Em Novembro do ano passado, a Procuradora-Geral da República, depois de chamada a Belém pelo Presidente Marcelo para uma misteriosa reunião, decidiu incluir no comunicado sobre as buscas realizadas no âmbito da chamada "operação influencer" um parágrafo final, dando conta da existência de uma investigação criminal autónoma contra o primeiro-ministro, de que resultaria a sua demissão. Aproveitada por Marcelo para dissolver a Assembleia da República, e convocar eleições antecipadas, que resultaram num terramoto político.
Cinco meses depois, no acórdão ontem conhecido, os desembargadores do Tribunal da Relação consideraram que os factos apresentados pelo Ministério Público (MP) não indiciam qualquer tipo de crimes por parte dos arguidos. Que o alegado “plano criminoso” defendido pelo MP, não passa de “um conjunto de meras proclamações assentes em deduções e especulações retiradas do que o MP ouviu arguidos e membros de governo falar ao telefone, proferindo afirmações vagas, genéricas e inconclusivas”.
Ou seja, 50 anos depois do golpe de Estado perpetrado pelos capitães de Abril, que abriu as portas da Revolução, o país foi alvo de outro, por acção do Ministério Público e bênção do Presidente Marcelo, que abriu outras portas, muitas das quais julgávamos fechadas para sempre.
Instado a comentar o acórdão (em Coimbra, na inauguração de um mural de homenagem a Alberto Martins e à Crise Académica de 1969 - um marco na História da luta contra a ditadura derrubada há 50 anos), Marcelo não poderia ser mais cínico: "Não vou comentar as decisões de justiça, mas repito de uma outra forma um comentário que já fiz que é mais político". "Tenho a sensação de que começa a ser mais provável haver um português no Conselho Europeu, neste próximo outono, em Bruxelas".
Cínico, Marcelo quis dizer "não se importem com isso". Que Costa até saiu a ganhar, e pode, agora que está limpo, ir descansado - já livre daquela espécie de bullying que durara desde a tomada de posse - para onde afinal queria ir. E que para o país não tem importância nenhuma que já só seja governável com a extrema direita. Importante é que tenha alguém em Bruxelas!
Não. Não é Marcelo a ser "Marcelo". Como já não fora Marcelo a ser "Marcelo" nas trapalhadas com o Dr Nuno, "maior e vacinado", no caso das gémeas brasileiras. É Marcelo a bater no fundo!
"É ou não a favor da marcação de eleições na Madeira"? - pergunta Anselmo Crespo a Luís Montenegro.
Resposta: "Acho que deve ser empossado um novo governo regional e, no dia 24 de Fevereiro, o Senhor Presidente da República avaliará a situação política na Madeira, e decidirá se marca ou não eleições."
Pois... Já se tinha percebido. Isso é o que PSD (Madeira e nacional) anda a dizer há dois ou três dias. Como não se percebe o interesse num novo governo para governar três semanas. Nem se percebe o que possa fazer um governo novo em três semanas, apenas sobra a ideia de "entalar" o Presidente da República.
A situação política na Madeira não tem nada a ver com a do país. Já percebemos que não.
Percebemos que não quando Miguel Albuquerque, o primeiro a exigir publicamente a demissão de António Costa, há pouco mais de dois meses, recusou determinadamente demitir-se. Quando Luís Montenegro, o segundo a exigir a demissão de Costa, declarou manter a confiança política em Albuqerque. E percebemos quando, do chefe do governo regional da Madeira sabemos que é, para além de arguido, suspeito de identificados actos de corrupção; enquanto, do chefe do governo do país, continuamos sem saber de que é suspeito. São tão diferentes que até a Polícia Judiciária, que dá sempre nomes sonantes às operações, chamou "influencer" a uma e deixou a outra sem nome, apesar do aparato: um Hercules C-130 (da esquadra bisontes), a aterrar na Madeira com 300 pessoas a bordo, transbordadas directamente para autocarros estacionados na pista, com os parques de estacionamento com a lotação esgotada por carros alugados para a operação.
Como uma coisa não tem nada a ver com a outra, a antecipação de eleições, que no país foi a decisão correcta, é absurda e sem nexo na Madeira - dizem. A melhor justificação para não aplicar na Madeira o que foi decidido para o país, acabou de ser apresentada por Manuela Ferreira Leite: o governo do PS já tinha oito anos; o do PSD, na Madeira, tem apenas dois meses!
Palavras para quê? São artistas portugueses, como dizia o velho anúncio...
Já sabíamos de há muito que Marcelo se desbronca com facilidade. Agora ficou a saber-se que, para além de se desbroncar com facilidade, também se desbronca por heterónimo.
Não me parece que seja isto "o normal funcionamento das instituições". Mas é este o normal funcionamento da "instituição Marcelo".
Parece-me que é já evidente, com o que se conhece "nesta altura do campeonato", que a "operação influencer" é a demonstração mais clara do estado de degradação aque chegaram as instituições da nossa democracia. E que tem muito mais de "Golpe de Estado" do que de normal funcionamento das instituições.
