À luz do que hoje se viu nesta surpreendente meia-final entre as selecções de França e de Marrocos, a surpresa não esteve não esteve no extraordinário percurso dos marroquinos até aqui, neste mundial do Catar.
Não esteve no apuramento no primeiro lugar do seu grupo, à frente da Croácia, e da Bélgica e do Canadá. Não esteve na surpreendente eliminação da favorita Espanha. Nem esteve na então já menos surpreendente forma como mandaram a selecção portuguesa para casa, já nos quartos de final do nosso descontentamento.
A surpresa, a grande surpresa, esteve na forma como os marroquinos disputaram esta semi-final. Desde logo porque tiveram que a disputar em condições completamente diferentes daquelas com que tinham lidado ao longo de todo o percurso. Com três baixas importantes na equipa, duas logo na dupla de centrais, e com um golo - o primeiro marcado por um adversário - sofrido logo nos primeiros cinco minutos a equipa marroquina teve de se virar do avesso.
E, virada do avesso, vimos uma equipa que tinha provado que sabia defender, saber atacar. Que tinha em média pouco mais de 20% de posse de bola, passar a ser a dona da bola. Surpresa foi que não ser o seu extraordinário guarda redes a figura do jogo, que não fez uma única defesa, mas ser Lloris a ter que brilhar. Surpresa foi ser quase sempre melhor que a melhor, e a mais qualificada, selecção da competição. Que a campeã do mundo em título, e favorita à revalidação.
Não há surpresa na vitória feliz da França - em três oportunidades, marcou dois golos felizes, a abrir e a fechar o jogo; enquanto, na sua baliza, não havia forma da bola entrar. Porque é isso - é melhor! Não há injustiça, porque no futebol a justiça faz-se de resultados. Mas a grande surpresa desta selecção de Marrocos aconteceu neste jogo!
Começou a desenhar-se logo no início do jogo, e durou até mesmo ao fim. Quando, aos cinco minutos de jogo, olhamos para o desenho do jogo e vimos três jogadores franceses no meio da linha de defesa marroquina, e mais três entre linhas, percebemos que estava ali a chave do jogo. Quando Griezmann escapou e conseguiu entregar a bola atrasada para Mbappé rematar contra Hakimi, levando-a a sobrar para Theo Hernandez, sozinho no espaço que pertencia o lateral direito do PSG, acrobaticamente a enfiar na baliza, o destino parecia traçado. E não era outro que, a ganhar, a melhor equipa, passaria a mandar no jogo. E, a perder, a equipa que só defendia, sem nada já para defender, afundar-se-ia.
Não aconteceu nada disso. Aconteceu tudo ao contrário. Quem era suposta mandar, passou a ter que obedecer. Quem tinha como destino afundar-se, levantou a cabeça e passou a mandar. Não ganhou o jogo, acabando até por voltar a sofrer novo golo a dez minutos do fim, de novo com um remate de Mbappé a ser desviado por um adversário, com a bola sobrar para Kolo Muani, o avançado do Eintracht que acabara de entrar, empurrar, junto ao poste, a bola para a baliza na primeira vez que lhe tocou. Mas ganhou o respeito que todas as surpresas anteriores não tinham sido suficientes para ganhar.
É costume dizer-se nessas surpresas, que a equipa tida por mais fraca ganhou o único jogo que ganharia em dez. Admito que muitos o tenham dito da vitória de Marrocos sobre a selecção portuguesa, no passado sábado. Mas, a jogar como então jogou a nossa selecção, e a fazê-lo como hoje fez a marroquina, fico com a ideia que, ao contrário, em dez jogos, seria a portuguesa a ganhar um.
Nenhuma surpresa nas eleições regionais nos Açores. Nenhuma novidade na quinta maioria absoluta do PS - a segunda de Vasco Cordeiro. Nenhuma novidade na abstenção galopante - já está praticamente nos 60%. Se não preocupa ninguém, deveria preocupar toda a gente. Nenhuma surpresa no ar triunfal da Cristas. Nem sequer no bem preenchido séquito com que se apresentou a festejar não se sabe bem o quê. Que apenas realçou ainda mais a solidão de Passos Coelho na hora de mais uma derrota.
Passos, sozinho, também já não é novidade. E muito menos surpresa!
Acho extraordinária a surpresa, que não a indignação, da generalidade dos "supporters" de Passos Coelho por se ter prestado a apresentar um livro que, ao que se diz, não passa de umas miseráveis folhas de papel envergonhadas pelo que nelas está escrito.
