O Benfica ganhou a Supertaça. Dizem que é o primeiro título da época, e metem-no na contabilidade de "alhos e bugalhos" ao lado dos campeonatos nacionais. Se é assim, que assim seja.
Mais importante que o título é, e continuará a ser a vitória sobre o Porto. Todas são importantes mas, estas, no arranque da época, são marcantes. Marcam muito do que aí há-de vir como, de resto, está demonstrado. Esta, neste início de época, depois de uma pré-época que não foi igual à última. E que na realidade, em particular pelos dois jogos perdidos, com o Burnley e com o Feyonoord, antagonistas com muitos pontos em comum com o que é o estilo do Porto, não augurava nada de bom para o confronto de hoje.
O onze escalado por Roger Schemidt para subir ao relvado do "elefante branco" de Aveiro, não ajudava muito a suplantar aquele estado de espírito meio depressivo que se apossara dos benfiquistas. Sem Gonçalo Ramos, o treinador do Benfica optou por entrar a jogar sem ponta de lança, e associou-se essa decisão ao "clássico" medo de defrontar o Porto. O medo que os portistas fazem gala de propagandear.
Depois do jogo, e depois daquela segunda parte em que o Benfica "engoliu" o Porto, a ideia de "medo" caiu por terra. Em boa verdade, já na primeira parte, houve razões para desfazer essa ideia. É certo que o Benfica abdicou então do seu futebol de circulação, de primeiro toque e velocidade. Mas os jogadores foram à luta, foram bravos e nunca revelaram medo. Não foram menos intensos, não fugiram aos duelos e nunca se esconderam do jogo. E só faz isso quem não tem medo!
A primeira foi um "clássico", dentro do clássico. O Porto entrou com tudo para meter medo, no seu registo habitual nestes jogos do clássico. Intensidade, pressão em todas as zonas do campo, e sobre o árbitro, às vezes um pouco de bom futebol e, sempre, a manha. E os truques batoteiros.
O árbitro, Luís Godinho, foi o costume destes jogos. Também um clássico. Cedo começou a distribuir amarelos sobre os jogadores do Benfica, por dá cá aquela palha. Três seguidinhos. Para o outro lado ... nada. Zaidu entrava como queria às pernas de Bah (foi assistido pela equipa médica, e quase que teve ser substituído) e de Di Maria. E nem falta era assinalada. Curiosamente, só quando o árbitro começou também a brindar os jogadores do Porto com o cartão amarelo, o comentador da RTP passou a achar que ele estava a usar de critério muito apertado, e que poderia vir a estragar o jogo. Um "clássico", também!
Mais escandaloso ainda seria aquele fora de jogo assinalado a Rafa quando já seguia isolado para a baliza de Diogo Costa. Mandam as regras que o árbitro deixe seguir a jogada, assinalando-o - bem ou mal - apenas quando ela for concluída. Se a conclusão resultar em golo, então a decisão caberá ao VAR. O árbitro assistente levantou logo a bandeira, e Luís Godinho apitou de imediato, matando ali a jogada. Rafa, viu-se pela repetição, estava em posição legal. Ou, já perto do intervalo, quando o Eustáquio domina a bola com a mão, mesmo de frente para o árbitro assistente do lado direito do ataque portista, e ... nada. Deu canto para o Porto.
O "clássico" nos seus clássicos. O que fugia ao "clássico" era a forma como o Benfica, mesmo fora do seu registo, ia revertendo o clássico. E, muito à custa da rotação e abnegação de João Neves, e da categoria extra de Di Maria, equilibrando um jogo que os portistas só verdadeiramente conseguiram desequilibrar nos primeiros quinze a vinte minutos.
Ao intervalo Roger Schmidt mudou tudo, mudando apenas dois jogadores amarelados. Tirou João Mário, amarelado e atropelado pelo jogo, para entrar Musa. E Ristic por Jurasék, mudando Aursenes para a ala esquerda. E o Benfica passou a apresentar o seu modelo de futebol, e tomou conta do jogo. Pressão alta, circulação de bola em poucos toques, dinâmica e velocidade. E o Porto afundou-se naquela torrente de futebol, com largos minutos sem sequer conseguir sair do seu meio campo.
