O vírus da irresponsabilidade*
Portugal foi dos últimos países a ser atingido pelo Covid -19. Já a epidemia, agora pandemia, ia avançada em muitos países do mundo, mas, diga-se também, controlada em alguns outros, quando cá chegou.
Quer isto dizer que nós, portugueses, tivemos mais oportunidades que outros para nos prepararmos para enfrentar esta calamidade. Parece-me que somos cada vez mais os que pensamos que não tiramos grande proveito disso. Que não aproveitamos, como devíamos, essas oportunidades.
Tem sido notório que as autoridades portuguesas têm tido como principal objectivo evitar alarmismos. Seria normal que assim fosse. Manter a tranquilidade em circunstâncias altamente críticas, e evitar situações de alarme social, é prova de responsabilidade.
O problema está no tom com que isso tem sido feito, que não se adequa nada ao laxismo e à irresponsabilidade que nos caracteriza. E que caracteriza de uma forma geral toda esta gente cá do sul da Europa.
As pessoas continuam a achar que não têm nada a ver com isto, que é sempre com os outros, sem quererem perceber a dimensão colectiva do que está em causa, e a responsabilidade cívica, em primeiro lugar, mas também criminal, que lhes advém dos seus comportamentos.
As Universidades fecham para que as pessoas cumpram o isolamento social, mas os estudantes inundam as esplanadas. Criam-se condições de quarentena, mas as pessoas aproveitam-nas para no primeiro dia de sol encher as praias. Fecham-se os estádios de futebol, mas as pessoas vão apoiar o seu clube do lado de fora.
Discute-se o encerramento das escolas, mas chamam-lhe antecipar as férias da Páscoa. Não. As escolas não fecham para os alunos irem de férias. Fecham para evitar contacto social e reduzir as condições de propagação da doença.
Este é o momento de ganhar a batalha pela contenção do vírus, e não de outra coisa qualquer. É vital para todos nós ganhar, e depressa, essa batalha. Quem está informado e consciente da gravidade deste momento está profundamente alarmado. Os que não querem saber, os indigentes morais, têm que ser abanados para acordar para esta realidade. E isso não se faz sem alarme social.
Percebemos ontem à noite que o primeiro-ministro já percebeu isto. E que percebeu que tinha de comunicar em aberta contramão com aquelas duas senhoras que andamos fartos de ouvir.
* Da minha crónica de hoje na Cister FM