, e a sua relevância para a Justiça e para o país, e o tempo gasto na investigação, teria puxado dos galões e envolvido os melhores e os mais competentes recursos de que dispõe. Não foi assim, e deu o golpe final na sua credibilidade.
Bem pode agora recorrer. Arrasado por Ivo Rosa - que bem poderia ter evitado adjectivos que o próprio Sócrates usou até à exaustão, como fantasioso, e essa será a maior crítica a fazer-lhe - não se está a ver por onde possa sustentar o recurso.
Sócrates é o que é, e não deixará de ser o que é, aconteça o que acontecer a partir de agora. Já à Justiça, e em particular ao Ministério Público, exige-se que deixe ser o que é. E que sirva para servir o país e a democracia portuguesa!
Não estou a inverter nada. Não foi o Ministério Público que cometeu os crimes, foi Sócrates. Nem foi o Ministério Público que inventou as acusações. Mas foi o Ministério Público que não blindou a investigação, que permitiu, e porventura até terá promovido, fugas de informação e que foi irresponsavelmente negligente na sua incompetência.
Sócrates já foi julgado pela opinião pública, e já pouco importa o que vai fazer a Tribunal, quando for. Ou o que o Tribunal decida, quando decidir. O Minsitério Público não vai a julgamento, mas está, como nunca esteve, sob julgamento de todos nós.
A ASAE chegou a uma livraria dos Olivais e apreendeu um livro. O único exemplar disponível do "Gémeas marotas", um livro publicado nos anos 1970 e reeditado em 2012, de autor desconhecido que assina pelo pseudónimo de Brick Duna, que contas estórias eróticas de duas gémeas - "marotas", já se vê .
Tem inegáveis semelhanças gráficas com os livros da coelhinha Miffy, do holandês Dick Bruna - cujo nome é também puxado para o pseudónimo, como é de evidente e óbvia prova -, e é por isso confundível à vista com um livro infantil. No entanto, na livraria onde foi apreendido o seu exemplar único estava, como, contam outros livreiros, sempre esteve ao longo dos anos em que o tiveram à venda, na secção para adultos, longe portanto do acesso a crianças.
Perante o que pareceria o mais estúpido acto de censura, a acção da ASAE aparece a ser justificada por questões de direitos de autor, justificação não menos estúpida. Se apreender por acto de censura um exemplar único de um livro publicado há quase 50 anos é absurdo; não o é menos admitir que o holandês, falecido há dois anos, ou quem o representa, demorasse 50 anos a perceber que alguém lhe estava a violar direitos de autor. A própria editora do holandês veio já negar qualquer iniciativa desse tipo, até porque simplesmente desconhecia a existência do livro em causa.
Diz-se agora que a iniciativa foi do Ministério Público ... E que isto acontece semanas depois do padre Gonçalo Portocarrero de Almada, em acção missionária permanente no Observador, a propósito de nada que viesse a propósito, ter dado expressão à sua revolta contra as "gémeas marotas". Provavelmente com a autoridade de quem nasceu na Holanda, e apoquentado com os direitos de autor de um cidadão holandês... Ou simplesmente um maroto como outros!
Na acusação do Ministério Público no chamado caso e-toupeira, diz-se que a SAD do Benfica tirou proveito (também desportivo, mas isso é a brincar às acusações) da informação sobre os inquéritos em curso, que lhe permitiu antecipar-se às operações judiciais desenvolvidas. Que me lembre, em todas as buscas efectuadas, os fotógrafos, as câmaras e os repórteres do Correio da Manhã e da SIC chegaram sempre primeiro que a polícia.
Das três, uma: ou foi o Benfica a avisá-los da busca e, assim, a desbroncar-se; ou eram as mesmas toupeiras a dar-lhes a mesma informação; ou, finalmente, as toupeiras são como os chapéus. Há muitas!
Se não é preciso ser-se muito dotado de neurónios para aferir da baixa probabilidade das duas primeiras, resta a terceira. Como estamos fartos de saber e, há muito tempo, o Correio da Manhã é a própria prova.
Precisamos é de mais uns milhões de neurónios para perceber por que é que o Ministério Público nunca se preocupou com todas essas muitas toupeiras...
Era um dos muitos processos envolvidos na mega fraude do BPN, e aquele que mais publicamente expusera o comendador, ex-ministro e ex-conselheiro de Estado (tudo obra de Cavaco Silva, como se sabe, há bem pouco abençoada por Passos Coelho, como também se sabe), responsável pelo desaparecimento de milhões de euros do BPN/SLN, envolvendo a venda de uma sociedade (REDAL) em Marrocos, e a aquisição de uma participação numa outra de Porto Rico (Biometrics).
O Ministério Público deu como provado tratar-de uma engenharia financeira extremamente complexa, de decisões e práticas de gestão que suscitaram suspeitas sérias sobre os reais fundamentos dos negócios, que envolveram pagamento de comissões não justificadas, tudo com a subtracção de milhões de euros ao BPN, aravés de crédito concedido a sociedades instrumentais ou de capital para a Biometrics.
