Também a Fitch, mesmo no finalzinho da semana, retirou Portugal do lixo, saltando directamente dois degraus na escada da classificação de rating. Foi provavelmente a última grande notícia do ano, o tal que Costa designou de "saboroso", gerando mais uma onda de indignação e obrigando-o a voltar a falar de contexto. Ou de fora dele...
Não deixa de ser extraordinário que um governo tido por politicamente forte - é essa a marca de António Costa - e economicamente vulnerável, sobreviva hoje politicamente à custa do seu desempenho económico. Não deixa de ser extraordinário que, contra todas as expectativas, o governo tenha ganho na economia o que lhe permite cobrir tudo o que perde na política, onde não param de se suceder situações embaraçosas. Como a que hoje leva o peso-pesado Vieira da Silva ao Parlamento!
Nem deixa de ser extraordinário que seja Máro Centeno, que ninguém quis levar a sério e que toda a gente escolheu para bombo da festa, o abono de família do governo do súper António Costa!
A coligação no poder apresentou ontem o programa eleitoral. Com pompa, muita pompa... Dada a circunstância - em cima das férias, fora de tempo de discussão - nada mais prentendia que pompa.
Podia, mesmo assim, a coligação ser mais comedida na charlatanice?
Recorro ao velho slogan publicitário: Poder, podia... Mas não era a mesma coisa!
No meio de tanta aldrabice, a sem vergonha tinha ainda de chegar à ameaça com as agências de rating?
Tinha. Porque é aí, já em pleno território do absurdo, na fronteira com a loucura, que a charlatanice atinge o climax da conclusão no tal slogan publicitário.
Era o que faltava... Era o que faltava no discurso charlatão. Já não falta!
O que falta - e a falta que lhes faz - é que as agências de rating assinem por baixo o discurso dos milagres dos charlatães. Não assinam por baixo, não caucionam e mantêm o país no lixo, donde não não saiu como ainda se atascou mais...
É tal a vertigem que ja nem conseguem parar, para pensar. E acabam por se espetar, com estrondo: para ameaçarem com o papão das agências de rating não conseguem esconder que afinal o país é - continua - lixo, sem nada a ver com o que apregoam.
A Fitch mantém o rating da República em BB+. Na gíria, lixo. E explica: pela trajectória da dívida e porque a economia portuguesa não cresce; porque não é competitiva e as empresas estão sobreendividadas!
Certa ou errada, é esta a explicação que dão para não rever a classificação de risco que teimosamente persegue a economia portuguesa. Bem ou mal, é desta forma que as agências de rating ratificam o milagroso desempenho que tantos elogiam.
Com o modo "que se lixem as eleições" há muito desligado, e com o botão do turbo eleitoral no máximo, Pedro Passos Coelho, lá longe, do Japão, dá-nos outra interpretação. Não é expectável - garante - que as agências de rating revejam as suas classificações de rating antes das eleições, pela simples razão que, primeiro, querem saber quem as ganha. Querem saber se tudo o que de bom tem sido feito - mas que não foi suficiente para as fazer alterar uma única posição, digo eu - vai ter continuidade. Diz o primeiro-ministro, com o maior descaramento deste mundo, que não se passa nada. Ganhe ele as eleições, e volte ele a formar governo, e as agências de rating virão imediatamente a correr atribuir o AAA+ a Portugal!
E diz isto apesar de a própria a Fitch ter na circunstância referido não esperar que as próximas eleições legislativas tragam "um desvio relevante de política", uma vez que "os dois principais partidos (PSD e PS) são pró-europeus", e que "não há partido populista ou antieuropeu que tenha atraído apoio significativo nas sondagens de opinião".
É isto que nos espera, todos os dias, ao longo dos próximos seis meses. É com estas agressões à nossa sanidade mental que teremos diariamente de conviver. Se até aqui valeu tudo, daqui para a frente não há limites para o populismo, para a demogagia, para o descaramento, para a falta de vergonha... Para o lixo que se vai amontoando!
Mas então o que é que se passou? O que é que motiva ou justifica tantos foguetes?
Já não somos lixo?
Já temos um rating de gente grande?
Já podemos ir à vontade aos mercados, como gente séria e respeitável?
Já não corremos o risco de nos chamarem caloteiros, aí numa esquina qualquer?
Nada disso!
A Standard & Poor´s manteve a classificação de lixo, a notação BB que utiliza para investimentos de alto risco. E naturalmente pouco recomendáveis. O que a Standard & Poor´s anunciou hoje foi isso mesmo, que manteve a notação absolutamente inalterada. Mas que alterou a sua perspectiva: o outlook, como eles dizem!
Passaram de um outlook negativo para um estável. Quer dizer, antes achavam que era lixo mas ainda podia piorar; agora acham que é o mesmo lixo e que por aí se vai manter. Que daí não vamos sair…
Dirão agora os mais optimistas, aqueles que vêm sempre o copo meio cheio: “Bem, pode não ser bom, mas também já não é mau que essas agências pensem agora que, para pior, isto não vai”!
Lamento desiludi-los, mas a Standard & Poor´s também explicou por que é que fez tão significativa alteração. Por que é que hoje já pode achar que o lixo é estável quando ainda ontem achava que o lixo ainda podia piorar. Uma simples justificação: porque os ministros das finanças da União decidiram apoiar o alargamento dos prazos que Portugal e a Irlanda terão para pagar os seus resgates.
