Um manual político escarrapachado num muro
Faz hoje uma semana que Trump tomou posse como presidente dos Estados Unidos da América, e o que já se pode dizer é que não está a defraudar as expectativas. Nenhuma das ameaças corre o risco de se não concretizar: o Obamacare, já era; a mentira, quotidiana e permanente, é uma infindável sucessão de factos alternativos; a comunicação social é para estar calada, e para ser desacreditada todos os dias; a tortura funciona "absolutamente" e por isso é um instrumento legítimo na estratégia de "combate ao fogo com o fogo"; os tratados comerciais já foram rasgados; e o muro na fronteira com o México já começou a ser construído.
Hoe recebe a visita da primeira-ministra britânica, Theresa May, mas para a semana já não irá receber a do presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, que a cancelou depois de Trump ter reafirmado que o muro iria ser pago pelos mexicanos. Depois de cancelada, Trump voltou ao tema e, para a confusão que tanto preza, e de que necessita como ar para respirar, lançou ele o conselho ao seu congénere e vizinho para que, se não queria pagar, não viesse.
E rapidamente garantiu que pagariam. A bem ou mal. E já que não pagam a bem pagarão a mal, através de um imposto de 20% sobre os bens importados do México, que trará uma receita de 10 mil milhões de dólares por ano.
Ora, vamos lá a ver: admitamos que Trump pode fazer isso, contra o Tratado em vigor entre os três países do continente, designado por NAFTA. Que não pode. Admitamos que, com o imposto, as importações não caem, apesar de 20% mais caras. Admitamos ainda que esse aumento no custo dessas importações não tem qualquer efeito na economia americana. E admitamos, finalmente e para facilitar, que a receita do imposto seja mesmo aquela. Mas quem é que paga esse imposto? Não são os americanos?
Então onde é que estão os mexicanos a pagar o muro?
Evidentemente que ninguém acredita que, por mais estúpido que Trump seja, o seja tanto que não perceba isto. Ele aposta é em que os americanos o não percebam. Por isso manipula, confunde e mente. Para que a manipulação, a pós-verdade e os factos alterantivos façam o seu caminho é preciso uma imprensa desacreditada, se não mesmo calada. Se resistir é incendiária, e lá vem o fogo, que se combate com o fogo...
É todo um manual político escarrapachado num muro!