O que por aí se vai vendo sobre os resultados eleitorais na Catalunha é verdadeiramente extraordinário. Os portugueses alinhados com a soberania catalã, exultam com a vitória inequívoca das forças independentistas e com o desaparecimento do PP de Rajoy do mapa político da Catalunha. Já os portugueses entregues de alma e coração ao espanholismo cantam a vitória clara dos constitucionalistas, e ignoram os resultados do primeiro-ministro espanhol, porque o que conta é o Ciudadanos.
Poderão estar neste momento a pensar que é sempre assim. Que já estamos habituados a que todos ganhem e ninguém perca. É verdade. Mas só é verdade por cá, deste lado da fronteira. Lá, em Espanha, não se passa nada disso. Os espanhóis, os interessados directos, não têm dúvidas nenhumas sobre os resultados das eleições. E muito menos sobre as complicações que eles trazem agarrados...
Os jornais, as televisões - a TVE foi pouco menos que escandalosa - e os comentadores espanhóis, que na campanha eleitoral foram tudo menos plurais, conhecidos os resultados, meteram a viola no saco. Por cá, isso é sempre mais difícil. Mesmo quando as coisas não nos dizem assim tanto respeito...
Francamente: não sei se esta estranha relação com os resultados eleitorais é uma idiossincrasia portuguesa, ou se é apenas o estado de futebolização a que o país chegou!
Acabei de concluir, no post anterior, que o dia de ontem não existiu: ontem foi um jogo de futebol! E, pelo vou vendo, hoje pouco mais é que o dia seguinte ao do jogo de futebol!
Procura-se justificar este absurdo com uma realidade tida como incontornável: a primeira final de uma competição europeia totalmente portuguesa!
O sucesso do futebol português – enquanto actividade de excelência, das poucas que somos capazes de apresentar à Europa e ao Mundo – materializado numa final portuguesa, funcionaria, neste momento de humilhação e de descrença colectiva, como motivo de orgulho nacional e de reforço de uma auto-estima que se encontra pelas ruas da amargura. E isto justificaria a onda de excitação do país que os media procuraram provocar, deitando mãos a todos os recursos, mesmo que desproporcionados e despropositados!
Não me parece que, apesar de não terem olhado a meios nem a custos, o tenham conseguido. Não me parece que, apesar dos esforços, tenham sido bem sucedidos nessa tarefa de pôr o país em festa.
Porque a crise e o desespero tomaram mesmo conta dos portugueses. Mas também porque o cariz regionalista a que entregaram a tarefa (como referi abaixo o lema da Antena 1 era que “a Irlanda é do Norte”, mas houve muitas mais expressões dessa arregimentada divisão regionalista) era em si mesmo paradoxal, se não mesmo inimigo desse desiderato nacionalista.
E na realidade esta final portuguesa teve muito pouco de portuguesa e muito menos ainda de portugalidade. Não tanto pela constituição das duas equipas portuguesas (e do Norte!), com apenas três portugueses cada à entrada (à saída eram ainda menos), que isso não acontece apenas em Portugal, mas pela falta de expressão portuguesa! Na festa, claro! E, essa, fizeram-na os jogadores do Porto, naturalmente… Com os estrangeiros – a enorme maioria, como vimos – embrulhados nas suas bandeiras nacionais. E até, pasme-se, com um dos seus únicos três portugueses em campo, e jogador da selecção nacional, embrulhado na bandeira de Cabo Verde. Bandeira nacional foi coisa que se não viu ontem naquela final portuguesa, de repetição absolutamente improvável. O próprio Falcao, melhor marcador da prova, marcador do único golo da partida e, talvez por isso, na linha habitual da UEFA, distinguido como o melhor jogador da final, que temos visto fazer um notável esforço em Portugal para se expressar em português, respondeu a todas as solicitações em castelhano, sem se lembrar que estava a falar para Portugal e para portugueses.
O cabo-verdiano Rolando falou em português: mas para dizer que se queria ir embora, que tinha aspirações a jogar num clube de maior dimensão! Paradoxos: somos um país de paradoxos!
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