No regresso ao campeonato, a meio da eliminatória da Champions com o Barcelona, na recepção ao Nacional, em dia de votação dos Estatutos, e noite chuvosa, o Benfica deu continuidade às boas exibições com que tem vindo a brindar os adeptos do futebol.
Se não foi uma primeira parte de luxo, andou lá perto. Pressão alta, rápida recuperação da bola, boa circulação, jogo associativo, a um ou dois passes, muita criatividade, repentismo, e lances de rotura. Faltaram golos à exibição, como vem sendo habitual.
Logo na abertura do jogo o Benfica construiu a primeira oportunidade para marcar. Assistido em desmarcação pelo miúdo Leandro Santos - uma das seis novidades no onze -, Bruma rematou, mas o guarda-redes do Nacional, Lucas França, querendo desde logo dizer ao que vinha - e vinha para para manter a sequência de grandes exibições dos guarda-redes adversários na Luz - defendeu para canto. Aos cinco minutos marcava: Samuel Dahl interceptou uma bola suja, pela pressão benfiquista, do guarda-redes, e serviu Zeki Amdouni, para um tiro de pé esquerdo, sem hipóteses de defesa.
Pouco depois, ainda antes dos 20 minutos, Zé Vítor faz penálti sobre Belotti. O árbitro, André Narciso, assinalou de imediato, mas o VAR chamou-o ao monitor, não se sabe bem por quê. O penálti seria confirmado, e convertido com mestria por Kokçu.
A partir daí o Benfica baixou a pressão, o Nacional começou a mostrar que também sabe jogar à bola, e o jogo, já sem ser de sentido único, continuou interessante e bonito como espectáculo. A posse de bola passou a ser dividida, mas as situações de golo apenas aconteciam na baliza da equipa insular. Desta vez não tanto desperdiçadas como nos últimos jogos.
Dos 11 remates do Benfica, apenas um, já no fim da primeira parte, não foi enquadrado com a baliza. Foi o remate do Leandro Santos, que saiu a rasar a barra, provavelmente por, depois de tantas defesas impossíveis do Lucas França, lhe ter dado a força e a colocação que o tornasse indefensável.
Aconteceu - esse único remate desenquadrado - logo a seguir ao primeiro do Nacional. Na cobrança de um livre a meio campo, com a bola a sair muito ao lado do poste esquerdo de Samuel, de novo dono da baliza. Foi tudo o que o Nacional fez.
E no entanto acabou por ter a oportunidade de sair para o intervalo com o resultado na margem mínima. Já no período de compensação, de repente, demos pelo jogo interrompido. Percebeu-se que ali havia ... VAR. E houve penálti, de António Silva, descortinado pelo VAR. De todo desnecessário, o rapaz anda com azar... Não fosse a grande defesa do Samuel (na foto) e, depois de uma dúzia de oportunidades de golo criadas, o Benfica teria entrado na segunda parte pressionado pelo resultado.
Que se iniciou na mesma toada, com o Benfica a jogar bem e a criar situações para marcar. Depois de um belo lance individual de Amdouni, Bruma recebeu a bola pela esquerda e disparou ... ao poste, mesmo no ângulo com a barra. Um grande remate que merecia ter acabado em golo, e que poderia ter mudado o destino da exibição de Bruma, dando-lhe a confiança que claramente lhe faltou durante todo o jogo, acabando substituído por Schjelderup, a 10 minutos do fim.
Logo a seguir o defesa Djibril Soumaré, já amarelado, fez falta sobre Bruma que se ia isolar. Deveria ter-lhe sido mostrado o segundo amarelo, mas não foi. Imediatamente a seguir, Dahl, com um grande remate (de pé direito!), mete a bola na baliza. Golo anulado, por a bola ter vindo de um ressalto em Bruma, em posição de fora de jogo.
Interrompeu-se aqui, por volta do oitavo minuto da segunda parte, o domínio claro do Benfica. Primeiro, durante perto de 10 minutos, com o Nacional a tomar conta da bola, e a colocar-se por cima do jogo, criando então a única clara situação de golo (para além da do penálti), com um avançado da equipa da Choupana, desequilibrado, a falhar a emenda para a baliza. Depois, com o jogo a partir-se.
