Tour 2014 VIII
Por Eduardo Louro
Chegou ontem ao fim, em plenos Campos Elíseos, a centésima primeira edição da maior e mais extraodinária competição do ciclismo mundial.
Os Pirinéus tinham, à décima oitava etapa, deixado quase tudo definido. Ficara para o contra-relógio do penúltimo dia a arrumação final do pódio, porque sobrava apenas a etapa de sexta-feira, tranquíla, para os sprinters voltarem a ter a sua vez...
E assim foi. Ou quase, já que o lituano Navardauskas consegui adiantar-se um bocadinho - sete segundos apenas - ao pelotão e ganhar, deixando os especialistas do sprint, onde voltava a faltar Kittel, mas também Greipel, a discutir o segundo lugar. Até se chegar ao contra-relógio onde, como se esperava, Tony Martin voltou a não ter rival. Ganhou categoricamente, com Nibali - que, sem qualquer pressão e totalmente à vontade na classificação, não terá naturalmente sentido necessidade de dar o seu melhor - a fazer o quarto tempo, com mais 1´e 58"!
Na disputa pelo segundo lugar Péraud, sétimo no contra-relógio com mais 2´e 27" que Martin, levou a melhor sobre Thibaut Pinot. Que ficou com o último lugar de um pódio com dois franceses, que há muitos, muitos anos se não via.
Quem voltou a ficar fora do pódio, naquela que terá certamente sido a sua última oportunidade, foi o espanhol Alejandro Valverde, atirado nos Pirinéus do segundo para o quarto lugar mas, ainda assim, com apenas quinze segundos para recuperar. Voltou a falhar, e os quinze segundos que tinha para o segundo lugar de Pinot, transformaram-se em 2´e 3" para o mesmo segundo lugar depois de Péraud.
Com tudo decidido correu-se ontem a etapa do champagne, com Kittel finalmente de regresso às vitórias, repetindo com o Arco do Triunfo à vista o mais apetitoso dos sprints vitoriosos. Foi por pouco, menos de meia roda sobre Kristoff, mas o suficiente para, depois daquelas três vitórias nas quatro primeiras etapas, e de mais de duas semanas como que desaparecido em combate, igualar as quatro de Nibali.
Este foi o Tour das quedas. Não sei se teve mais quedas que os anteriores, mas teve mais quedas com mais consequências. Só candidatos foram dois - e que dois: Froome e Contador. Mas também e ainda o papa-etapas Cavendish, o melhor sprinter mundial dos últimos anos!
Mas foi, acima de tudo, o Tour de Nibali. Ganhou com uma autoridade raramente vista, só ao alcance dos grandes campeões. Ganhou quatro etapas, e sempre as de maior grau de dificuldade. Nunca se deixou atacar. Para nunca ter de se defender, foi sempre ele a atacar. Impressionante!
Percebeu-se que se preparou para ganhar este Tour, e ganhou com mérito indiscutível, deixando a ideia bem clara que ganharia mesmo com Froome e Contador. Nunca ninguém o poderá provar, evidentemente. Deu para perceber, nas 10 etapas que Contador disputou, que o espanhol não estaria à sua altura. Froome ficou de fora logo na terceira etapa, mas mesmo aí já Nibali tinha ganho, na segunda. A verdade é que a superioridade que Nibali evidenciou deixa definitivamente uma pedra sobre este tipo de especulações!
Integra hoje o restrito grupo de seis corredores que ganharam as três grandes competições dociclismo mundial: Vuelta, Giro e Tour. E isso diz tudo!
A merecerem também referência neste Tour: desde logo os dois franceses do pódio, com Pinot ainda a ganhar o prémio da juventude. Também Tony Martin, um grande corredor. E mais dois jóvens de grande potencial - o francês Bardet, que o contra-relógio atirou para o sexto lugar, e o polaco Mayka, o rei dos trepadores.
Pela negativa referiria Joaquim Rodriguez, que se expôs e perdeu sempre. Mas também Peter Sagan, de quem muito se esperava em função da sua participação na edição anterior. Ganhou - e cedo, ficou bem cedo definida a camisola verde - a classificação por pontos, mas sem ganhar uma única etapa. E perdeu todos os sprints que disputou. Na mesma linha, se bem que num registo completamente diferente, Kwiatowski. O jovem polaco foi uma desilusão completa. Falhou naquela aqui tão referida etapa épica do Tony Martin, depois aproveitou uma boleia numa fuga bem sucedida na primeira etapa dos Pirinéus, e regressou ao top ten, para se afundar logo de seguida nos confins da classificação. E Richie Porte, que depois de no ano passado ter até deixado a ideia de poder contestar a liderança de Froome, este ano, com o líder a ficar logo de fora, falhou em toda a linha. E sempre!
Não há muito a dizer sobre os portugueses. Rui Costa teve de abandonar ainda antes dos Pirinéus. O Tiago Machado chegou a ser terceiro, por um único dia, o também dia único em que Nibali não teve a amarela vestida. Ironicamente teve na queda o seu dia de glória. O Sérgio Paulinho fez o seu papel, mas ficou também aquém do que parece que poderia ter feito, especialmente depois do abandono de Contador. É de resto o desempenho de muitos dos seus colegas de equipa, depois de libertos pela ausência do líder, que deixa a ideia de que também ele poderia ter tido o seu momento de glória.
Nelson Oliveira, também ele acidentado, e José Mendes reservaram para o contra-relógio as suas melhores prestações, ficando ambos nos vinte primeiros, com tempos que até tinham dado jeito, por exemplo, a Valverde.