Violência e circunstâncias*
Assistimos nos últimos dias a uma onda de violência e morte envolvendo jovens muito novos, entre os 14 e os 17 anos.
A série iniciou-se em Ponte de Sor, o primeiro mas também o mais mediático desta trágica sequência de acontecimentos, pelo envolvimento de dois filhos do embaixador iraquiano em Portugal, de 17 anos, numa selvática agressão que deixou outro miúdo, de 15 anos, em coma, de que felizmente acaba agora de sair. E com acesa discussão pública à volta da imunidade diplomática. E da impunidade. E da desigualdade de tratamento e de acesso à comunicação.
Prosseguiu poucos dias depois, em Gondomar, com um rapaz de 16 anos a deixar outro, de 14, às portas da morte, que infelizmente se abriram pouco depois, no Hospital. Logo de seguida, e curiosamente ainda em Gondomar, outro miúdo, também de 16 anos, foi igualmente morto. Desta vez pelas balas da polícia, na sequência de um assalto, seguido de abalroamento da viatura policial.
As circunstâncias variam em cada um dos casos. Mas, à excepção do último, que resulta directamente da prática de um crime, já á partida em modo de delinquência, as diferentes circunstâncias decorrem de evidentes comportamentos impróprios para as suas idades – a hora dos acontecimentos, madrugada alta, o consumo de álcool, e outros porventura mais discutíveis – a suscitarem questões de enquadramento social, distúrbios funcionais, ambientes familiares desestruturados, e ausência de regras e valores no processo educativo.
São problemas transversais a praticamente todas as sociedades actuais, que não são naturalmente fáceis de resolver, e que inevitavelmente produzem ocorrências desta gravidade. O que têm de raro – e felizmente que o é – é a concentração temporal. É terem-se sucedido em tão poucos dias. E o que têm de ainda mais perigoso é, por essa sucessão e pelo impacto mediático, poderem desencadear fenómenos de mimetismo. É poderem funcionar como detonador de novas ocorrências de violência extrema e descontrolada. Campo fértil para isso é o que não falta quando a delinquência se cruza com a juventude com demasiada facilidade.
* Da minha crónica de hoje na Cister FM