Durante 15 minutos, que acabaram com as quatro substituições a que Bruno Lage lançou mão, a meio da segunda parte, o Benfica não deteve o controlo e o domínio absoluto do jogo.
As entradas de Leandro Barreiro, Aktürkoğlu, Renato Sanches, e Pavlidis (para as saídas de Belotti, que não fez um mau jogo, mas continua sem convencer; Kokçu, já esgotado, Dahl, que continua em bom nível e Amdouni, o melhor em campo (mesmo com o guarda-redes do Nacional a defender o que defendeu), trouxeram de volta o Benfica ao domínio do jogo.
Até ao fim, o guarda-redes do Nacional ainda negou outro golo, desta vez a Leandro Barreiro, e Pavlidis desperdiçou mais uma excelente jogada, antes de marcar o terceiro, já ao minuto 90, em novo penálti. Novamente a partir da intervenção do VAR.
No fim, ficou mais um jogo em que o resultado foi demasiado curto para o futebol jogado, e para as oportunidades de golo criadas. Mas ficou mais: ficou a consolidação da estratégia de rotação de Bruno Lage. Hoje o Benfica tem um plantel apto para enfrentar esta fase decisiva da época.
Bruno Lage roda jogadores e a equipa continua a jogar bem. E jogar bem continua a ser a melhor forma de aumentar a probabilidade de ganhar!
Contra o que era dado por expectável, o jogo da Choupana, relativo à oitava jornada, lá se realizou. Era tido por certo que o nevoeiro - que neste século já obrigou a interromper e adiar 17 jogos - voltaria a aparecer. Àquela hora, às 17 para que o jogo foi marcado, a mesma a que se iniciara o jogo a 6 de Outubro, é inevitável.
Apareceu, e chegou a ser ameaçador, à medida que o intervalo se aproximava. O intervalo e o anoitecer afastou-o, e ainda bem.
Mais de dois meses e meio depois, o jogo foi retomado com um lançamento de linha lateral a favor da equipa do Nacional. É estranho ver um jogo começar desta forma, e nunca um lançamento lateral terá certamente sido tão treinado.
Talvez por isso, por ter sido tão preparado, este acabou por ser o único momento do jogo em que o Nacional teve presença no meio campo defensivo do Benfica. Passados esses dois ou três minutos o Benfica tomou conta do jogo, e nunca mais o largou.
Com aquele que é o onze inicial de eleição de Bruno Lage, o Benfica tomou conta do jogo, e começou a criar oportunidades de golo umas atrás das outras. Golos, é que nada. Porque o guarda-redes "nacionalista", o brasileiro Lucas França, defendia tudo. Mas também porque Pavlidis e Akturkoglu estão muito longe da forma que apresentavam há dois meses.
Não quer isso dizer que o Benfica tenha realizado uma grande exibição, daquelas de encher o olho. Não, nem isso é nesta altura possível. Porque não são apenas aqueles dois que atravessam dificuldades, esses são os que lá estão, no sítio onde se tem de marcar os golos. Há muitos mais jogadores que não passam pela melhor condição. Quer apenas dizer que o Benfica ganhou sem qualquer espécie de reticências, sem tremideiras e sem nunca deixar de ter o jogo completamente sob controlo.
E quer dizer que o que se passou na Vila das Aves, no passado domingo, e que impediu o Benfica de ser hoje o líder da classificação, ficou para trás. Foi um acidente.
O Benfica entrou com pressa no jogo, e esse foi o primeiro sinal disso mesmo. Na verdade não dispunha de muito tempo: oito minutos já tinham desaparecido no nevoeiro de 6 de Outubro, e o que se esperava para hoje poderia surgir a qualquer instante, e acabar com o tempo que faltava.
O aproximar do intervalo e do nevoeiro, o adiar do golo pelo tal Lucas França - com três defesas impossíveis, a remates de Akturkoglu (por duas vezes) e Otamendi - e a degradação do estado do relvado, poderiam ter complicado as coisas.
O início da segunda parte acrescentaria os ferros da baliza do Nacional a estas contrariedades. Com o guarda-redes batido, foi a trave a devolver o remate de Kokçu. Só o nevoeiro era boa notícia, finalmente a dar sinais que o jogo poderia ser disputado até ao fim.
