Aconteceu no fim-de-semana, apenas ao fim do dia de ontem foi conhecido, e é hoje notícia do dia. Juan Carlos, o ainda rei emérito de Espanha, partiu para o exílio. Saiu do país pela porta pequena. Não, não tem a ver por onde saiu - pelos vistos pela Galiza, com passagem pelo Porto - mas pela forma como saiu. Com o rabinho entre as pernas...
A imprensa hoje entretém-se a adivinhar o seu destino. Não se percebe onde esteja o interesse, mas é assim. Há gente para quem é mais importante saber o destino que a origem. E não é por qualquer razão filosófica que possa defender que o que importa é onde se chega, não de onde se parte. Também não tem a ver com os fins a justificar os meios, porque aqui só há princípios e fins.
Na circunstância concreta do monarca, bons princípios a que faltaram princípios para bons fins. A princípio correu bem. Subiu ao trono na agonia do franquismo, assegurou a transição para a democracia e assegurou a impossível unidade nacional espanhola. Depois é que veio o diabo. Vestido de mulher, como tanta vez. E começou a faltar-lhe em princípios o que passou a sobrar-lhe em caça grossa...
Não importa para onde seguiu. Até porque reinará para onde quer que vá. E, como já há cinco séculos dizia John Milton, reinavam por cá os Felipes, é melhor reinar no inferno do que servir no céu!
O Rei Juan Carlos abdicou da coroa espanhola em favor do seu filho, Felipe. É a vantagem da monarquia. Noutro regime, dois anos depois daquela caçada aos elefantes em que acabou caçado, tinha-se simplesmente demitido!
Por cá, como não temos rei, ninguém abdica. Nem se demite. Está tudo Seguro...
Assinala-se hoje mais um aniversário do regicídio de 1 de Fevereiro de 1908, data que, mais que o agora descartado 5 de Outubro, vem nos últimos tempos sendo aproveitada para iniciativas – se não cada vez mais convincentes, cada vez mais convencidas – de exaltação monárquica.
Os ventos correm-lhe, de resto, de feição: uma democracia cada vez menos democrática, cada vez mais degradada, a gravíssima crise social que o país atravessa, a crise institucional, a crise de valores, de ética e de moral e, the last but not the least, um presidente que caiu no fundo… Tudo a convergir num ciclone que empurra como nunca as ideias monárquicas!
Dentro dessa linha surge hoje o manifesto “Instaurar a Democracia, Restaurar a Monarquia” subscrito por 18 ilustres monárquicos, entre os quais gente que me merece o maior respeito e admiração como, por exemplo, Gonçalo Ribeiro Teles - o primeiro subscritor - ou Miguel Esteves Cardoso. Ali dão conta do “preocupante enfraquecer das estruturas democráticas”, da “visível delapidação dos valores morais na política”, do “estado caótico da nossa justiça”, e da “ameaça de perda de soberania”, tudo problemas que a simples entrega da chefia do Estado a um rei resolveria. Um rei que, no seu entendimento, tem uma legitimidade inquestionável: a legitimidade de quem é “eleito pela história”!
Os monárquicos entendem que nós não temos que eleger qualquer chefe de Estado. Isso cabe à história!
A mim custa-me ver pessoas que admiro e respeito defender este tipo de coisas. Mas parece-me que seria bem mais compreensivo se visse que o seu putativo rei, o tal eleito pela história, era uma personalidade de uma dimensão superior, um personagem de uma craveira única, de uma dimensão humana e intelectual verdadeiramente digna da missão histórica que o trouxe ao mundo. Mas, dizem eles, esta missão caberia a D. Duarte de Bragança, “único e legítimo pretendente ao trono português”…
É por isso que, mesmo com chefes de Estado que não mereçam o meu voto – como já tantas vezes aconteceu -, mesmo sendo o mais crítico dos críticos do actual Presidente da República, prefiro sempre um chefe de Estado eleito por mim e pelos meus concidadãos a um determinado por uma consanguinidade qualquer. Ou eleitopela história, como eles dizem!
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