Por que é que as pessoas votam na continuação desta governação?
Por Eduardo Louro
Nos meus tempos do liceu o sumário de cada aula era escrito no quadro. Às vezes lá aparecia: “Continuação da aula anterior”. Nas campanhas eleitorais, os partidos apresentam programas – ninguém lhes liga muito, é verdade, mas apresentam. Comos os professores apresentavam os sumários. A coligação não apresenta programa, o sumário é: continuação da governação anterior.
Chegados aqui parece que é fácil perceber o que está em causa nestas eleições. O eleitorado só teria que dizer se quer a continuação da aula anterior, ou se quer matéria nova. Se quer manter a governação destes últimos quatro anos e tal – o tal é o que Cavaco quis acrescentar ao mandato – ou se quer outra coisa. Postas as coisas nestes termos, e sabendo – como se sabe pelos estudos de opinião, independentemente dos resultados das sondagens para todos os gostos que todos os dias nos chegam – que mais de 70% dos portugueses está contra este governo e esta governação, admitir que a coligação possa ganhar as eleições não poderia passar de uma aberração. Não faria sentido nenhum, não teria ponta por onde lhe pegar…
Como bem sabemos não é nada disso que se passa. Não é nada disso, e a coligação poderá até não ganhar as eleições, mas neste momento ninguém tem dúvidas que a coisa está muito apertada.
Por várias razões, certamente. Mas por duas, fundamentais. A primeira porque, em Portugal, muita gente – alguns milhões de pessoas – entende os partidos políticos como um clube. Ligam-se a um partido como se ligam a um clube, de futebol ou de outro domínio qualquer. Projectam num partido os seus sentimentos de pertença e as suas necessidades de integração e interacção. E, como se sabe, muda de tudo mas nunca se muda de clube…Quando se diz que o Partido Comunista é o que melhor fixa o seu eleitorado, é disto que se fala. Mas este é um fenómeno que em Portugal é transversal a todos os partidos, e quando chega a hora de depositar o voto muita gente fá-lo no seu partido do coração. Podem estar até revoltadas com o governo, mas quando vão votar é o seu partido que está ali no boletim, não é o governo onde o seu partido lhe fez todas as malfeitorias.
A segunda é de outra ordem, e tem a ver com a formatação de um pensamento único que não admite alternativas. Veio da Europa. Embrionado na moeda – também – única, cresceu com a crise do euro e das dívidas soberanas, e tornou-se soberano com o Tratado Orçamental. Ao assinarem o Tratado Orçamental os partidos social-democratas assinaram a sua certidão de óbito, e todos foram desaparecendo do mapa político do poder na Europa.
O PS – que tão apressadamente tratou, pela mão de Seguro, de assinar aquele Tratado – não consegue fugir deste cerco. Tem, como os outros, a sua base eleitoral, os simpatizantes com e sem cartão de sócio, mas esses nunca chegam para ninguém ganhar eleições. E aos outros é difícil convencer que sejam alternativa. Asseguram alternância. Do mal, o menos, em democracia... Mas nem sempre chega. E quanto maiores forem os medos e as ameaças, maior é a probabilidade de não chegar…
Entre a cópia e o original, as pessoas tendem a escolher o original. E quando António Costa diz que devolve em dois anos o que Passos diz devolver em quatro, só está a dizer que não é alternativa nenhuma. É, como me dizia um amigo (do PSD) com quem discutia o tema, como duas pessoas que se oferecem para, no seu carro, levar alguém ao mesmo sítio e uma diz que vai a 180 e a outra diz que vai a 120.
Pode haver quem ache mais excitante ir a 180. Ou quem valorize chegar lá um bocadinho mais cedo. Mas há certamente muita gente que acha que não vale a pena correr todos os riscos de ir a 180. Que é mais tranquilo e mais seguro fazer a viagem a 120!
Pois é…Não há leituras inteligentes dos tratados!