Cada saída do primeiro-ministro está transformada num calvário, e é já penoso vê-lo cada vez mais sozinho no meio de cada vez mais seguranças.
Há dias escrevia aqui que o governo estava em prisão domiciliária, sem poder ausentar-se dos ministérios. E que, para se deslocar pelo país a fazer de conta que existia, teria de mandar construir túneis e bunkers.
Sem tempo – nem recursos – para isso, o primeiro-ministro optou por, nas suas deslocações, trocar as voltas a toda a gente – entrando pelas portas dos fundos que todos os edifícios têm – e por reforçar os meios de segurança. Ontem, no ISCSP, onde Passos Coelho se deslocou para participar na homenagem a Adriano Moreira, os seguranças não tiveram mãos a medir, chegando ao cúmulo de ameaças sobre um operador de câmara da TVI. Para identificar (?) um miúdo que tinha apupado o chefe do governo viu-se um autêntico batalhão de polícia…
Hoje, numa deslocação para um almoço com empresários em Cascais, as mesmas cenas: segurança reforçada, a trocar as voltas aos jornalistas e a empurrá-los para bem longe do chefe do governo. E apupos da população…
É penoso, o constrangedor paralelo entre os ambientes interiores, onde Passos Coelho discursa – e até se esforça por citar Camões - e os cá de fora, da rua, quando entra e sai!
Os ministros, todos sem excepção, são vaiados sempre que saem ao contacto público. Tem sido evidente que passaram a fugir a esse contacto, procurando portas e travessas que os levem aos seus protegidos e bunkerizados destinos sem esse incómodo de enfrentar a população.
Os mais recentes casos vêm precisamente do fim-de-semana. A ministra Assunção Cristas, que há poucos dias escapara a um ovo em Santarém, tinha em Aveiro muita gente à sua espera em protesto. Mas tinha também muita polícia capaz de a encaminhar tranquilamente para o interior do auditório – onde encerraria um seminário alusivo aos 50 anos da PAC – vazio!
Miguel Macedo, o ministro da Administração Interna, deslocou-se a Campia - Vouzela – para inaugurar um edifício do destacamento local dos bombeiros. E lá estava a multidão em protesto… Miguel Macedo, com um estranho sentido de oportunidade, achou por bem dizer que os portugueses são cigarras, em vez de formigas!
Gasolina na fogueira: para quem tem o pelouro dos incêndios não é lá muito abonatório…
O governo está definitivamente de relações cortadas com a população e, a partir de agora, ou todos os seus membros permanecem bloqueados nos seus ministérios – um governo em regime de prisão domiciliária – sem de lá poderem sair, ou passam a mandar construir túneis e bunkers por todo o país – o sector da construção e o emprego agradecem – para que possam manter actos protocolares que lhes alimentam a sensação de estarem vivos. E ministros!
Mas não será certamente fácil de perceber que se possa governar assim.
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