À passagem do quarto de hora um defesa do Nacional cortou com a mão uma bola rematada por Di Maria, e desta vez, ao contrário do que sucedera na primeira parte (até o gesto de esconder a mão atrás das costas, depois de ter sido usada para cortar a bola, é igual), o árbitro e o VAR não puderam deixar de ver. Di Maria converteu o penálti - à sua maneira, com a classe do costume - no primeiro golo, e o assunto ficou resolvido. Desta vez ficou mesmo resolvido!
O Benfica nunca permitiu qualquer tipo de chance ao adversário. Di Maria voltou a marcar, menos de um quarto de hora depois, já com Amdouni em campo, no lugar de Pavlidis. A bola voltou a bater nos ferros da baliza do Nacional, o seu guarda-redes continuou a defender o que lhe aparecia e, no fim, o resultado acabou por ser melhor a coisa que aconteceu à equipa madeirense.
Ao Benfica, e apesar do escasso resultado, as coisas acabaram por não correr mal. Nada que, no entanto, limpe a estrutura do Benfica neste processo. O jogo podia e devia ter-se realizado naquele dia 6 de Outubro. E era isso, e apenas isso, que competia à estrutura do Benfica aceitar.
No dia da festa do Sporting - e impõe-se desde já dar os parabéns à lagartagem, e muito especialmente aos meus amigos sportinguistas, que são muitos, e muitos muito amigos mesmo - o Benfica pareceu querer dar-nos mais uma tristeza. E deu, mesmo que no fim a vitória na Madeira a disfarce um bocadinho. A tristeza de mais um jogo pobre, de muito desacerto e de pouca inspiração não é apagada pelo resultado.
Jorge Jesus escalou um onze com seis alterações em relação ao último jogo, com o Porto, de má memória. Duas - Diogo Gonçalves, suspenso por acumulação de amarelos, e Rafa, por obra e graça de Pepe - inevitáveis, as restantes, vá lá saber-se porquê... E a equipa, que já não é famosa, ressentiu-se disso. Gilberto, Pedrinho, Chiquinho, Cervi, Waldschmidt e mesmo Nuno Tavares, não estiveram à altura. Mas a verdade é que, à excepção de Helton Leite, que claramente evitou o pior, e de Lucas Veríssimo, os restantes também não, mesmo que se tenha de reconhecer que, em tamanha minoria, também não seria fácil fazerem muito melhor.
A primeira parte foi uma lástima. Para além das investidas de Riasco, a deixar Gilberto de rastos, pouco mais há para dizer. Os jogadores do Benfica viam os do Nacional correr, e esmeravam-se a falhar passes. Remates, nem vê-los. E oportunidades de golo só para a equipa da Madeira. Do lado do Benfica apenas duas aproximações à baliza adversária, uma concluída com remate de cabeça de Seferovic por cima da barra, e outra em que o ponta de lança suíço voltou a trocar os pés sem sequer tocar na bola, quando tinha tudo para fazer o golo.
Mau de mais, mais uma vez.
Ao intervalo o mister emendou a mão, e lançou Grimaldo, Pizzi e Everton. E apesar de ter sido o Nacional, logo no arranque, a voltar a ameaçar a baliza de Helton, cedo se percebeu que o Benfica metia mais velocidade no jogo, e que as coisas poderiam mudar de rumo. A equipa passou então a mandar no jogo, mas logo voltou o VAR a entrar em cena. Uma autêntica maldição.
Fruto da superioridade que finalmente tinha no jogo, o Benfica chegou ao golo, por Nuno Tavares. Mas lá estava o VAR para o anular. Desta vez o pretexto foi uma falta de Lucas Veríssimo, numa disputa de bola, para aí um minuto antes, em que fora ele o primeiro a sofrer falta. Depois, pouco depois, em cumprimento da lei máxima desta liga, foi mais um penalti que ficou por assinalar, quando um defesa do Nacional jogou a bola dentro da área com as duas mãos. Não percebíamos como nem o árbitro nem o VAR tinham visto, mas logo os senhores da Sport TV nos elucidaram. Pelo que explicaram ficamos a perceber que, jogar a bola com a mão, ou até com as duas, como foi o caso, já não é penalti. Só é penalti se o movimento dos braços aumentar a volumetria. Se um defesa blocar a bola, como um guarda-redes, não é penalti. Que bom é ter estas explicações dos senhores da Sport TV!