Nada disso, no entanto, é suficiente para produzir acusação. No despacho de arquivamento, o Ministério Público garante não ter sido possível identificar, "de forma conclusiva, todos os factos suscetíveis de integrar os crimes imputados aos arguidos".
O cidadão comum olha para isto e percebe que o Ministério Público é muito competente. Tão competente que é capaz de perceber, decifrar e até provar complexas engenharias financeiras, de descobrir burlas, burlões e comissões. Até pode perceber que, depois, não consiga provar "de forma conclusiva todos os factos". Mas, nem um? Nem um único facto que sustente uma única acusação, de um único crime?
Ricardo Salgado saiu do tribunal sujeito prisão domiciliária, ficando em casa vigiado por dois polícias. Há exactamente uma ano também foi ouvido em tribunal. Então levado pela polícia, detido para apresentação em tribunal. Então, a medida de coação foi uma caução de 3 milhões de euros...
Desta vez a caução seria um grande embaraço. Donde viria o dinheiro, com as contas supostamente congeladas e todos os bens arrestados?
Alguma coisa teria de ficar à mostra. Daí a prisão domiciliária, mas sem o estigma da pulseira electrónica...
Estranho?
Mas estranho é que, há um ano, em pleno centro da crise BES/GES, Ricardo Salgado foi ouvido e sujeito à prestação da tal caução no âmbito do processo Montebranco. E que, num ano, não haja qualquer percepção de que alguma coisa tenha avançado...
Mais estranho é que um ano depois do colapso do BES, e seis meses depois de uma comissão parlamentar de inquérito ter tornado público o que tornou, a Justiça não tenha incomodado Ricardo Salgado. Estranho é que tenha acabado de ser interrogado pelo tribunal, não por iniciativa do Ministério Público, mas por processos movidos por terceiros, lesados evidentemente.
Mais estranho ainda é que, um ano depois, quando num país a sério os culpados estavam encontrados e condenados, do MInistério Público não se conheça sequer uma iniciativa. Estranho é que quando há milhares de portugueses lesados, roubados pelo BES e enganados pelo Banco de Portugal, o Ministério Público faça de conta que não ouve, não lê e não vê. Provavelmente para esconder a falta de meios para investigar...
Mas ainda mais estranho é que se diga que vivemos num Estado de Direito!
Quando meio país está a banhos e a outra metade a arder, os agentes de topo da nossa Justiça resolveram brindar-nos com um sem número de preciosidades. Provavelmente dispostos a mostrarem-nos que aquela história das férias judiciais não passa de um treta, e que mesmo quando todo o país está em férias eles aí estão, sempre no activo. Mais activos do que nunca!
Pena é que gente tão dinâmica, pró activa e qualificada tenha canalizado toda a sua energia para uma guerra civil que o país bem dispensava. Se tivessem colocado toda essa vasta gama de recursos consistentemente ao serviço dos superiores valores da Justiça, e em particular dos da investigação, não teríamos tantos e tantos casos que nos envergonham. Aos nosso olhos e aos do mundo… Sim, porque Maddie e Freeport, entre outros, levaram a nossa vergonha para além fronteiras. Envergonham-nos por essa Europa e por esse mundo fora!
O Procurador Geral da República (PGR) é o superior hierárquico dos procuradores do Ministério Público. Está no topo de uma hierarquia que ele próprio designa de “simulacro de hierarquia”, naquela sua célebre alusão à Rainha de Inglaterra.
Porquê? Porque a hierarquia está nessa aberração sindical. Quem manda no Ministério Público é o respectivo Sindicato. Que desrespeita, desautoriza, desafia e mina o PGR.
O principal responsável pelo que se passa no Ministério Público é o PGR. Uma responsabilidade formal mas que não se efectiva a partir de uma autoridade exercida.
Porquê? Por falta de poderes, conforme reclamava o PGR?
Não sei nem faço a mínima ideia se ao PGR faltam poderes. Mas parece-me que lhe falta coragem para utilizar os que tem. Para que quer mais poderes se não tem coragem para usar os que tem?
Esta guerra entre o Ministério Público (MP) e o PGR não é a dimensão pública de divergências ocasionais. Não é uma discussão pontual. É uma guerra civil entre um MP entrincheirado num inaceitável sindicato (para quando um sindicato dos deputados? E dos ministros?) e um PGR refém da falta de coragem política há muito instalada no país, que se verga a todos os corporativismos que lhe surjam pela frente.
Esta é uma guerra que, como os incêndios que foi deixando para segundo plano, vai destruindo o país consumindo-lhe as últimas réstias de esperança. Esta é uma guerra que permite notícias como esta do Expresso desta semana: Cândida Almeida negociou com os procuradores que queriam ouvir o primeiro-ministro – eles não levariam por diante essa ideia e, em troca, poderiam juntar as tais listas de perguntas por fazer ao despacho de arquivamento.
E nisto não se sabe para que serve o ministro da Justiça. Melhor, sabe-se que não serve para nada! É que, com tudo isto, o processo Freeport retirou ao governo toda e qualquer capacidade de intervenção na Justiça. Que continua a alimentar o lume brando em que o vai continuando a fritar. Irremediavelmente!
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