Os golos, de Di Maria, primeiro, ao esgotar o primeiro quarto de hora, e de Musa, sete minutos depois, resultaram desse futebol. E foram colheita parca para tamanha superioridade, e para tantas oportunidades criadas.
Roger Schemidt foi mexendo na equipa, dando prioridade aos amarelados mais expostos - Kokçu e João Neves (por Florentino e Chiquinho) - mantendo-a no alto nível de qualidade atingido, que ia fazendo vibrar os adeptos nas bancadas, entoando os dispensáveis, mas compreensíveis, olés.
Os restantes "clássicos" do jogo continuavam lá. Mas impotentes para travar a avalanche benfiquista. Luís Godinho continuou com a sua dualidade de critérios - então já nada apertados - poupando o segundo amarelo a Pepe, a Zaidu, a Grujich, a Marcano... E fazendo-se de morto quando Pepe - outro "clássico" - descarregou a raiva pelo joelho nas costas de Jurasék, ao minuto 90. Foi acordado pelo VAR, e lá teve de lhe mostrar o vermelho que há tanto tempo tardava.
Logo a seguir, mais um "clássico". Gonçalo Borges domina a bola com a mão e deixa-a para Galeno rematar para dentro da baliza (seria um grande golo!). Os quatro árbitros em campo, estavam todos a dormir, exactamente como no idêntico movimento de Eustáquio. O VAR teve de os acordar, e o Sérgio Conceição não gostou. Estava a gostar de os ver a dormir, e tomou para si o sobressalto.
Foi expulso pela enésima vez. Mais um "clássico". Mas desta refinou a arruaça. Recusou sair. Que não saía dali de maneira nenhuma. Nunca visto! Como nunca visto acabar a obrigar Luís Godinho a ir falar com ele, ordem que enviou por Marcano. No fim, não falou. Nem deixou ninguém falar. O último "clássico"?
Não. Pepe e Sérgio Conceição fizeram questão de não sair do campo sem o fazerem a provocar os adeptos benfiquistas!
Grande jogo de futebol em Leiria, esta noite. No feminino, na final da Supertaça. Sim, na Supertaça do futebol feminino os finalistas apuram-se num torneio a quatro. É uma final, ao contrário do que acontece no futebol masculino. Aí chamam-lhe final, porque querem...
Teve tudo o que um jogo de futebol pode ter. Emoção, golos, espectáculo e intensidade, tudo embrulhado em futebol do bom. E, como por cá não pode deixar de ser, muitos casos de arbitragem. Mas também muito fair-play, dentro e fora do relvado.
Só ficou decidido no prolongamento, para onde foi empurrado pela arbitragem e, tem de dizer-se também, pela guarda-redes do Sporting. Não sei se não será melhor que o Adan, mas é muito melhor que o Porro.
As jogadoras do Benfica fizeram tudo para resolver as coisas nos 90 minutos, mas foram obrigadas a meia hora extraordinária. Estiveram sempre por cima do jogo, mas viram-se a perder com um penálti mais que caricato descoberto - melhor, inventado - pelo VAR. A partir daí sufocaram as adversárias, fizeram brilhar a extraordinária guarda-redes do Sporting, chegaram ao empate numa grande jogada de futebol e desperdiçaram uma mão cheia de oportunidades para marcar. Para compor o ramalhete, a 3 minutos dos 90 o VAR convenceu a árbitra a reverter o único verdadeiro penálti dos 90 minutos do jogo. Não admirou, até porque, no outro, já no prolongamento, numa mão na grande área que toda a gente viu, o VAR também teve dúvidas.
No prolongamento começou tudo finalmente a resolver-se. O Benfica marcou três golos, chegou ao 4-1, e podia ter marcado mais do dobro. Pelo que se viu em campo, se calhar três ou quatro jogadoras davam jeito a Roger Schemidt. Bom, no caso da Kika Nazaré, dá vontade de dizer que seria a Kika e mais dez!