Entretanto entrava-se no último quarto de hora jogo, e a relativa qualidade daqueles vinte e tal minutos começava a desaparecer. Voltavam os passes errados, e o treinador do Nacional começava a lançar jogadores rápidos para o ataque, acreditando que, com o Benfica mandado para a frente, mas já fora do seu melhor período, teria chegado a hora de dar o golpe final no resultado.
Era este o cenário quando, aos 78 minutos, já com Darwin e Gonçalo Ramos em campo, chegou o golo do empate. Seferovic, sozinho em frente ao guarda redes, ia falhar mais um golo, com um remate para fora, só que o defesa do Nacional que tinha marcado o golo na primeira parte, ao tentar o corte, desviou-lhe o sentido para dentro da baliza.
Só podia ser assim. Assim ... ou com Gonçalo Ramos. Dois minutos depois, lá estava o miúdo, no sítio certo, a rematar de primeira, e com classe, para o golo, a passe de Darwin. Cinco minutos depois, repetiu. Sem o mesmo brilhantismo, mas com a mesma eficácia. A lembrar a toda a gente existe, que está lá, e que merece jogar bem mais.
Mérito de Gonçalo Ramos, o homem do jogo? Não, nada disso. Mérito do mister. Que o meteu a jogar, e que, antes de o fazer entrar, lhe explicou que movimentos tinha de fazer. Mérito de Jorge Jesus, pois claro. Sem qualquer responsabilidade nesta época miserável, em que tudo é culpa da covid, como é que poderia não ser?
Estávamos preparados para uma certa condescendência para com a exibição do Benfica nesta recepção ao Nacional, que não aceitara adiar o jogo, ao contrário do que, em condições que nada tinham a ver com as que o Benfica atravessa, com mais de uma equipa de jogadores impedidos por covid, tinha já aceitado, como fora o caso do jogo com o Guimarães, na altura com seis jogadores do plantel impedidos pelas mesmas razões. Condescendência com a equipa, que não com a estrutura, que pura e simplesmente assiste, impávida, a tudo o que se está a passar neste momento do futebol nacional.
Mas até essa condescendência com a equipa desapareceu de repente. A equipa entrou no jogo a dizer-nos que não era preciso, que não havia razões para termos pena. Nem receios.
Atacou o jogo como se nada se estivesse a passar. Como se não tivesse que estar a jogar com o terceiro guarda-redes, nem sem qualquer titular na defesa. A equipa movimentava-se e jogava bem. Jogadores antes apagados, como Chiquinho, brilhavam nas alturas. Logo aos sete minutos chegou ao golo, numa fantástica jogada de futebol, concluído com classe justamente por Chiquinho.
Seria anulado. Por 17 centímetros de fora de jogo do João Ferreira, no início da jogada, disseram eles. Nada que abalasse a equipa, e cinco ou seis minutos depois, lá estava Chiquinho de novo, agora de cabeça. E agora a valer.
O futebol que a equipa apresentava era de boa qualidade, e grande movimentação, competitivo e pressionante. Trazia até à memória aqueles 10-0 da última visita da equipa madeirense. Saltava no entanto à vista um problema: em toda aquela avalanche de futebol não havia avançados. Eram os médios e os laterais que alimentavam aquele turbilhão. Seferovic e Darwin andavam lá, mas não estavam lá. Nada daquilo passava por eles.
Ora, com aquela equipa de recurso, jogar com nove, era impossível. Percebia-se isso já quando as coisas ainda estavam a correr bem. Confirmou-se logo que se esgotou o primeiro quarto de hora. Com uma excepção ou outra, esta época o Benfica tem jogado apenas uma parte do jogo. A primeira, numas vezes, a segunda noutras. Hoje também jogou apenas uma, só que foi a primeira terça parte da primeira.
O descalabro começou mesmo quando foi preciso chamar os avançados ao jogo. Não seguraram uma bola, perdiam-na de imediato. Um problema técnico básico - recepção. Logo a seguir, veio o do passe. Recepção e passe, as chaves mestras do futebol, começaram a falhar e nunca mais foram reparadas.
Foi assim até ao fim do jogo. Logo no arranque da segunda parte o Nacional empatou, na sequência de ... um canto. Pois claro. O costume.