Compreendo a indignação de todos eles, gente que escreve e se faz ouvir todos os dias em hossanas que não se cansam de cantar a seriredade, a integridade e os princípios do ex-primeiro-mimistro. Acham esta atitude de Passos Coelho um acto de traição insuportável.
Não compreendo a surpreza, e muito menos a desculpabilização que muitos estão a montar em cima de expressões como amadorismo, simplicidade e ingenuidade. Há até quem ache que foi uma casca de banana de que Passos Coelho se não conseguiu desviar.
Não há razão para nenhuma surpresa em ver Passos Coelho associar-se à publicação de um livro que toda a gente diz ser miserável, ao nível do esgoto.
Desde logo porque, se o autor o convida, é porque encontra nele um conjunto de afinidades que faz as coisas baterem certo. E é correspondido: um dos argumentos que o líder do PSD utiliza para justificar a sua conivência é a "admiração pessoal pelo autor". De resto, o único em que podemos acreditar. O outro, de que "não é homem para voltar com a palavra atrás", é de falsidade mais que provada.
Mas para além da afinidade pessoal outras há que matam qualquer surpresa que pudesse haver na ligação do ex-primeiro ministro a esta coisa que todos vivamente repudiam. A primeira, e a mãe de todas, está no vazio. No vazio de ideias que hoje caracteriza o PSD à imagem e semelhança de Passos Coelho e da sua entourage. E no vazio de valores, sem qualquer respeito pela coerência, pela verdade e pela dignidade, que só pode abrir uma via verde para a decadência.
A leviandade de quem diz uma coisa e o seu contrário, as inutilidades que se ouvem nas chamadas Universidades de Verão, ou o voyeurismo de um líder da jota num dos mais decadentes reality shows da tv portuguesa, são apenas evidentes pontos de contacto entre as obras de Saraiva e de Passos.
Percebo que os spin doctors não gostem muito que estas evidências venham ao de cima. Mas não venham com surpresas. É que é possível esconder muita coisa durante muito tempo, mas não é possível esconder tudo, sempre. Nalgum momento a realidade vem espreitar ... e mostra-se!
Aí está o primeiro orçamento aprovado pela esquerda, unida. Já não é surpresa, surpresa seria agora se o não fosse.
Surpresa é ver o liberais como Vítor Bento, e o PCP, do mesmo lado. Se esse lado for o da nacionalização de um banco, não é surpresa encontrar lá o PCP. Supresa é lá estar Vítor Bento. Mas se esse banco for o Novo dito, já com mais de mil milhões de prejuízos acumulados em menos de dois anos, já não é surpresa que lá esteja... Nacionalizar prejuízos - para os liberais - não é bem nacionalizar. Já para o PC, nacionalizar é bom porque sim. Porque lhe está na massa do sangue. E lá se vão as surpresas...
Surpresa também não é o bastonário da Ordem dos Médicos se opor à legalização da eutanásia. Já o sabíamos, mesmo que não saibamos onde acaba a posição pessoal e começa a corporativa. Surpresa é a argumentação rasca. Surpresa é que caia na pantominice de dizer que, com a eutanásia, quem hoje violenta física ou psicologicamente os idosos passaria a matá-los.
É isto que o bastonário está a dizer quando invoca estudos que indicarão que "um quarto dos idosos é submetido a alguma forma de violência, seja física, seja psicológica”, para concluir que "certamente todos percebemos com facilidade que esses idosos que são submetidos a essas formas de violência, a partir do momento em que seja descriminalizada/ legalizada a eutanásia, vão ser coagidos a optar pela eutanásia".
Surpresa é que pessoas destas não encontrem formas mais sérias de defender as suas ideias.
Mas, surpresa mesmo, é que um alto magistrado do mais importante orgão de investigação de crimes de colarinho branco seja detido por suspeita de corrupção. Ou será que não?
No último dos jonais de ontem - melhor, no primeiro de hoje - da RTP Informação demos por Paulo Portas, depois de uma interminável sequência propagandística da coligação em que alternava com Passos, num jantar debate com a Confederação do Turismo.
A peça seguia-se, no alinhamento do bloco de notícias, a outra de apresentação dos candidatos por Lisboa. O costume, pensei de imediato: participações em actos da governação a confundirem-se com participações em actos de campanha eleitoral.