Não sei se o José António Saraiva viu este jogo. Não viu, provavelmente...
Com uma arbitragem manhosa, e contra um adversário manhoso, em que cada jogador tem a sua manha, a disputa desta Supertaça não era tarefa fácil para este Benfica.
Aos manhosos que já tinha, o Porto acrescentou este ano um manhoso especialista na manha penaltis. São uns atrás dos outros, já nem têm conta. As arbitragens manhosas fazem o resto. Na realidade nem é preciso que o Taremi aprofunde muitos os seus talentos na arte de enganar os árbitros. Eles gostam. Hoje nem precisou de procurar no baú a mais requintada das suas habilidades. Se já foram marcados penaltis por Marega chutar contra as pernas do adversário, porque é que não haveria de de ser marcado por atirar a perna para cima do guarda-redes?
Nas leis do jogo, penalti é quando o guarda-redes se atira para cima do adversário. Nas leis da manha basta que o avançado se atire para cima do guarda-redes. Nos foras de jogo também não há nada que a manha não resolva. Arranjam-se sempre as linhas manhosas.
Foi isto a primeira parte. Pouco futebol e muita manha. Daí um manhoso 1-0 ao intervalo, a condicionar decisivamente o resto do jogo.
A segunda parte teve menos manha e mais jogo. A começar logo no arranque pela falta de manha de Darwin, que surgiu isolado frente a Marchesin e saltou por cima do guarda redes, e da perna que ele levantou bem alto, para evitar o contacto. Manha que já não faltou ao Corona - o tal que, por falar em manhas, estava em dúvida para o jogo, como o Octávio - quando despachou a bola a toda a pressa depois de a ter ajeitado com o braço dentro da área, na sequência da cobrança do livre de Grimaldo que levou a bola aos ferros. Nem ao árbitro Hugo Miguel, que não viu. Nem tinha visto que a falta de Sérgio Oliveira, de que resultou esse livre, teria que ter dado o segundo amarelo.
Depois das manhas, uma espécie de ambiente geral, há as circunstâncias próprias do jogo. O lance do penalti manhoso sucedeu a uma transição rápida do Rafa que, em vez de escolher entre por pelo menos duas opções de passe que tinha, optou por seguir sozinho com a bola até a perder, à entrada da área portista. E o lance do segundo golo, já no fim do jogo, resultou de mais um passe falhado de Taarabt, com a equipa toda lançada para o ataque, à procura do empate.
Depois do ambiente, e das circunstâncias, há o que resta do jogo. O que foi jogado. E aí viu-se sempre um Porto mais forte, mais trabalhado, a jogar mais e muito mais competitivo. E viu-se um Benfica que nem aquele seu futebolzinho foi capaz de ensaiar. Que nunca conseguiu fazer três passes seguidos, e que se limitou a chutar a bola para a frente, à espera que o Darwin a agarrasse. Que em todo o jogo construiu e finalizou uma única jogada, concluída pelo Grimaldo, com uma grande defesa de Marchesin, logo a seguir ao penalti do golo de Porto. E que, para além dessa oportunidade de golo, apenas criou perigo nos dois livres do lateral esquerdo espanhol, o tal da bola nos ferros e, antes, no outro bem defendido pelo guarda redes portista.
Muito pouco. Tão pouco quanto é o pouco que vai valendo este Benfica de Jorge Jesus e Vieira.
O Porto fez muito mais? Não. Mas nem precisou para ganhar claramente o jogo, arrecadar mais um troféu, e ferir o Benfica mais uma vez. Vamos ver com consequências para o resto da época, e para os próximos confrontos. Pela experiência, não serão difíceis de adivinhar!
Um 5-0 num dérbi é sempre um resultado extraordinário. Num jogo decisivo, como é este que decide a Supertaça, o primeiro troféu da época, é ainda mais marcante.