Faltava jogar quase toda a segunda parte, mas percebia-se que só mais um milagre evitaria nova escorregadela. Esteve para acontecer por duas vezes, mas não aconteceu. Primeiro, pouco depois do golo do empate, num penalti, mais um, que árbitro e VAR não quiseram assinalar. Sim, um penalti a favor do Benfica neste campeonato é um verdadeiro milagre. Em quinze jogos ainda não aconteceu nenhum. E depois, já na parte final do jogo, quando Taarabt furou por ali dentro e deu o golo a Seferovic. Mas aí eram precisos dois milagres. O internacional marroquino conseguiu o de bater a defesa do Nacional. Era preciso ainda outro para que Seferovic, que mais pareceu sempre um defesa adversário que um avançado, hoje, no dia em que passam 17 anos sobre a morte de Feher, e 79 sobre o nascimento de Eusébio, fizesse um golo. E dois era de mais!
É certo que o árbitro Rui Costa usou sempre de critérios diferentes para assinalar e punir as faltas, e que de penaltis estamos conversados. Isso conta. Pesa, mas não justifica a forma como a equipa entregou o jogo e o resultado. Nem o desaparecimento da famosa estrutura quando a equipa mais precisa dela.
Não se adivinhava fácil este jogo de hoje na Luz, engalanada para comemorar o 60º aniversário do nosso mágico, o inesquecível Chalana, a passar mais uma vez por momentos difíceis. Como tanto lhe tem acontecido…
Pelo adversário, o inconstante Nacional de Costinha, capaz do melhor – pôs Alvalade em sentido quando o Sporting respirava os melhores ares do arranque de Keizer, e assustou o Dragão, apesar de tudo - e do pior, reflectido na defesa mais batida da competição, o que leva sempre a desconfiar, mas por si próprio. Pela euforia que indesmentivelmente se sente nos adeptos à volta da equipa e porque, se até agora o desafio era não perder terreno para a frente, agora era o da aproximação decisiva, do penúltimo ataque ao primeiro lugar da Liga, há muito dado por irreversivelmente utópico.
Depois de irrepreensivelmente cumpridos os desafios do início da segunda volta, os tais testes dados por inultrapassáveis por Bruno Lage, este era mais um desafio, mas agora à maturidade competitiva da equipa. Vencida a batalha exibicional, agora era a batalha da consistência competitiva, o velho chavão do estofo, introduzido no léxico da bola há umas décadas pelo mentor da guerra norte/sul. No futebol, e não só…
Pode parecer despropositado começar com esta introdução para escrever sobre um jogo que acabou em 10-0, um resultado invulgar, verdadeiramente excepcional. Histórico!
Não me parece. A envolvência era aquela, e os desafios estavam lá, e eram aqueles. E a resposta foi esta, a confirmar o estofo desta equipa que está a praticar um futebol de sonho. Perfeita, com uma exibição de luxo, coroada com 10 golos. Dez. Do número da gloriosa camisola de Fernando Chalana!
Um resultado de 10-0 não se explica. Saboreia-se. Desfruta-se, responsavelmente. E com humildade. E com respeito, muito respeito pelo adversário. Como o Benfica fez, como fizeram os jogadores e o treinador. A exibição sim, essa explica-se. E explica-se pelo que o Benfica tem vindo a fazer, pelo extraordinário crescimento da qualidade de jogo em apenas um mês. Pela qualidade de jogadores fantásticos que, há um mês, não passavam de jogadores banais, perdidos em campo sem saber o que fazer, incapazes de correr, ou sequer de saber para onde correr. Se pudessem...
Poderá dizer-se que um golo na bola de saída, aos trinta e poucos segundos, ajuda. Sem dúvida nenhuma que é melhor começar o jogo a ganhar que a perder. Mas todos nos lembramos que, há muito pouco tempo, também o Benfica entrou a ganhar no jogo com o Moreirense, na Luz. E do que se seguiu…
O golo no pontapé de saída, que começou a ser construído a partir da defesa, não foi um incidente do jogo. Foi a afirmação da qualidade do jogo que está implementada, da vontade da equipa em iniciar o seu trabalho logo ao primeiro segundo, e da consciência do que estava em jogo, conforme aquela introdução inicial, não tão despropositada quanto poderia parecer.