Ficou hoje a saber-se que o tal último parágrafo - "No decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido. Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente" - do comunicado da PGR naquele dia 7 de Novembro, que António Costa invocou para a demissão, foi escrito pela própria senhora procuradora-geral da República, Lucília Gago. Já se estranhara a sua nunca explicada deslocação a Belém, pelo meio das duas reuniões dessa manhã entre o primeiro-ministro e o presidente da República. Agora ficou a saber-se que fica pessoalmente ligada a esta relação causa-efeito, reforçando a ideia de um "Golpe de Estado" preparado durante quatro anos por alguns agentes do Ministério Público.
Aquele último parágrafo era desnecessário. Provavelmente, depois de todos os "casos e casinhos" que atravessaram este governo, teria bastado o envolvimento de pessoas tão próximas como o seu chefe de gabinete - e em especial o insólito caso do dinheiro guardado/escondido no gabinete -, ou o "seu melhor amigo", para António Costa se demitir. Soa, por isso, a estocada final da senhora procuradora-geral da República.
No momento certo?
Talvez se conheça a resposta a esta pergunta quando se souber o que foi a procuradora-geral da República fazer a Belém. Um dia se saberá. Por agora só sabemos que, vontade de deitar o governo abaixo, era coisa que há muito não faltava a Marcelo. E que só lhe faltava o momento, mesmo que não fosse o certo.
Acabei de ver o último "Isto é gozar com quem trabalha" que, "por razões óbvias" não vi em directo, no domingo. Não "papo" muita televisão, há um ou outro programa - contam-se pelos dedos de uma mão, e ainda sobram - que tento não perder. Esse é um deles.
Foi aí que tomei conhecimento de mais um espalhanço do José Gomes Ferreira, dito "jornalista" que se acha muito frontal e ainda mais esperto. Que já publicou uma "História de Portugal" criada por ele próprio, e que até já apresentou um programa de governo. Que tem soluções para tudo, e que é uma referência ... do populismo barato. Citado frequentemente em táxis e conversas de café. Que, agora que quase já não há cafés, têm lugar nas redes sociais.
Às vezes é apanhado mas como, falando muito de vergonha, não tem nenhuma na cara, é sempre como se nunca fosse. Desta, em directo, interrompeu o colega que usava a palavra porque tinha algo de importante, e em primeira mão, para anunciar. Era um tweetque acabara de receber. E começou a ler. Os disparates sem nexo sucediam-se, e ele continuava. Sem parar para pensar. Sem nada na cabeça, nem sequer uma campainha de alerta, até ter que ser mandado calar pelos colegas de painel, e de trabalho.
Não tivesse o jornalismo chegado à miséria que chegou, e não fosse o negócio da comunicação o bordel que é, e este senhor já não era jornalista. E muito menos director-adjunto de informação de um dos principais canais de informação da televisão portuguesa!
"Vamos esquecer" - sentenciou o apresentador.
Se foi uma reprimenda, não lhe servirá de muito. Já levou muitas, e nunca aprendeu nada com elas.
Se foi uma sugestão para passar ao esquecimento, foi pedir-nos que esqueçamos o que é o jornalismo. E também não vale de muito. Já toda a gente esqueceu!
João Galamba demitiu-se, finalmente: "...para assegurar à minha família a tranquilidade e discrição a que inequivocamente têm direito”, justificou. Ou para não ser demitido amanhã, como estava mais que anunciado?
Parece-me mais isso. Mas isso é defeito meu, que por feitio nunca acredito em nada do que Galamba diga. O que não quer dizer que não me incomode a perseguição e as esperas que lhe têm feito à porta de casa.
Incomoda-me. Como me incomoda tanta coisa que está a acontecer por aí. Como me incomoda que se prendam pessoas para serem interrogadas. E que sejam libertadas depois. É tudo ao contrário. Normal seria, se fosse caso disso, que as pessoas fossem presas depois de interrogadas. Como me incomoda que, uma semana depois, se continue sem saber o que é que a Procuradora Geral da República foi fazer a Belém. Como me incomoda que um primeiro-ministro "fale ao país" para falar à Justiça. Que o Ministério Público troque nomes na transcrição de escutas. Ou que invoque portarias que nada têm a ver com o que evoca.
O país esperou, e ouviu António Costa ... apresentar a sua defesa.
Foi isso, António Costa defendeu-se, ponto por ponto, de tudo aquilo que até hoje é conhecido da "operação influencer". "À política o que é da política, e à justiça o que é da justiça" é apenas um slogan. Mais isso também já se sabia!
Era estranho que o Ministério Público não tivesse dado nome à operação que levou à demissão do primeiro-ministro. Afinal deu, e chamou-lhe "operação influencer".
Não é estranho é que o jornalismo de direita tenha muito de direita e pouco de jornalismo. Por isso não é estranho que, nada de estranho tendo sido escutado nas "escutas ao primeiro-ministro", se estranhe que nada tenha dito ao telefone.
É estranho que o agora ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro, tal Vítor Escária, já hoje demitido por António Costa, tivesse guardado mais de 75.800 euros no seu escritório, em S. Bento. Não é estranho que o seu advogado tenha dito que esse dinheiro se refere a uma atividade profissional “anterior às funções que exerceu”.
Não é estranho que em casa do Galamba tenha sido encontrado haxixe para consumo próprio. Tem "pinta" de ser apreciador. Disso e de jantares caros.
Nem é estranho que, de tudo o que, até agora, a Justiça deu a conhecer, nada se vislumbre o que quer dar por conhecido.
Neste país tão estranho nada se estranha e tudo se entranha!
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