Não foi uma exibição fulgurante do Benfica, mesmo que a fulgurância do futebol do campeão nacional tenha aparecido em diversos momentos do jogo, especialmente na segunda parte, aquela que deu expressão à vitória da equipa de Bruno Lage. Mas foi sempre uma exibição segura e categórica.
O Sporting entrou em campo com a ideia de dar prioridade a defender, com uma linha defensiva de cinco unidades, num atípico 5-4-1(não, não foi 3-4-3!). E a primeira parte foi mexida e relativamente interessante, com o Benfica mais afirmativo, e mais colectivo e o Sporting mais reactivo, o que não impediu que fossem suas as primeiras oportunidades desse período. Logo aos 2 minutos, num desvio desastrado de Ferro, a obrigar Odysseas a trabalho de qualidade, e a dizer presente. E depois, por duas vezes, a opor-se a Bruno Fernandes, primeiro num grande voo a desviar um remate de longe e, depois, a sair-lhe aos pés.
Nada que alguma vez tenha desequilibrado a equipa do Benfica, que acabou por chegar ao golo a cinco minutos do intervalo, quando deixava já a ideia de mandar no jogo. No Sporting sobressaíram então alguns jogadores, e a verdade é que, a nível individual houve mesmo mais jogadores a distinguirem-se que propriamente do Benfica. Lembro Thierry Correia, o jovem lateral direito que deu nas vistas, Wendel e Raphinha. Mais que o inevitável Bruno Fernandes, inevitavelmente de despedida.
Na segunda parte foi diferente, e a superioridade benfiquista foi simplesmente esmagadora. E a goleada poderia até ter subido para números ainda mais penalizadores para o Sporting, tantas as oportunidades de golo construídas pela equipa do Benfica. Que teve fases de puro brilhantismo, com todos os jogadores num nível exibicional muito elevado, mesmo que Pizzi e Rafa, pelos golos, pelas assistências e pelo que jogaram, tenham de merecer particular destaque, enquanto os jogadores do Sporting iam perdendo a cabeça.
Claro que este é um excelente arranque de época para o Benfica. Já o vinha sendo com os resultados (o Benfica ganhou a International Champions Cup, um troféu que apenas os maiores clubes do actual futebol mundial lograram conquistar, com três vitórias) e as exibições nos jogos de preparação, mas esta goleada frente ao velho rival é a cereja no topo do bolo.
Com tudo o que fez o ano passado, nas condições que se conhecem, agora que Bruno Lage preparou a equipa desde o início, e com este arranque, abrem-se as melhores expectativas para a caminhada para o 38.
Com a Supertaça, a tal competição de um só jogo que, quando chega a altura de fazer contas aos títulos, entra no mesmo saco do campeonato e da Taça, abriu a época de futebol.
E logo a abrir deu para perceber que está tudo na mesma. Nas bancadas canta-se para provocar um rival que não está presente, nem tem nada a ver com o jogo. No relvado pressiona-se o árbitro, no banco pressiona-se tudo. No fim, ganha o Porto. E no fim continua a pressionar tudo...
Aí está de volta o futebol de competição. E aí está o Benfica de volta às conquistas, parece que agora de pazes feitas com a Supertaça.
A primeira resposta que se esperava deste jogo em Aveiro tinha exactamente a ver com a imagem que o Benfica trazia da pré-época que, como se sabe, deixava algumas preocupações. Começando por aí, deve dizer-se que a resposta não foi categórica e inequívoca. O jogo não disse que o Benfica da pré-época não passou de uma núvem passageira, mas também não disse, nem ninguém esperaria que o dissesse, que a equipa tem todos os problemas resolvidos.
Na primeira parte até chegou a parecer que sim. Aos dez minutos o já Benfica tinha marcado por duas vezes - Jonas e Sferovic, nas duas únicas oportunidades, é certo - e tinha o adversário completamente subjugado. O Vitória estava no tapete, e toda a gente se lembrava daquele jogo do título, daqueles 5-0 da Luz.