A partir daí tudo foi fácil. Fácil e muito bonito, porque são as coisas fáceis que fazem o futebol bonito. Ora em jogadas envolventes, com requintes técnicos de arregalar, pela direita, pela esquerda ou pelo centro; ora em passes a rasgar a estrutura defensiva adversária a solicitar desmarcações de laboratório; ora em lances de bola parada, que agora dão golo, ou muito perto disso. Sempre assim, 90 minutos assim…As oportunidades de golo sucederam-se a um ritmo alucinante. E os golos a metade desse ritmo: Grimaldo, Seferovic (duas vezes), João Félix, Pizzi, Ferro, na estreia a titular, Rúben Dias, Jonas (também por duas vezes), no regresso à equipa, e Rafa…
E aí está, a um ponto do primeiro lugar. Há um mês eram sete!
A reconquista de 2014 começou com onze Eusébios. A de 2019 arrancou com 10 Chalanas… Porque o Odysseas, que até garantiu o zero, não tem o número 1. Se o tivesse, o seu 1, como 0 que garantiu, também dava 10!
O Benfica encerrou hoje o primeiro ciclo da época, um ciclo decisivo com oito jogos de alta exigência - distribuídos em partes iguais entre o objectivo inegociável do apuramento para a Champions e objectivo central de não deixar fugir qualquer dos adversários no campeonato - em pleno centro do furacão do mercado de transferências. Sabendo que este era um ciclo decisivo, os do costume não pouparam nas encomendas para fazer dele um inferno.
Hoje, na Choupana, o Benfica deu a última resposta que, com brilhantismo, fechou este ciclo. Uma resposta à altura, "dado o contexto", para recuperar a frase da moda num dos rivais, que vai vivendo precisamente de um contexto que já é mais pouca vergonha que outra coisa qualquer.
E o contexto do Benfica são 8 jogos em pouco mais de três semanas, com os mesmos jogadores, e todos eles em ambiente de grande responsabilidade e intensidade, exibindo em todos eles uma superioridade tão flagante quanto o desperdício de golos. Dentro deste contexto, dois fazedores de golos - um deles mesmo mestre dos golos - lesionados e um terceiro equivocado.
Passados que foram os primeiros minutos, com os jogadores do Nacional a correr e a discutir cada bola como se não houvesse amanhã, o Benfica tomou conta do jogo e desatou a criar oportunidades de golo. Tantas que, quando Seferovic - que já parece a grande contratação do fecho do mercado - com grande mérito, assistido por Salvio, fez o primeiro golo, e foi ainda antes da meia hora de jogo, já se dizia mal da vida. E de Seferovic. E da aposta de Rui Vitória, outra vez!
E quando, às portas do intervalo, Salvio, assistido por Seferovic, fez o segundo já o Benfica devia ao jogo cinco ou seis golos.
O Benfica entrou para a segunda parte com a mesma disposição, criando fácil e rapidamente mais oportunidades de golo. Depois terá pensado que era tempo de abrandar e descansar um pouco, que a vida não tinha sido fácil. O Nacional teve então oportunidade de pôr no campo aquele seu futebol de segunda divisão, que tentara logo à entrada do jogo. E durante cerca de 10 minutos, ali à volta da hora de jogo, viu-se a equipa madeirense por cima, com o Benfica, sem Fejsa, que saira lesionado logo na altura do primeiro golo e que faz sempre muitas falta, e mais ainda naquele contexto de jogo, a dar a ideia que aquilo estava a acontecer porque grande parte dos jogadores tinha rebentado. E Rui Vitória estava a atrasar as duas substituições disponíveis...
Bastou uma substituição (Cervi, claramente esgotado física e mentalmente, por Rafa), aos 70 minutos, para acabar com aqueles 10 minutos pouco brilhantes do Benfica. Até porque Salvio, que parecia já não poder mais, ressurgiu e retomou o brilhantismo da sua fantástica exibição de hoje. E Grimaldo resolveu vingar-se das duas ou três rabetas do 7 do Nacional para retomar o nível, e fechar no terceiro golo uma estupenda jogada de futebol que ele próprio iniciara.