Quer dizer, à Standard & Poor´s essa coisa do "mais tempo" diz alguma coisa. Não diz grande coisa, mas…
No meio de tanta desgraça, sem nada a que se agarrar, Passos Coelho corre atrás da primeira cana de foguete que vê. E quer que festejemos com ele… Ridículo!
O inimputável é, apesar de tudo, um bocadinho mais esperto: vejam lá se o ouviram dizer alguma coisa?
Há pouco mais de um ano começamos a ouvir falar de rating e de agências de rating. E de notações: os resultados das avaliações de risco!
Não fazíamos ideia de nada disto mas rapidamente aprendemos. E depressa nos fomos familiarizando com estes nomes: Moody`s, Fitch, Standard & Poor´s. Aprendemos que havia AAA – o triple A - em inglês, pois claro. E que isso era bom: tão bom que era, em 2008 e um mês antes da falência, a classificação que tinham atribuído ao Lehman Brothers. Mas que, depois, pode cair. Para um único A, depois para B+, para B- e por aí abaixo. Até chegar a lixo!
Foi aí que acabamos de chegar: a Moody`s avaliou a nossa dívida externa como lixo. Junk, em inglês. Mas aqui o português sobrepõe-se ao inglês, e é lixo! Porcaria!
Há pouco mais de um ano isto tinha acontecido à Grécia. E nós estamos fadados para nos guiarmos pela lanterna grega. Estamos num buraco negro, completamente escuro, onde apenas sabemos que ali à frente vai a Grécia com uma lanterna. A luzinha que vemos não é a famosa luz ao fundo do túnel: é a da lanterna grega!
Já devíamos ter percebido isto há muito. Mas não quisemos! Daí a indignação que tomou conta do país. Há muito que não víamos o país tão unido em torno de uma causa. Se calhar desde a causa de Timor!
A indignação e a revolta com esta classificação uniu os portugueses. Para já não se percebe que nos tenha unido em torno de qualquer coisa, a favor de um objectivo ou de uma missão. Mas percebe-se que nos uniu contra a Moody´s! Contra a Moody`s marchar, marchar… No facebook, evidentemente!
O país está mobilizado e unido nesta guerra. Bem organizado sob o comando do comandante-chefe das forças armadas: o Presidente da República. Foi o primeiro a sair, a dar o corpo às balas, a dar o exemplo. Logo ele, que ainda há bem pouco tempo – já bem depois da lanterna da Grécia por aqui ter passado – era o primeiro a dizer que não era esse o inimigo. Que nem sequer deveríamos falar neles, porque isso era desviarmo-nos das nossas obrigações. E os mercados? Bem, esses tinham sempre razão…
Esta é uma guerra para ganhar. Claramente, sem sombra de dúvida: estamos todos unidos, com uma liderança clara – a do Presidente da república – mas, mais, com a Europa connosco, como já não estava desde os tempos do PREC. Quando, estando com Mário Soares, estava connosco!
E nem sequer é a Europa do Durão Barroso – se bem que essa também esteja, apesar de não contar para nada -, é a Europa da Alemanha. Essa mesma, a da Senhora Merkel. Connosco como nunca antes tinha estado. E a do Sr Trichet – na verdade também é da Senhora Merkel – do Banco Central Europeu, que veio logo dizer que os ratings das agências, para ele, já não contavam nada. E até já veio explicar que bem podem tirar o cavalinho da chuva, porque em países intervencionados – o nosso, a Grécia e a Irlanda e deve ficar por aqui, porque já não há dinheiro para mais – eles não irão poder meter o nariz.
A União Europeia (EU) reagiu à notação da Moody`s à dívida portuguesa de forma concertada - ao que pareceu – com as instituições nacionais. A reacção vale o que vale – que não é muito – e em particular a de Durão Barroso valeu pouco. Valeram bem mais as alemãs e valeu, essa sim porque foi bem para além da simples declaração formal, a do BCE ao declarar que deixará de condicionar a sua actividade pelas notações de rating.
Esta é uma decisão relevante e que há muito se impunha. O BCE, bem como os restantes organismos europeus, conhecem – têm toda a obrigação disso – as economias europeias e as condições financeiras dos estados membros. Nem o famoso caso grego serve para o pôr em causa. Os gregos não enganaram a União Europeia, esta é que quis deixar-se enganar! Já vinha dos tempos da integração no euro: a UE sabia perfeitamente que a Grécia não cumpria os critérios de adesão!
Não precisa, por isso, dos serviços das agências de rating e faz muito bem em dispensá-los. Percebe-se mal, de resto, a intervenção das agências de rating nas dívidas públicas, mas isso é outra história.
Esta é uma decisão eficaz e com todo o sentido: de oportunidade e de princípio. Já a anunciada criação de uma agência de rating europeia – prevista lá para o Outono mas que António José Seguro pateticamente reclama para já – não faz qualquer sentido. Se as agências americanas não estão acima de suspeição, a resposta tem que ser dada através dos dispensa dos seus serviços, nunca substituí-las por outras criadas com todo o ar de quem procura favorecimento (a agência chinesa foi criada num cenário que nada tem a ver com o que actualmente vive a Europa).
Outra coisa seria o lançamento não de uma, mas duas ou mesmo três novas agências que alarguem a oferta e confrontem o oligopólio americano com uma concorrência séria. Porque, para além de todas as suspeitas, há os factos: estas empresas, ligadas aos interesses financeiros americanos, tiveram uma participação escandalosa na crise financeira mundial de 2008 que ainda hoje asfixia milhões de pessoas por esse mundo fora. E isto não pode continuar como se não tivesse acontecido!