Já quase ninguém se lembrava de Nelson Semedo nem de LIndelof. E até o Varela fazia questão de jogar à Ederson, quase sempre bem sucedido. Só que as oportunidades de golo, tão soberbamente aproveitadas nos primeiros dez minutos, passaram a ser esbanjadas, algumas por excesso de arte, e lá vem aquela velha máxima do futebol: "quem não marca, sofre". E à beira do intervalo, num lance esquisito, caído do céu mas em que estiveram bem presentes os tais problemas na defesa, o Vitória fez o golo. E saiu para o intervalo com um resultado notoriamente lisongeiro.
Admitia-se que aquele golo, ressuscitando a equipa vimaranense, e trazendo-a de novo para a discussão do resultado, fosseum tónico para a segunda parte. Se os primeiros dez minutos - outra vez os os primeiros dez minutos - pareciam desmentir essa tese, com o Benfica a voltar a desperdiçar duas claras oportundades de golo, a partir daí confirmou-se em absoluto. Os últimos 5 minutos do primeiro quarto de hora, e todo o segundo, foram de clara supremacia vitoriana. O Benfica quebrou fisicamente, e os jogadores de Guimarães ganhavam todas as bolas divididas, todos os ressaltos e chegavam sempre primeiro. E o empate esteve à vista, em uma ou duas ocasiões.
No último quarto de hora o Benfica voltou a ficar por cima e fechou o jogo com o terceiro golo, agora por Jimenz, acabado de entrar para render o tantástico, mas já esgotado, Jonas. Antes, tinham entrado Filipe Augusto, que continua a não convencer, mas que permitiu outra liberdade a Pizzi, o melhor da época passada e, para não deixar dúvidas, o melhor da Supertaça. E Eliseu, para substituir Grimaldo, de novo lesionado.
Merecem ainda referência os adeptos, e os de Guimarães voltaram a ser fantásticos, e o velho Luisão. A partir de hoje o jogador do Benfica com mais troféus. À capitão. À grande capitão!
Foi um jogo de sentimentos contraditórios, um jogo de sinais contrários, como que um jogo de espelhos.
O Benfica jogou bem e criou muitas oportunidades de golo. Mas falhou-as sucessivamente, umas atrás das outras, e sabe-se que haverá poucos jogos com metade das oportunidades hoje criadas. O que quer dizer que, com esta taxa de eficácia, não se ganham jogos. E viu-se que não é com Talisca que se marcam golos. E esperar que sejam os defesas adversários a fazê-lo… Bom, foi até Jardel quem mais perto esteve disso…
Jogou bem, e Enzo e Gaitan fizeram a diferença. Mas sabe-se que qualquer deles, ou mesmo ambos, poderão sair até ao fim do mês.
Jogou bem, a equipa mostrou rotinas. Mas também só no prolongamento teve mais que dois jogadores chegados esta época. E lá vem o copo: meio cheio ou meio vazio. Meio vazio porque o Enzo já disse adeus, e o copo fica logo vazio. Meio vazio porque já não houve banco…
Meio cheio para os militantes do optimismo, porque só falta a finalização... E como vem aí o tal avançado...
Mas também o próprio jogo foi todo ele feito de uma coisa e do seu contrário. O Benfica só atacou, mas não conseguia marcar, e o Rio Ave, que só defendeu, não podia. O inevitável prolongamento parecia ser mais penalizante para a equipa de Vila do Conde, que jogara a pré-eliminatória para a Liga Europa na passada quinta-feira, quando o Benfica tinha feito o último jogo há uma semana. Mas também poderia ser ao contrário: o Rio Ave está muito mais adiantado na preparação, e no Benfica três jogadores chave – a dupla de centrais e Enzo – jogaram pela primeira vez nesta época. E foram mesmo os jogadores do Benfica que mais acusaram o esforço do prolongamento. Sem golos, evidentemente. Porque o Benfica continuou a falhar e porque o Jardel falhou o auto-golo.
Chegaram os penaltis, e aí o favoritismo ia todo direitinho para o Rio Ave. De um lado estava um guarda-redes moralizado, que tinha defendido tudo, e ainda sem sofrer um único golo nos três jogos oficiais. Do outro estava o super causticado Artur, um dos réus da pré-época e inclusivamente posto de fora por toda a imprensa da especialidade.