E foram afinal os jogadores do Nacional que acabaram por rebentar naqueles 10 minutos em que a equipa do Funchal levantou a cabeça. E a parte final do jogo deu para mais uns minutos a João Felix. E para o excelente golo do Rafa, a fixar o resultado na chapa 4, pela segunda vez na semana...
E no fim pode dizer-se que Seferovic é uma aposta ganha por Rui Vitória. Não sei é se se pode dizer o mesmo do modelo de jogo que lhe dá razão. Mas isso ver-se-á lá mais para frente. Noutros ciclos, que este está ganho. Com distinção!
Pela primeira vez neste campeonato a Luz contou menos de 50 mil espectadores. Em regra as assistências têm andado pelos 60 mil, mas este é também o preço da oscilação que afectou a equipa nas duas últimas semanas. Mesmo assim nada de significativo, basta reparar que mesmo assim esteve mais gente hoje na Luz que ontem no Dragão, num clássico decisivo para ambos.
Comecei pela moldura humana de hoje na Luz porque, nas condições especiais deste regresso a casa, à terceira jornada da segunda volta, era importante ver como reagia o público a um Benfica a lamber as feridas e, pela primeira vez em 15 jornadas e muitos meses, a entrar em campo sem estar no lugar mais alto da classificação. A verdade é que a resposta dos benfiquistas foi clara no apoio à equipa. Não é por aí... Não irá ser por aí!
Nem por aí nem por outro lado qualquer, apetece já adiantar que esta é a conclusão final do jogo.
Os primeiros vinte minutos não surpreenderam ninguém. O Nacional começou por fazer aquilo que é já clássico, pressão sobre a bola, bloco curto, bem junto e grande intensidade física na disputa dos lances. Nada de novo, todos os adversários do Benfica há muito fazem assim, sem grandes resultados, como se tem visto. As excepções, que só confirmam a regra, aconteceram apenas quando o Benfica não foi minimamente eficaz na concretização das oportunidades de golo que sempre criou.
Por isso, se os primeiros vinte minutos não surpreenderam ninguém, os restantes setenta também não. A não ser os que esperavam que a equipa não conseguisse sarar as feridas abertas nas últimas duas semanas. Quando Jonas, aos 26 minutos, fez o primeiro golo percebeu-se que não havia mais fantasmas, e que a normalidade estava de regresso. E com ela o melhor futebol que se pratica neste campeonato, mesmo que aqui e ali com alguma timidez.
O segundo, ainda por Jonas e de grande execução, surgiu pouco depois, à entrada dos últimos 10 minutos da primeira parte, quando no relvado já se desenhavam jogadas do melhor futebol que por cá se vê.
A segunda parte - que daria apenas mais um golo, de Mitroglou, assistido por Rafa em mais uma brilhante jogada de futebol, seria de confirmação. De confirmação do regresso da equipa ao bom futebol, e da confirmação de que a arbitragem está mesmo apostada emapertar. Nem é necessário falar se há um ou dois penaltis por assinalar, basta falar da incrível dualidade do critério disciplinar do árbitro. A equipa do Nacional não poderia acabar o jogo com mais de oito jogadores em campo. Mas acabou inteirinha, mesmo que o seu capitão devesse ter sido expulso em três ocasiões distintas. Numa delas mandou o Sálvio de regresso ao estaleiro, numa entrada violenta, e por trás, quando o argentino se isolava a caminho da área.
O Benfica não recuperou a liderança. Manteve-a. Mantém-na desde a quinta jornada. Sem a folga a que estávamos habituados, mais apertada agora, na diferença mínima. E por isso tudo vai apertar ainda mais... Mas também não irá ser por aí!
... Mas a precisar de afinação. Há por ali gente a desafinar.
É este, de resto, o grande problema deste Benfica de início de época - desafinação. A momentos em que parece já muito afinandinho, sucedem-se momentos de desafinação. Frequentemente desafinação colectiva, mas também individual, com muita gente fora do tom em muitos momentos do jogo.
Com Jonas - sensacional recuperação: em vinte dias lesionou-se, foi operado, e voltou a jogar ao seu nível - no jogo a música sai com outra qualidade, já sabíamos. Tudo o que toca, toca bem. Irrepreensível. Mas este jogo de hoje na Madeira, com o Nacional, mostrou que a excelente música que sai dos pés de Jonas precia de mais. De mais concentração, de mais intensidade, de mais acerto - especialmente na hora do último passe ... e do remate.
