Aí está o primeiro orçamento aprovado pela esquerda, unida. Já não é surpresa, surpresa seria agora se o não fosse.
Surpresa é ver o liberais como Vítor Bento, e o PCP, do mesmo lado. Se esse lado for o da nacionalização de um banco, não é surpresa encontrar lá o PCP. Supresa é lá estar Vítor Bento. Mas se esse banco for o Novo dito, já com mais de mil milhões de prejuízos acumulados em menos de dois anos, já não é surpresa que lá esteja... Nacionalizar prejuízos - para os liberais - não é bem nacionalizar. Já para o PC, nacionalizar é bom porque sim. Porque lhe está na massa do sangue. E lá se vão as surpresas...
Surpresa também não é o bastonário da Ordem dos Médicos se opor à legalização da eutanásia. Já o sabíamos, mesmo que não saibamos onde acaba a posição pessoal e começa a corporativa. Surpresa é a argumentação rasca. Surpresa é que caia na pantominice de dizer que, com a eutanásia, quem hoje violenta física ou psicologicamente os idosos passaria a matá-los.
É isto que o bastonário está a dizer quando invoca estudos que indicarão que "um quarto dos idosos é submetido a alguma forma de violência, seja física, seja psicológica”, para concluir que "certamente todos percebemos com facilidade que esses idosos que são submetidos a essas formas de violência, a partir do momento em que seja descriminalizada/ legalizada a eutanásia, vão ser coagidos a optar pela eutanásia".
Surpresa é que pessoas destas não encontrem formas mais sérias de defender as suas ideias.
Mas, surpresa mesmo, é que um alto magistrado do mais importante orgão de investigação de crimes de colarinho branco seja detido por suspeita de corrupção. Ou será que não?
Vítor Bento bateu com a porta e foi-se embora, de mãos a abanar, não se cansa a imprensa de salientar, como se o normal na vida real, não seja – e deva ser – isso, quando alguém sai ao fim de dois meses.
Não é no entanto esse o ponto. Por agora o ponto é que Vítor Bento foi embora e, percebemos todos rapidamente que fez um grande favor ao governador Carlos Costa. Porque, como explicou o próprio demissionário, era oportuno que fosse substituído por alguém alinhado com o accionista.
O motivo do desalinhamento é, obviamente – tão óbvio quanto a forma como surgiu e foi divulgada a pressa –, a urgência súbita na venda do banco. Vítor Bento sabe, como todos sabemos, que vender à pressa é sempre sinónimo de vender mal. E sabendo isso, mesmo que sem recorrer à parodiada rábula de Seguro (qual é a pressa? …qual é a pressa?), não percebe qual é a pressa!
A pressa, esta pressa, é apenas mais um traço do calendário político que, percebe-se agora com toda a clareza, sempre marcou o maior escândalo financeiro do país, agravando-lhe as consequências. Foi a agenda política – do governo e da troika, não sobra hoje qualquer dúvida – que fez com que a bomba, descoberta no final de 2013, fosse atirada para a frente, para vir a cair já depois da saída limpa. É a agenda política que agora impõe a venda à pressa, para que o governo se desfaça, antes das eleições, do incómodo embrulho que também criou.
São os interesses políticos a sobreporem-se a todos os outros, sempre com os piores resultados. Sabendo-se que os actos mais danosos cometidos pela administração Espírito Santo aconteceram durante o corrente ano, e especialmente no segundo trimestre, ao que diz o próprio Banco de Portugal, fica a saber-se que teriam sido evitados se o interesse nacional se tivesse sobreposto ao interesse político de esconder o problema até à saída do programa da troika, a tal data épica, histórica, que Paulo Portas comparou ao 1º de Dezembro de 1640.