E foi precisamente o Artur a resolver, defendendo não um, não dois, mas três penaltis…
No meio disto tudo, se calhar o menos importante é que a supertaça tenha voltado às vitrinas do museu do Benfica. Sempre me pareceu que a supertaça não tinha grande importância. O que importa é o que ela diz, o que em cada momento simboliza… Se calhar é por isso que logo se fez em cacos!
Há muito que desconfiava que a Supertaça era uma grande prova do calendário nacional de futebol. Quando via a contabilidade dos títulos ela lá aparecia, lado a lado com os campeonatos nacionais e as taças de Portugal. Contava tanto como qualquer um daqueles dois. Cheguei a pensar que era assim porque dava jeito, mas estava certamente enganado!
O que eu estava longe de imaginar era que a Supertaça fosse mesmo o principal troféu das competições nacionais de futebol, o título por que, afinal, as equipas competem ao longo de todo ano. Ninguém está interessado em ganhar o campeonato ou a taça, o que todas as equipas procuram é garantir o apuramento para a final da supertaça. O campeonato nacional e a taça de Portugal não são mais que simples fases de apuramento para a grande final que se disputa em Agosto!
Jogar sem bola é uma das maiores preciosidades do futebolês. Como é que de um jogo em que a bola é a figura central, como já aqui vimos a propósito de beijos, de bolas paradas ou mesmo de segundas bolas, pode nascer a sua mais absurda negação?
Como é que é possível jogar sem bola um jogo que só se joga com bola?
Em futebolês tudo é possível. E tudo se explica, como temos visto!
Naturalmente que, num jogo com uma única bola para 22 tipos, falta bola e sobram jogadores. No final de um jogo, ao cabo dos 90 minutos, que em Portugal, falando de tempo útil de jogo, se transformam em cerca de metade, teríamos uma média de 2 minutos de bola para cada jogador. Pois é, um jogador quando entre em campo leva uma perspectiva de passar pouco mais de 2 minutos com a bola e os restantes 88 a vê-la passar.
Já começamos todos a perceber a importância de jogar sem bola. É que se não soubessem ocupar todo esse tempo imenso os jogadores seriam os tipos mais frustrados do mundo. E não consta que assim seja!
É à forma de ocupar todo esse tempo que se entregam as maiores especulações filosóficas dos mais variados gurus da bola. É delas que nascem as mais impressionantes teorias de ocupação de espaços e os mais arrojados desenhos de pressing.
Mas, para além deste eminente conceito de futebolês, há muito jogo sem bola à volta do futebol. Sem bola, sem balizas e mesmo sem campo! Chamam-lhe, ainda em futebolês, o jogo fora das quatro linhas! Que nada tem a ver com o jogo jogado…
É o jogo de bastidores, o jogo de influências, o jogo psicológico… São os mind games que aqui trouxemos há duas semanas! Que, umas vezes legítima outras ilegitimamente, influenciam desempenhos e determinam resultados.
Não é por acaso que os dois grandes rivais do futebol indígena – Benfica e Porto, à revelia da teimosia dos sportinguistas (que aproveito para saudar pela fantástica “remontada” de ontem, a beneficiar de um frango mas com um terceiro golo de imenso mérito) que insistem em ver no Benfica o seu principal rival – têm desempenhos em perfeita simetria. Dificilmente estarão ambos bem, ao ponto de raramente serem primeiro e segundo.
Aí estão os resultados da última liga: a um Benfica demolidor e campeão opôs-se um Porto em queda livre que não passou do terceiro lugar, fora da Champions, onde, com todo o mérito e brilhantismo, está agora o Braga. E aí está a nova liga, acabada de começar: a um Porto dominador e já na liderança contrapõe-se um Benfica com duas derrotas nos dois jogos, tantas quantas averbara em toda a época passada, às voltas com os seus fantasmas renascidos de um Roberto sem asas para voos de águia.