E tudo isto é mais visível quanto é sabido, e hoje mais uma vez confirmado, que contra o Benfica toda a gente corre mais, é mais agressiva e está mais motivada. É curioso que, invariavelmente, no fim dos jogos com o Benfica, dos adversários sempre se diz que, a jogarem assim, o futiro é radioso. Depois, vai-se a ver, e não é assim tão radioso. Não conseguem repetir...
Claro que as desafinações não se notariam tanto se o Benfica conseguisse matar os jogos em tempo. Se no início da segunda parte tivesse aproveitado um terço das oportunidades de golo criadas, também a música seria outra. E talvez o Pizzi não tvesse perdido aquela bola, não tendo depois de fazer a falta que daria o livre. Que o Júlio César não segurou, obrigando o Lisandro a completar para canto. Que deixou a defesa a olhar para a bola, permitindo que o defesa do Nacional emprestado pelo Sporting fizesse o golo do empate.
As intermitências ainda são muitas. Especialmente de André Horta - uma história bonita, sem dúvida, esta de um de nós lá dentro, a jogar de cachecol -, de Rúben Semedo, ou de Pizzi. Em grande, mesmo, só Salvio, que parece de volta ao grande jogador que conhecemos. E que bem lhe fica a braçadeira, mesmo que não lhe dê grande uso... E, claro, Carrillo. Pelo seu primeiro golo de manto sagrado. Um golo importante, para ele e para o jogo, mesmo que já lá estivesse o pé de Jonas para fazer o mesmo.
De fora ficaram Cervi e Mitroglou (só Gimenez marcaria aquele terceiro golo). De fora de tudo, sem que se perceba a trapalhada que para ali vai, continua Danilo, que me parece um jogador fundamental para esta equipa do Benfica. E Rafa. Mas aí percebe-se a trapalhada. E bem!
À segunda - e à segunda-feira, pela hora de almoço - lá foi. O jogo jogou-se, e muito bem, e o Benfica ganhou. E muito bem, mesmo com o golo oferecido daquela maneira a manchar um bocadinho uma grande exibição e mais um resultado gordo.
Foi uma boa decisão - pese embora as dificuldades que naturalmente trará ao Nacional para o jogo da Taça, na próxima quarta-feira, mas não podem ser prejudicados sempre os mesmos, que não têm nada a ver com o absurdo horário escolhido para o jogo - a de continuar o jogo logo no dia seguinte, como já tinha sucedido com o Porto, exactamente nas mesmas condições. Com uma diferença: o árbitro não era Jorge de Sousa, o melhor árbitro português, que não vê os penaltis que todos vemos, mas vê outros, que mais ninguém vê.
À margem disso, que não é nada marginal, porque apenas por esses problemas de visão do melhor árbitro português - por que é que o melhor àrbitro português é sempre assim? Porque se não for assim nunca será o melhor árbitro português ... - só nesses dois jogos, cada um dos adversários do Benfica na disputa do título arrecadou três pontos a mais, e das muitas incidências do jogo ficou, num terreno impraticável, mais uma promessa de que o melhor futebol de Portugal está a caminho de casa. Como o filho pródigo...
Se calhar é por isso que andam todos tão nervosos. Que a pressão sobre os árbitros, como ainda ontem se presenciou em Alvalade, com o sucesso que se viu, não abranda. E que a estratégia de bullying é para continuar sem ponta de dignidade nem espaço para a vergonha.
Depois de já ter perdido os três pontos que, inacreditavelmente, o Braga deixou fugir em Alvalade, o Benfica tinha obrigatoriamente que assegurar os outros três que tinha para disputar na Madeira: na Choupana, onde o nevoeiro é quem mais ordena.
Não pôde, porque lá esteve de novo o nevoeiro, pela segunda vez em dois meses, a tornar de balde mais uma viagem do Benfica à pérola do Atlântico. E lá volta o Benfica a ficar com um jogo a menos e pontos de atraso a mais... É tempo de dizer basta, os orgãos que dirigem o futebol nacional devem ter que fazer alguma coisa sobre a acreditação daquele campo para a competição profissional. Pelo menos durante o inverno...
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