Estava eu a deixar-me tomar por esta sensação promíscua quando reparo que Portas estava a tentar responder a uma questão colocada pela audiência, a propósito do plano estratégico para o sector. E de imediato percebo que o número dois do governo estava a fazer uma figura igualzinha à que, há dias, víramos a ministra da administração interna fazer a propósito do estatuto da GNR. Nem mais nem menos, exactamente a mesma, o que é de todo surpreendente num dos maiores génios do verbo fácil.
Mas a verdade é que o homem não saía dali, não arrumava uma ideia, não articulava palavra, gaguejava e portantava sem cessar... Só que, com mais sorte que a sua colega de governo, tinha ali ao lado o secretário de estado. E, depois de tanto patinar, lá acabou por endossar o assunto "ao senhor secretário de estado" que, esse sim, trataria de dar a informação que continuava a faltar dar.
A peça já não transmitiu mais que a imagem de Adolfo Mesquita Nunes, feito anjo da guarda, a pegar no microfone sem esconder um sorriso aberto. Não ficamos a saber o que respondeu. Mas ficamos a saber que Paulo Portas não faz a mínima ideia do que seja isso de plano estratégico para o turismo.
Convenhamos que, depois do brilhante trabalho que apresentou para a reforma do Estado, não é surpresa nenhuma. Surpesa mesmo é que o mestre da pantominice tenha ficado sem pio!
É a sensação deste mundial. Saída directamente do pote dos mais fracos, inocente para ser emolado em oferenda de sacrifício aos três deuses campeões do mundo, feitos para mandar no grupo D, também chamado da morte, a Costa Rica, surpreendendo tudo e todos, já está apurada para os oitavos.
Feita para estar agora a acompanhar um desses campeões do mundo no regresso a casa, acaba de mandar embora um deles, e logo a excitante Inglaterra. Que era, por razões diferentes, parte tão interessada quanto o Uruguai na esperada vitória da Itália. Que não ganhou, perdeu (0-1) e perdeu bem - ainda com um penalti por assinalar, sobre o excelente Campbell - perante uma equipa que é, antes mais, uma equipa. Mas que, depois, é uma equipa com uma clara ideia de jogo, com jogadores que tratam muito bem a bola, que faz circulação quase tão bem como o tiki-taka dos bons velhos tempos, que pressiona alto e que joga com a defesa a cinco – ou a três, para quem entende assim – que tão bem sucedida está a ser neste mundial. No caso uma defesa muito subida que, com uma organização soberba, nunca é apanhada em falso. Raramente é surpreendida, com as costas bem protegidas … pelo fora de jogo.
Se já o tinha mostrado frente ao Uruguai, no primeiro jogo, hoje confirmou – mais, refinou ainda – todos esses atributos, dando um banho de bola à Itália. Que nunca (uma única vez é a excepção que confirma a regra) conseguiu entrar naquela defesa, e que deve ter batido o recorde dos fora de jogo!
O mais estranho desta Costa Rica sem tradição nem história no futebol é que não é composta por talentosos jovens desconhecidos. À excepção do avançado Joel Campbell (na foto), o jovem de 21 anos - completa dentro de dias 22 - que pertence aos quadros do Arsenal mas onde ainda nem sequer jogou, e para já a revelação deste campeonato do mundo, as suas principais figuras são jogadores que não são exactamente jovens e que actuam na Europa. Não na Europa de primeira mas, no que a futebol diz respeito, na de segunda linha. A estrela, o 10 Brian Ruiz, tem 28 anos e joga na Holanda, no PSV. Chrisitian Bolaños, um ala, tem 30 e joga no Copenhague, da Dinamarca. Celso Borges, pivot defensivo, tem 27 anos e joga na Suécia, no AIK. E poderíamos falar de Gambôa, Tejeda ou do espectacular lateral direito Júnior Diaz, que já vai nos 31 anos e joga na Alemanha, no desconhecido Mainz. Conhecemos o guarda-redes Navas (27 anos) porque joga no campeonato espanhol, no Levante.
Aconteça o que acontecer, a Costa Rica é já a grande selecção deste mundial. Despachou já dois campeões mundiais, e o mandou o terceiro embora ainda sem sequer o ter defrontado. E, porque já se percebeu que a continentalidade conta, e porque a própria carreira da Costa Rica se encarregou de limpar a feia imagem do Uruguai da primeira jornada, ninguém ficará muito surpreendido se for a Itália a acompanhar a Inglaterra…
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