Mais influente que qualquer jogo de bastidores – jogo onde o Porto por norma, e de há muito a esta parte, se superioriza – é a posição relativa de cada um. A posição dominante de um fragiliza, ela própria, o outro (e aqui há um certo paralelismo com a vivência da rivalidade no Sporting: na paz dos anjos se está atrás do Porto, mas no maior dos dramas se o fosso é para o Benfica)! Daí que, como aqui tenho feito notar, Jorge Jesus tenha cometido o maior dos erros ao desvalorizar a supertaça. A vantagem pendia toda para o lado do Benfica: pela embalagem trazida da época anterior, porque mantinha a estrutura e o treinador, porque era o campeão. E porque do outro lado estava um Porto titubeante, com um novo treinador que era ainda um treinador novo. E inexperiente. Um Porto com a máquina entorpecida, se não já enferrujada.
Porto e Benfica dispõem de dois suplementos decisivos, mobilizados em absoluta sintonia com o desempenho das suas equipas: no Benfica é a mola imparável da sua massa adepta, que faz acordar o gigante e tremer de medo os rivais; no Porto é a máquina de ganhar, a mesma que manobra como ninguém as incidências, as contingências e os bastidores do jogo, e que quando arranca, livre e desimpedida, é extraordinariamente difícil de parar.
Com aquele erro decisivo Jorge Jesus permitiu que se desse à chave da máquina de ganhar do Porto. E que fosse posta em funcionamento!
Ao invés, no Benfica transformou oportunidades em ameaças, com fantasmas a surgirem de todos os lados: Ramires, Di Maria e, claro, Roberto. Pior, começa a surgir o mais perigoso de todos os fantasmas: o da autoridade do próprio Jesus! Mais que pela responsabilidade na contratação do guarda-redes – facilmente perdoável e esquecida no meio da enorme margem de crédito forjada nas conquistas da época passada –, pela insistência, contra todas as evidências de incompetência e de um pânico generalizado e espalhado por toda a equipa, em mantê-lo na baliza. Um erro de consequências imprevisíveis, a começar pelas dificuldades criadas ao seu substituto. E ao substituto do seu substituto, se a lei de Murphy, que aqui trago tantas vezes, insistir em confirmar-se!
E claro, no meio de tudo isto, em vez de da tal mola humana que leva a equipa ao colo (ou no andor, como os rivais gostam de provocar), a nação benfiquista está perdida e dividida entre os que defendem que benfiquistas são os que, em nome da tranquilidade da equipa, calam a sua voz crítica e os que, pelo contrário, acham que, ficando calados, como fizeram em tempos não muito longínquos, estão a ser cúmplices de uma tragédia.
É assim que, enquanto a uns até fica mal chorar os penalties que vão ficando por marcar, outros vão vendo penalties e livres caídos do céu resultarem em golos e vitórias incontestados. Ou a máquina de ganhar a funcionar a todo o vapor…
O futebolês não se fica apenas pelo português e afins. Também, como não poderia deixar de ser nos tempos que correm, se aventura pelos anglicismos. Não tanto como o seu parente economês – verdadeiramente imbatível – mas não deixa os seus créditos por mãos alheias!
O que são então os mind games?
Para os mais familiarizados com a língua de Shakespeare são isso mesmo: os jogos mentais, as jogadas psicológicas. Para os outros são aquelas tiradas provocatórias, atiradas com a precisão de um míssil, com o objectivo de destabilizar o adversário.
Temos uma Universidade em Portugal – fundada por José Maria Pedroto no Porto – e um catedrático apontado como o maior especialista mundial – José Mourinho, of course – mas não temos muita gente especialmente dotada. Não faz mind games quem quer. Não é para todos!
Alguns bem se esforçam mas, o melhor que conseguem são umas tiradas infelizes. Outros, no entanto, fazem mind games mesmo sem querer: qualquer palavra é um míssil de longo alcance.
É à medida que a competição aquece que os mind games começam a ganhar vida.
Com a primeira competição da época – a supertaça, disputada no passado sábado, ganha (e bem) pelo FCP, e que, também numa espécie de mind game, alguns tentam misturar na contabilidade dos títulos, somando alhos (campeonatos) com bugalhos (supertaças), não fosse o Porto a capital dos mind games – não se viu grande coisa.
Ou melhor, viu-se a confirmação de que não faz game minds quem quer. Apenas quem pode! E viu-se que Jorge Jesus não pode. Se aquela do “é muito difícil alguma equipa ganhar ao actual Benfica” foi o seu mind game, foi muito fraquinho. Pior, é daquelas em que o tiro sai facilmente pela culatra.
“Um treinador pode saber muito de futebol, mas se souber só de futebol pouco sabe de futebol” – este é um princípio enunciado pelo Prof. Manuel Sérgio, o nosso académico e filósofo do futebol. Este é o grande drama de Jesus: esquecer-se que o futebol não se limita à recepção, ao passe, à desmarcação, à ocupação de espaços… Há ainda muito mais, há alma, há determinação, há espírito de conquista. Há a atitude … Como se viu naquele jogo da supertaça!
Quem tem em mãos a mais cara equipa do futebol nacional, quem, mesmo assim, continua a pedir mais e mais jogadores, e quem tem que assumir responsabilidades adequadas ao esforço que a SAD está a desenvolver para devolver ao Benfica o prestígio do passado, não pode estabelecer prioridades que subvertam esse objectivo. Não pode dizer que a supertaça não é prioridade, que a prioridade é o campeonato. Não! Para o Benfica e para os benfiquistas ganhar ao FCP é sempre prioritário. Tal e qual como do outro lado: para o FCP é sempre prioritário ganhar ao Benfica, e essa é uma prioridade que toda a gente percebe!
Ganhar esta supertaça era absolutamente prioritário para o Benfica. Jorge Jesus tinha de perceber isto, tinha de mostrar que o percebera e de mostrar inequívoca competência para o fazer. Não tanto pelo título em si, mas por ser uma prova onde o domínio do adversário é avassalador e, fundamentalmente, para deixar clara uma marca de superioridade, numa altura em que o adversário passava por grandes necessidades de afirmação: treinador novo, pré-época instável, desequilíbrios defensivos, uma certa orfandade de liderança em campo …
Jorge Jesus falhou e assim perdeu o Benfica a oportunidade de romper com o status quo. E tudo ficou como dantes: um Porto à Porto, um Benfica … à Benfica das últimas décadas (subalterno, tolhido, sem chama nem alma, que corre menos, que luta menos, que acredita menos, que provoca menos e que é menos esperto que o Porto) e até um árbitro à árbitro (com dois penáltis por assinalar a favor do Benfica e, depois, uma compensação deplorável no aspecto disciplinar).
O campeonato começa já este fim-de-semana. A Jesus coloca-se, agora sim, um grande desafio: o difícil não é chegar ao topo, é manter-se lá! Soube lidar com as circunstâncias que lhe moldavam o lado pessoal: revisão do contrato numa mistura de rentabilização de méritos próprios com outros mind games. Falta ver se saberá lidar com as que lhe moldam a aptidão para o sucesso.
É simples: este é um campeonato decisivo, aquele que poderá inverter um ciclo. O bicampeonato é fundamental para o Benfica – transformará o título da época passada no início de um novo ciclo. Sem confirmação nesta época o último título não passará de um mero acidente no percurso da hegemonia portista. É precisamente por isso que, ao invés, é fundamental para o Porto não perder este campeonato para o Benfica. O FCP sabe bem que é muito diferente perder dois ou três títulos para o Sporting e para o Boavista ou perdê-los para o Benfica.
É tudo isto que o treinador do Benfica tem que perceber rapidamente. E deixar os benfiquistas perceberem que ele já percebeu. Com ou sem mind games! E, de preferência, sem hipotecar o sucesso a invenções e teimosias estéreis. Como a do Roberto que, como toda a gente percebe, está a condicionar toda a equipa.
Acompanhe-nos
Pesquisar
Subscrever por e-mail
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.